Título: TCU contesta edital da usina do Rio Madeira
Autor: Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 11/10/2007, Economia, p. 30

Problemas no estudo econômico do projeto elevam em 13% tarifa final que o vencedor poderá cobrar, diz tribunal.

BRASÍLIA. O Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou inconsistências nos estudos de viabilidade econômica e financeira da usina hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, que têm um impacto de 13% na tarifa final de energia que o vencedor do leilão poderá cobrar dos clientes. Ao longo dos 30 anos da concessão, os cálculos do governo, em contraposição com os dos técnicos do tribunal, significarão um gasto de R$14,5 bilhões para a sociedade. Mesmo assim, o tribunal decidiu aprovar a proposta de edital.

Os ministros preferiram não determinar à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que altere a proposta de edital, optando apenas por recomendar as mudanças. O objetivo foi não atrasar o leilão do empreendimento, marcado para o fim de novembro. Se as alterações fossem obrigatórias, uma nova proposta teria que ser formulada pelo governo e submetida ao TCU, reiniciando o processo de análise e inviabilizando a realização da licitação - uma das bandeiras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), plano que orienta o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em todo o processo de discussão da proposta, houve interação com o Ministério de Minas e Energia, com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), com a Casa Civil e com a Aneel. Não à toa, o relator do processo, ministro Benjamin Zimler, em plenário, citou o PAC e a importância da obra, que representa 3% da atual capacidade instalada. Mas, implicitamente, o TCU espera que as mudanças sugeridas sejam incorporadas ao edital final.

Não houve ilegalidade, diz ministro do tribunal

Atendendo a este viés político, e apesar das bilionárias inconsistências apresentadas, ele minimizou ainda os 13% de diferença. Segundo ele, na hora do leilão, para se posicionar melhor na disputa, o setor privado tende a reduzir o valor da tarifa máxima. A proposta da área técnica enviada ao ministro-relator era de que fosse feita uma determinação à Aneel para efetuar as alterações para que o TCU aprovasse a proposta de edital.

- Estamos tentando calcular o preço máximo de venda de energia, isso não é o que vai sair no edital, não significa que a energia vai ser vendida por esse preço. O tipo de licitação usa como critério de seleção exatamente o maior deságio em relação a essa energia. O mercado é que vai calibrar o valor da energia - disse o ministro.

Para ele, os 13% derivam de desajustes na metodologia utilizada pela EPE, mas não foi identificada ilegalidade:

- Se a metodologia utilizada pudesse levar a um ato de ineficiência, de ineficácia grosseira, com agressão ao princípio jurídico da ineficiência, aí sim nós poderíamos determinar (as mudanças), mas não é mesmo o caso. Portanto, o Tribunal deve recomendar apenas.

Entre os problemas encontrados na análise econômica do empreendimento está o custo real de capital de terceiros (para o vencedor captar dinheiro no mercado, tomar empréstimos), calculado pela EPE em 6,65%, considerado alto pelo TCU. Segundo os técnicos, o valor deveria ser de 5,06%, porque a usina foi incluída no PAC e conta com taxas menores do BNDES.

O TCU também verificou que os cálculos de investimentos do projeto (o custo da obra em si) feitos pela EPE, de R$9,5 bilhões, estão sobrevalorizados em cerca de R$900 milhões. Desse total, R$220 milhões referem-se a obras civis, principalmente concreto, e R$680 milhões são relativos a equipamentos e turbinas. A projeção de investimentos feita pelo consórcio Furnas/Odebrecht, responsável pelos primeiros estudos, era de R$13 bilhões.

Os técnicos discordaram ainda do uso do IGP-M como indexador da tarifa e recomendaram o IPCA. Todos estes parâmetros são utilizados para calcular o valor máximo da energia que Santo Antônio venderá quando estiver operando. Por isso, no fim, observadas essas diferenças, apontou-se uma tarifa 13% superior à que poderia ser cobrada.

A data de análise e votação do edital de licitação do edital pela Aneel ainda não foi marcada. A próxima reunião de diretoria será dia 16, mas a pauta ainda não foi divulgada. A EPE e a agência, que disse que ainda vai analisar as recomendações, preferiram não se pronunciar sobre a decisão do TCU.

Depois da publicação do edital, a Aneel terá cinco dias para enviar o texto para análise do TCU. E o contrato somente deverá ser assinado 45 dias depois após a realização do leilão.