Título: Especialistas: veto à Emenda 3 fere Constituição
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Fonte: O Globo, 03/10/2007, Economia, p. 29

Autonomia concedida a auditores fiscais para que multem prestadores de serviço é considerada uma intervenção.

SÃO PAULO. A polêmica em torno do veto presidencial à chamada Emenda 3 deu o tom ontem do seminário promovido pela Associação Paulista de Estudos Tributários (Apet). Com o veto do presidente Lula à emenda incluída na lei da Super Receita, os auditores fiscais passaram a ter autonomia para autuar ou fechar as empresas prestadoras de serviço constituídas por uma única pessoa, quando entenderem que a relação com outra empresa esconde, na verdade, uma relação trabalhista. Para os participantes do encontro, essa possibilidade fere a Constituição - uma vez que só caberia ao Judiciário a definição de vínculo empregatício - e representa uma intervenção arbitrária na atividade empresarial.

- Não há ditadura que tenha chegado a tanto. A mesma pessoa que autua, legisla e executa, baseada na presunção da legitimidade - afirmou o advogado e professor Márcio Tadeu Guimarães Nunes, para quem apenas a Justiça tem o poder para atuar em casos de suspeita de sonegação fiscal ou de relações irregulares de trabalho.

Ele lembrou que, nos EUA, também houve uma "explosão de ações" com o objetivo de "desconsideração da personalidade da pessoa jurídica". Hoje, porém, existe uma preocupação em controlar o aparecimento de uma "legislação esquizofrênica". Para o advogado Manoel Ignácio Torres Monteiro, sob a justificativa de cumprir uma "função social", o veto à Emenda 3 representaria um "ataque à soberania da pessoa jurídica (empresas)".

- O que as pessoas não perceberam é que o ataque serve apenas para dificultar a atividade econômica, o que é nocivo para a ação social que se procura defender.

Polêmico, assunto opõe empresários e sindicalistas

O fundamento legal para que as empresas possam contratar outros profissionais que se transformaram em PJ, segundo o advogado e professor da USP André Ramos Tavares, está na Constituição, que prevê o princípio da livre iniciativa. Por essa interpretação, é lícito a qualquer pessoa a escolha da forma como vai trabalhar - se como empregado, como PJ ou como cooperativa.

- O Estado não pode violar determinados espaços dados ao cidadão - disse ele, para quem o veto representa um ataque à Constituição. - Na prática, o veto à emenda não teria validade, porque não é esta proposta (a emenda) que limita a ação de auditores fiscais. Isso está previsto é na Constituição, que fornece um núcleo mínimo de liberdade econômica.

O tema colocou em pólos opostos empresários e sindicalistas (que chegaram a organizar uma greve no metrô paulista para pressionar pela manutenção do veto) e também foi comentado pelo ex-secretário da Receita Everardo Maciel. Segundo ele, o veto teve apenas "simbolismo político", uma vez que a legislação prevê apenas ao Judiciário a possibilidade de legislar nos casos com indícios claros de dolo ou de tentativa de burlar o pagamento de impostos.

- Temos hoje uma situação de ambigüidade, que é ruim para o contribuinte, mas também prejudica o próprio governo.