Título: A solução é possível
Autor: Duarte, Mário Sérgio de Brito
Fonte: O Globo, 12/10/2007, Opinião, p. 7

Li o livro ¿Elite da tropa¿ e aguardei a estréia do filme para ver o que já sei. A decisão de cada um em já ter visto o filme, através do produto pirata, não me cabe julgar, afinal, todos temos uma certa dose de curiosidade e ansiedade, ainda que para tal seja preciso pular a cerca.

Com a experiência de quem foi instrutor, na Polícia Militar do Rio, do tema ¿Guerra revolucionária¿, no Curso de Operações Especiais para oficiais, no final dos anos 80, posso afirmar que o filme nada mais é do que a visão atualizada da instituição policial no Brasil, que sempre existiu para proteger o poder político vigente e as classes dominantes.

Este foi o dado marcante da cultura policial, herdado da própria formação social brasileira.

Não mais acreditando na eficácia das leis, nos poderes instituídos e, principalmente, na grande maioria da classe política ¿ faça-se justiça aqui aos que eticamente honram os seus mandatos ¿, opta a sociedade pela forma que considera mais rápida e eficaz para alcançar a paz, atribuindo ao braço armado estadual o direito de até mesmo eliminar os ¿inimigos¿.

Se a tropa policial for incorruptível, tão melhor. É óbvio que, na lógica quase inevitável do confronto armado diário, esperamos que, entre a vida de um policial, defensor da sociedade, e a de um bandido, que sempre sucumba o marginal da lei. A vida de um policial (não o policial-bandido) não tem preço.

É certo, também, que a sociedade do asfalto clama por mais justiceiros tipo ¿Capitão Nascimento¿. Cada bandido violento morto ¿ os do colarinho-branco temos que engolir ¿ é menos uma ameaça em potencial. A sociedade (hipócrita), a mesma que consome droga e financia as armas do tráfico, que acaba nos matando nos sinais de trânsito, é excludente e discriminatória, basta se ver ameaçada. Todos nós, com exceção de ONGs de direitos humanos ¿ muitas sobrevivem à custa de violência e passeatas inócuas ¿, somos adeptos do slogan ¿bandido (favelado) bom é bandido morto¿. Desde que os corpos não sejam jogados numa manhã de sol na Vieira Souto. Isso de fato seria um ¿horror¿ e um grande prato para a mídia.

O tráfico de drogas, atuando nas comunidades menos favorecidas, de fato oprime a classe pobre e assusta sobremodo as demais classes. Pesquisas sociais mais recentes indicam, inclusive, que no Rio já chega a dois milhões o número de favelados, o que representa um terço da população. Acreditar que atitudes iguais à do ¿Capitão Nascimento¿ no filme são as mais adequadas na defesa social é desacreditar na única possibilidade de transformação que é a inclusão social.

MILTON CORRÊA DA COSTA é coronel da Polícia Militar do Estado do Rio, na reserva.