Título: Por vias espanholas
Autor: Novo, Aguinaldo e Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 10/10/2007, Economia, p. 25

INFRA-ESTRUTURA EM FOCO

Com pedágio baixo, grupos hispânicos levam 6 dos 7 trechos em leilão de rodovias.

Líderes em áreas como telecomunicação e energia, as empresas espanholas garantiram participação relevante na administração de estradas no Brasil, ao ganhar ontem seis de sete trechos de rodovias federais licitados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). A OHL saiu vencedora nos cinco trechos que disputou, derrubando o preço do pedágio para até menos de um real. Pelas regras do leilão, para o qual foram habilitados 30 grupos, valia a menor proposta de pedágio. A OHL se propôs a cobrar R$0,997 (para automóveis de passeio de dois eixos) na rodovia Fernão Dias, que liga Belo Horizonte a São Paulo. A diferença em relação ao valor estipulado pela ANTT chegou a 65,43%.

A proposta da OHL para a rodovia Régis Bittencourt também não teve concorrente: R$1,364 a cada praça de pedágio, um deságio de 49,20%. O grupo venceu ainda a disputa por BR-116 (a Rodovia do Mercosul, passando por Curitiba e Florianópolis), BR-101 (ponte Rio-Niterói à divisa com o Espírito Santo) e BR-116 (de Curitiba até Rio Grande do Sul). No total, abocanhou 2.078 quilômetros, dos 2.600 licitados. A concessão valerá por 25 anos, e a empresa terá de investir R$16,7 bilhões. Nos sete trechos, a ANTT espera R$19,8 bilhões em gastos.

A construtora Acciona, também de capital espanhol, levou a BR-393 (Volta Redonda-Além Paraíba), mas o resultado está sub judice. O leilão foi interrompido por 40 minutos, depois que a companhia - excluída na etapa de qualificação - apresentou liminar da juíza Tania Regina Marangoni, da 16ª Vara Federal de São Paulo. O consórcio foi readmitido, ofereceu o menor valor (R$2,94 pelo pedágio), mas vai ter de esperar julgamento do mérito da ação. Ela alega que forneceu os documentos exigidos pelo edital.

- Temos plena confiança de que a liminar será confirmada - afirmou o argentino Ricardo Ruben Rios, diretor da Acciona no Brasil.

O sétimo lote - a BR-153 (Rodovia Transbrasiliana, que corta o interior paulista) - ficou com o consórcio brasileiro BRVias, novato na administração de rodovias. Ele é integrado pelo grupo Áurea (da família Constantino, dona da Gol), pela Construtora Walter Torre e pela Splice (grupo do empresário Antonio Beldi, que já esteve no controle de operadoras de celular). O consórcio era associado ao Acciona, mas o acordo foi rompido.

Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o desfecho, sobretudo o deságio de até 65%, foi "espetacular".

- Hoje acordei com a premonição de que as coisas seriam boas - disse Lula mais tarde.

O presidente da ANTT, José Alexandre Resende, afirmou que ficou "impressionado" com o deságio - de 45%, em média. Perguntado se isso não poderia impedir investimentos, respondeu que não estava "preocupado com isso":

- Elas vão assinar termos de execução de obras. Vamos fiscalizá-los, não tenha dúvida.

Dilma: pedágio baixo não afeta qualidade

O presidente da OHL Brasil, José Carlos Ferreira de Oliveira, afirmou que aposta no crescimento continuado da economia brasileira.

- Acreditamos na evolução do PIB e, conseqüentemente, do tráfego, que vai garantir um retorno para nossos acionistas - afirmou ele, que chamou de "críticas de perdedores" avaliações de que a OHL não sustentaria investimentos com o pedágio proposto.

Segundo ele, as propostas se basearam em "estudos de tráfego, juros e da capacidade de financiamento". Resende disse que a OHL usará financiamento do BNDES, de até 70% dos investimentos previstos no edital. Contrariando a expectativa, a CCR não teve êxito. O presidente da empresa, Renato Alves Vale, afirmou que suas propostas foram feitas no limite da "responsabilidade e da disciplina de capital".

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, coordenadora do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), atribuiu a redução de preço à competição e ao trabalho do governo:

- Todos os encaminhamentos que fizemos para que tivéssemos tarifas compatíveis com o menor custo-Brasil possível foram bem sucedidos.

Ela afirmou que a decisão de rever o teto dos preços - que levou ao adiamento do leilão de janeiro para ontem - foi significativa para o resultado, assim como a divisão por trechos. Para Dilma, os preços refletem o comportamento do investidor, em razão da estabilidade, da queda dos juros e da redução do risco-Brasil. Para o empresariado, disse, é um bom negócio investir nas rodovias por 25 anos.

A ministra ressaltou a importância do leilão para o PAC e para a redução do custo-Brasil, vinculado à má qualidade da infra-estrutura. A realização, para ela, foi um desafio vencido. Dilma considerou que os baixos preços dos pedágios não afetarão a qualidade das rodovias, argumentando que as condições foram aprovadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e estão previstas manutenções.

- Tivemos um leilão disputado, e dele resultam pedágios mais de acordo com a realidade brasileira. Pela primeira vez, a disputa foi acirrada. É isso que responde pela queda do preço, não a redução de qualquer item de qualidade - disse a ministra, que não demonstrou preocupação com o fato da OHL ter levado cinco trechos.

O ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, também destacou que o objetivo era conseguir fazer investimentos nas rodovias sem custos altos para a população:

- Nós mudamos o conceito de concessão. Era um negócio que o governo fazia para auferir lucros. Agora, está fazendo um negócio para que as estradas tenham segurança, sejam boas e baratas.