Título: CPI das ONGs já começa com briga
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 04/10/2007, O País, p. 8

Líder do PT tenta montar proteção para defender governo, Lula e a si mesma.

BRASÍLIA. Adiada três vezes este ano por causa de obstrução governista, a CPI do Senado que vai apurar desvio de recursos federais repassados a ONGs desde 1999 foi finalmente instalada ontem e deverá se transformar em mais uma dor de cabeça para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e petistas como a senadora Ideli Salvatti (SC). A instalação da comissão parlamentar, proposta ano passado pelo senador Heráclito Fortes (DEM-PI), começou com muita briga, comprovando já no início a guerra política que será travada nos próximos 120 dias. No período que se pretende investigar, o governo repassou R$33 bilhões para ONGs em todo o país.

A líder do PT e do bloco governista, Ideli Salvatti, corre contra o tempo e tenta amarrar uma rede de proteção por meio do senador Sibá Machado (PT-AC), sua indicação. Ela também comandou o processo de escolha de um relator que defenda o partido e o governo. À noite foi confirmada a escolha de Inácio Arruda (PCdoB-CE) como o relator. Mas o presidente da CPI será Raimundo Colombo (DEM-SC), adversário político de Ideli.

O senador Walter Pereira (PMDB-MS) já estava respondendo como o relator escolhido pela base, mas não foi confirmado. Na véspera, Pereira, um dos líderes da rebelião do PMDB no Senado, foi avisado pelo líder Valdir Raupp (RO) que seria substituído por Arruda. Nos bastidores, a informação era que Ideli não queria ficar nas mãos do PMDB, que cobra fidelidade do PT ao presidente Renan Calheiros (PMDB-AL).

Quando Sibá comunicou que o relator seria Arruda, Pereira bateu o pé e disse que disputaria no voto, adiando a eleição para terça-feira.

- Estava tudo apalavrado. Eu não recuei, mas recuaram por mim. Deve ser por causa de meus maus precedentes. Mas o processo ainda não está encerrado. Se falar agora, falo bobagem - reagiu Pereira, sem confirmar se fazia referência ao fato de ter liderado a rebelião do PMDB que derrubou a MP que criava a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo.

Lula e Lorenzetti serão os principais alvos da oposição

A oposição vai centrar fogo contra Ideli e o ex-churrasqueiro de Lula, o também catarinense Jorge Lorenzetti, acusado de irregularidades e desvio de parte dos R$18 milhões repassados pelo governo a ONG Unitrabalho. Ideli é acusada de ter ligações com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf-Sul), que segundo a revista "Veja", recebeu R$5 milhões para promover cursos de treinamento profissional em 2002. Investigação da Polícia Federal apura se parte desse dinheiro foi desviado para financiar a campanha política de um deputado do PT em Santa Catarina.

Todos os envolvidos na fraude seriam correligionários, amigos ou assessores de Ideli Salvatti, que terá no seu encalço, na CPI, o senador Raimundo Colombo, braço direito do ex-senador Jorge Bornhausen e inimigo dela. A senadora o acusa de querer trazer uma disputa local para o cenário nacional. Ela nega seu envolvimento em qualquer tipo de irregularidade.

- A denúncia contra a senadora tem credibilidade e precisa ser investigada. Sobre o Lorenzetti, há também muita fumaça, e é preciso investigar. Vamos centrar o trabalho nos casos mais fortes levantados pelo TCU, Polícia Federal e órgãos da imprensa. A CPI não pode proteger ninguém, alcance quem alcançar - disse Colombo logo após a eleição.

Para tentar neutralizar as acusações da oposição, os governistas já estão com um levantamento de casos suspeitos de desvio para ONGs no governo Fernando Henrique.

- Já tenho prontos aqui requerimentos de investigação muito interessantes - anunciou o provável relator, Inácio Arruda, em tom de ameaça velada à oposição.