Título: Luz amarela para dólar em baixa
Autor: Oliveira, Eliane e Barbosa, Flávia
Fonte: O Globo, 02/10/2007, Economia, p. 21

Moeda fecha a R$1,81. Governo busca fórmula para manter competitividade externa.

Oderretimento sem trégua do dólar - que, ontem, fechou cotado a R$1,81 - acendeu a luz amarela nos ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento. O temor é que este patamar de câmbio reduza drasticamente a competitividade de setores importantes, que já vêm diminuindo exportações e poderiam até transferir operações para países com mais vantagens competitivas.

Convictos de que não é possível manter artificialmente uma cotação, técnicos do governo decidiram mapear os principais segmentos exportadores para tentar encontrar soluções específicas que recoloquem os setores mais prejudicados de volta na batalha com os principais mercados concorrentes. Afinal, um dos objetivos do governo é adotar uma meta de longo prazo para a participação do Brasil no comércio mundial.

Hoje, o Brasil representa 1,142% das exportações globais. O secretário de Acompanhamento Econômico da Fazenda, Nelson Barbosa, disse ao GLOBO que é trabalhar com a ampliação para 1,5% até 2010.

Para garantir essa meta, a idéia é escolher setores que mais perderam competitividade e os que são mais aptos a disputar espaço com países como China, Índia, Rússia e México. Outro foco é dar prioridade a setores mais importantes do ponto de vista tecnológico e que geram mais empregos. A proposta é também traçar uma estratégia para aprofundar a inserção no comércio mundial de cada um dos segmentos escolhidos.

Automóveis, aves e calçados na mira

Três setores já estão sendo mapeados: automotivo, aviário e calçadista. O setor calçados ainda apresenta vendas em alta de 2% este ano - mas muito mais por que os preços subiram 4,3%. O volume exportado, no entanto, caiu 2,2% de janeiro a setembro na comparação com o mesmo período do ano passado. Os automóveis, que vivem uma explosão de vendas no mercado doméstico, tiveram queda de 2,8% - os embarques diminuíram 12,9%.

Não à toa, enquanto em 2005 as exportações cresceram 22,6% e as importações 17%, no ano passado a situação se inverteu. O quadro se mantém em 2007: as vendas aumentaram 15,5% e as compras, 28,3%.

A exportação de frango teve alta de 55,3% no período. Mas o setor está preocupado com a elevação contínua de custos, devido ao encarecimento de insumos, especialmente o milho. A competitividade frente a concorrentes como Tailândia e Argentina, diz a associação dos exportadores, começa a ser corroída.

Ontem, o secretário de Comércio Exterior, Armando Meziat, adiantou que a segunda fase da política industrial brasileira já será orientada à elevação das exportações, com medidas tributárias, burocráticas e de logística. Uma das medidas em estudo é o barateamento do transporte das mercadorias:

- Estamos trabalhando para expandir as exportações. Vamos estabelecer uma macrometa - disse Meziat, que assumirá a Secretaria de Desenvolvimento da Produção, responsável pela condução da política industrial.

O trabalho não apenas visa a corrigir distorções geradas nos últimos três anos. Segundo Barbosa, o governo trabalha com dois cenários, tendo como pano de fundo a crise nos EUA. No mais pessimista, haverá forte retração da demanda internacional, incluindo China e Índia, com freio nas exportações brasileiras. No cenário mais otimista, de pouso suave dos EUA e do mundo, as agências de classificação de risco concederão ao Brasil, ainda no primeiro semestre de 2008, o chamado grau de investimento (recomendação para investir). Com isso, haveria uma enxurrada de dólares, derrubando mais a cotação.

Como o regime cambial é flutuante, sobram duas alternativas. Ou o Brasil vai arcar com pesado custo fiscal (com pagamento de juros) de emissões de títulos para enxugar os dólares que chegam - num momento em que as contas públicas estão no limite da expansão de gastos - ou o Banco Central (BC) terá que baixar os juros consistentemente, para reduzir o diferencial de ganho dos investidores em relação a outros mercados. O problema é que a política monetária é independente e se orienta, sobretudo, pelo comportamento da inflação.

- Os juros são uma possibilidade. Mas não podemos nos atrelar a isto. Por isso, resolvemos planejar o resgate da competitividade - disse Barbosa.

Além de garantir o Brasil como plataforma de exportação, o governo tem outra preocupação: a sustentabilidade das contas correntes no médio e longo prazos. Nelson Barbosa explica que o sucesso da política econômica está ancorado no tripé estabilidade monetária e fiscal, elevação de investimentos e robustez externa.

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, concorda que a taxa de câmbio "fugiu ao controle". Para ele, o governo precisa concentrar as ações em manufaturados e não em commodities, que ficam ao sabor das cotações no mercado internacional.