Título: Tentativa de apagar rastros
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 28/03/2009, Política, p. 2

Diretores falavam em código e chegaram a trocar o disco rígido de computador

São Paulo ¿ As conversas gravadas pela Polícia Federal mostram que os diretores da Camargo Corrêa teriam motivos para tentar ocultar o que faziam. Um deles utilizava um telefone celular criptografado, o que impedia o registro de suas falas. O suposto coordenador do esquema de doações de campanhas, Pietro Bianchi, chegou a mandar trocar o HD, o disco rígido, do seu computador, por ¿segurança¿, para apagar as informações ali registradas.

Nas conversas, eles falam por códigos, geralmente bichos, como camelo, canguru, macaco, coelho. Essas expressões eram utilizadas para encobrir tanto o nome de pessoas como de operações feitas pelo grupo. Num diálogo, dois diretores falam sobre uma ¿primeira visita ao Jardim Zoológico¿ no dia seguinte. Os policiais fizeram uma diligência para tentar identificar o local, sem sucesso. Mais tarde, após outra citação do código, concluíram que se tratava da própria empresa Camargo Corrêa. Nesse caso, o ¿camelo¿ estaria a caminho do ¿zoológico¿.

No dia 13 de agosto do ano passado, um funcionário de nome Hélio pergunta se Pietro quer trocar o HD ou só adicionar memória. ¿Não, quero trocar o HD por um virgem, porque aquele eu vou jogar fora. O problema é só de segurança. Porque o pessoal disse que nem apagando...¿, respondeu o diretor. Nesse equipamento estariam dados das operações suspeitas feitas pelo grupo. Essas informações reforçaram o pedido de busca e apreensão feito pelo Ministério Público à Justiça Federal.

Código secreto Quando citavam cifras, os integrantes do grupo jamais falavam em ¿reais¿. Diziam ¿100 mil¿, ¿300 mil¿. Em algumas conversas, ainda mais cautelosos, chegavam a soletrar os números, falando ¿dois, dois, cinco¿, por exemplo. A procuradora federal Karen Kahn afirmou que somente o longo tempo de monitoramento telefônico (mais de um ano) permitiu interpretar o que diziam os diretores da empreiteira.

Em alguns momentos, os operadores do grupo de descuidavam. Em 16 de outubro do ano passado, o funcionário José Diney Matos ligou de um orelhão para o diretor Fernando Gomes. O inquérito da Polícia Federal registra: ¿Diney está falando de um telefone público e ressalta que agora dá para conversar, pois, aparentemente, acha que, de telefone público, não se pode ser interceptado¿.

Numa conversa com Pietro, Fernando se refere ¿àquele (telefone) especial¿. ¿Provavelmente se trata de um telefone criptografado¿, concluem os policiais. Em outro momento, Fernando tenta ensinar Pietro a utilizar um sistema que bloqueia escutas telefônicas. ¿Fernando é o diretor que mais se utiliza de um sistema de comunicações valendo-se de telefones criptografados, o que por diversas vezes dificultou a obtenção de informações. Esse excesso de cautela deixa claro o caráter ilícito das tratativas de que Fernando é protagonista¿, concluiu a Polícia Federal.

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CONVERSA 3

Troca de HD (13/08/2008) Pietro Bianchi e Hélio (diretor e técnico da Camargo Corrêa)

Hélio ¿ O que eu quero entender é o seguinte, você quer trocar o HD e instalar de novo ou você quer só adicionar memória?

Pietro ¿ Não, não, não, quero trocar o HD por um virgem tá, porque aquele eu vou jogar fora.

Hélio ¿ Por que, o que aconteceu com aquele?

Pietro ¿ Hein?

Hélio ¿ É pra sua segurança, é isso?

Pietro ¿ É claro, claro, o problema é só de segurança. Porque o pessoal disse que nem apagando...

Hélio ¿ No seu micro?

Pietro ¿ Não, no meu particular.

Hélio ¿ Tá, no seu particular, o senhor quer o HD e a instalação disso?

Pietro ¿ Isso, vocês vão ter que tirar o que tá lá dentro e botar um novo.