Título: Especialistas condenam merchandising oficial
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 03/10/2007, O País, p. 13

"O livro didático virou picaretagem. É preciso voltar a ter bons mestres", diz professor da Unicamp.

SÃO PAULO. Especialistas em educação avaliam que os governos não podem fazer merchandising com livros didáticos, ou mesmo repassar posturas ou descomposturas ideológicas. Os livros precisam oferecer condições para que os filhos das classes mais pobres tenham conhecimento, assim como os filhos das elites. Isso é política, em seu sentido mais amplo na educação, porque não existe "educação neutra", diz a vice-coordenadora de pedagogia da Unicamp, Maria Márcia Malavasi:

- Não concordo com os antigos livros da direita, signatários da educação autoritária e impositiva. Nem com os de esquerda. Ambos são panfletários. Precisamos de bons livros, com conteúdo, e de professores críticos.

Os especialistas alertam que, desde a década de 70, o país adotou a "pedagogia tecnicista", onde o mestre não sabe ensinar sem o livro.

- O grande "boom" do livro didático aconteceu no Brasil na década de 70, com os acordos MEC-Usaid (United States Agency for International Development). É como se o livro pudesse dar conta do ensino, numa pedagogia tecnicista. Houve a corrosão do antigo mestre. Isso se tornou um grande mercado. Hoje, os didáticos são a grande fatia das editoras e têm como compradores os governos. O professor, sem livro, não sabe mais ensinar - diz Ezequiel Theodoro da Silva, da Faculdade de Educação da Unicamp.

Para Ezequiel, o livro didático virou picaretagem:

- Osman Lins, em 78, já falava na nossa "Disneylândia pedagógica". O livro didático virou picaretagem. E a política com o governo vem de longe, o PT não melhorou, nem o PSDB. Não sou contra os livros, e acho que eles precisam ser melhorados, mas não podem substituir o bom professor. É preciso voltar a ter bons mestres, e investir em bibliotecas os bilhões de reais gastos com esses livros didáticos.

Para o presidente da Associação Brasileira de Educação Tecnológica (ABT), João Roberto Moreira Alves, além de adotar livros adequados, o MEC precisa preservar a liberdade da escolas e das regiões do país.

- Além do direcionamento tendencioso e desse merchandising governamental, como no caso do Fome Zero, tudo o que é muito padronizado não é bom para a educação. É preciso respeitar as diferenças.