Título: Números que deixam dúvidas
Autor: Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 06/10/2007, Economia, p. 35

EUA revisam dado de desemprego e levam euforia às bolsas. Em SP, alta é de 3,17%.

Um erro do Departamento de Trabalho dos Estados Unidos levou otimismo aos mercados globais. Ao divulgar o índice de desemprego em setembro, o governo americano também anunciou uma revisão substancial dos dados de agosto - uma diferença de 93 mil vagas, o que levou os analistas a concluírem que a maior economia do mundo não está tão perto de uma recessão como se imaginava, e os mercados fecharam em alta. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) subiu 3,17%, aos 62.318 pontos, e o dólar caiu 1,15%, para R$1,805, o menor valor desde 14 de agosto de 2000, quando ficou em R$1,804.

Em setembro, foram criados 110 mil empregos nos EUA, contra expectativa de cem mil. Mas o índice de desemprego subiu de 4,6% para 4,7%, devido a um maior número de pessoas procurando trabalho. Já os dados de agosto mudaram radicalmente: de um corte de quatro mil vagas - que, quando foi anunciado, no mês passado, derrubou bolsas no mundo inteiro -, passou-se para abertura de 89 mil. Essa mudança, informou o governo, deveu-se ao fato de não terem sido contabilizadas contratações no serviço público, especialmente de professores para o início do ano letivo. Os de julho, em sua terceira revisão, subiram de 68 mil para 93 mil vagas.

Analistas criticam erro no cálculo

Segundo Alfredo Coutino, economista sênior para a América Latina da Economy.com, da Moody"s, em Nova York, os números favoráveis não evitam o questionamento da ineficiência da contabilidade das autoridades:

- É importante notar como os números oficiais de agosto vieram diferentes. No mês passado, houve fortes perdas no mundo. Foi um erro. As contratações nas escolas públicas não entraram na estatística. Apesar da euforia global, o índice de emprego deve perder força, pois os bancos só anunciaram cortes, mas ainda não iniciaram seus processos de demissões.

No Brasil, durante o dia ontem, a Bolsa chegou a 62.704 pontos, marca histórica. Na semana, o pregão acumulou avanço de 3,06%. No câmbio, a queda ontem foi puxada pelo bom fluxo de recursos no mercado internacional. Desde segunda-feira, o dólar teve queda de 1,58%. O risco-Brasil, que ontem recuou 3,51%, para 165 pontos centesimais, contabilizou desvalorização de 6,78% na semana.

O S&P, índice da Bolsa de Nova York, bateu recorde ontem, com alta de 0,96%, aos 1.557 pontos. Dow Jones e Nasdaq subiram 0,66% e 1,71%, respectivamente. Os dados americanos também influenciaram a Europa: Londres avançou 0,73% e Frankfurt, 0,72%. Apesar de os números terem ficado acima do esperado em setembro, analistas criticaram o erro de análise do governo americano em agosto.

Quando os dados do desemprego nos EUA foram anunciados, no dia 7 de setembro, o Nasdaq caiu 1,86%, o Dow Jones, 1,87%, a Bolsa de Londres, 1,93% e a de Frankfurt, 2,43%. Como era feriado no Brasil, o reflexo veio no dia 10: a Bovespa caiu 3,51%. Os números também abriram caminho para o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) reduzir seus juros básicos em meio ponto percentual, para 4,75% ao ano, o primeiro corte em quatro anos. Agora, analistas acham menos provável uma nova redução na reunião do próximo dia 31. No mercado futuro, caiu de 70% para 46% o índice dos que apostam na redução da taxa básica.

Já Fabio Knijnik, analista sênior do BES Investimento, e André Lago Jakurski, gestor de renda variável do The Bank of New York Mellon, ainda acreditam em corte:

- Aposto em queda de 0,25 ponto percentual. A economia ainda tem algumas instabilidades no setor de crédito. A última redução dos juros, de meio ponto em setembro, só será sentida em 2008 - diz Jakurski.

"Subprime" afeta setor de construção

Economistas americanos ressaltaram que a melhora nos dados de emprego se deu no governo e que a contratação no setor privado continua em baixa. Isso, segundo eles, deve continuar afetando a economia. Sophia Koropeckyj, do site Economy.com, da Moody"s, lembrou que a média semestral de abertura de vagas no setor privado recuou para 94 mil. É a primeira vez que fica abaixo dos cem mil desde dezembro de 2003.

- A fraqueza persiste, não há dúvida - disse Sophia.

A indústria fechou 18 mil vagas em setembro, e o setor de construção, 14 mil, reflexo da crise das hipotecas de alto risco (subprime). Esta também levou o banco Merrill Lynch a anunciar que terá o primeiro prejuízo trimestral em nove anos, devido a uma baixa contábil de US$5,5 bilhões decorrente de operações com subprime.