Título: MEC corta repasse de recursos para ONGs
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 01/10/2007, O País, p. 11

Fraudes em convênios levam a mudanças no Brasil Alfabetizado, que será direcionado apenas a prefeituras e governos estaduais.

BRASÍLIA. Após descobrir fraudes em convênios com organizações não-governamentais (ONGs), o programa Brasil Alfabetizado, do Ministério da Educação, não vai mais repassar recursos a entidades do terceiro setor. A decisão já vale este ano: os R$315 milhões do orçamento de 2007 serão direcionados exclusivamente a prefeituras e governos estaduais.

Em 2003, quando o programa foi lançado e era o carro-chefe da política educacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as ONGs abocanharam 55% do dinheiro. Em 2006, o percentual já havia caído para 29%. Se fosse mantido esse percentual de participação das ONGs, elas receberiam em 2007 cerca de R$91 milhões.

O ministro da Educação, Fernando Haddad, diz ser contrário a parcerias com ONGs em atividades-fim, dada a dificuldade de controlar, desde Brasília, o uso de recursos em todo o país:

- A União não tem poder de fiscalização suficiente para que o programa tenha andamento seguro. Parcerias em atividade fim não são recomendadas fora do sistema público.

A decisão de excluir o terceiro setor atinge parceiros de primeira hora do Brasil Alfabetizado. Entre eles, o Serviço Social da Indústria (Sesi) e a ONG Alfasol (Alfabetização Solidária), criada no governo Fernando Henrique. Juntas, as duas entidades matricularam 1,6 milhão de analfabetos nos últimos quatro anos.

A superintendente-executiva da Alfasol, Regina Esteves, condena o veto generalizado. Segundo ela, a descoberta de entidades fantasmas e desvios de recursos não são um problema do terceiro setor, mas de convênios específicos firmados pelo ministério com ONGs irregulares.

- É equivocado dizer que os problemas do Brasil Alfabetizado derivam das relações com as ONGs. Temos que somar esforços - disse ela.

Haddad enfatiza que há entidades sérias no terceiro setor. A idéia é que elas venham trabalhar diretamente com governos estaduais e prefeituras na formação de alfabetizadores. Até 2006, as ONGs recebiam repasses do ministério para oferecer os cursos. Por conta de atrasos no andamento do programa, turmas de 2006 estão em sala de aula.

O ministro aposta que as prefeituras e os governos estaduais terão melhores condições de impedir fraudes:

- A proximidade do poder público com o parceiro faz com que o programa tenha andamento mais transparente.

Concebido inicialmente para erradicar o analfabetismo, o Brasil Alfabetizado está longe disso. Em abril, o GLOBO mostrou turmas fantasmas no Distrito Federal, a 50 quilômetros da sede do Ministério da Educação. Nesse caso, o convênio era com a Secretaria de Educação do DF e não com entidades do terceiro setor.

Auditoria constatou fraude em nove ONGs

No mês passado, uma auditoria do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) constatou fraudes em nove ONGs ligadas ao Brasil Alfabetizado, na Bahia e em São Paulo. Elas receberam R$2,1 milhões para atender 51.287 analfabetos. Cinco delas, porém, só existiam no papel. Nas demais, a maioria das turmas tampouco era realidade. O FNDE bloqueou R$2,3 milhões que também seriam repassados e suspendeu a liberação de R$19 milhões para outras 25 entidades suspeitas. Das 47 entidades conveniadas com o Brasil Alfabetizado em 2006, só 13 estavam plenamente regulares.