Título: Alteração na Amazônia afeta o continente
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Fonte: O Globo, 13/10/2007, Ciência, p. 29

Transformação do padrão de chuvas ameaça a geração de energia e a agricultura. Nordeste sofreria mais.

Ainda é difícil diferenciar as mudanças no clima ligadas a ciclos naturais daquelas causadas pelo acúmulo de gases-estufa liberados pela ação humana. Porém, estudos de instituições brasileiras já revelam sinais de que o clima de fato mudou no Brasil e que o aquecimento global está associado a isso. As previsões indicam mudanças mais significativas nas próximas décadas. Mantidas as taxas globais de emissões de gases do efeito estufa, a temperatura na Amazônia poderá aumentar em 8 graus Celsius até 2100.

E, a partir de 2050, florestas do centro da Amazônia poderão dar lugar a uma vegetação típica de cerrado. A mata seria dividida ao meio, com conseqüências para o clima do Brasil e da América do Sul. O prognóstico é parte do estudo Mudanças Climáticas Globais e seus Efeitos sobre a Biodiversidade, divulgado este ano pelo Ministério do Meio Ambiente.

Segundo o estudo, coordenado pelo cientista José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e integrante do IPCC, se nada for feito, a temperatura média do Brasil poderá aumentar 4 graus Celsius até 2100.

Queimadas respondem por 75% das emissões

Se não contribuiu para o atual cenário de aquecimento global ¿ ligado a emissões de veículos e indústrias dos países desenvolvidos ao longo do século XX ¿ o Brasil responde agora por considerável parcela do CO2 lançado na atmosfera, com conseqüências para as próximas décadas. O motivo são as queimadas na Amazônia, responsáveis por 75% das emissões brasileiras. Elas colocam o país entre os cinco maiores emissores de CO2 do mundo.

A pesquisa alerta ainda que a elevação de temperatura poderá levar a uma diminuição na vazão dos rios devido à evaporação, causada pelo aquecimento do ar, e à redução das chuvas. Em algumas regiões, a geração de energia hidroelétrica poderá ficar comprometida. Além disso, o aumento de temperatura pode afetar a biodiversidade do país, uma das maiores do mundo.

De 1961 a 1990, o Brasil registrou uma temperatura média de 25 graus Celsius. Até o fim do século, essa média pode chegar a 29,9 graus Celsius, segundo os prognósticos do estudo governamental.

No Nordeste, o aumento pode variar de 2,2 graus Celsius a 4 graus Celsius. Os habitantes do sertão nordestino sofrerão o maior impacto do caos climático no país.

A região Nordeste é apontada como uma das mais vulneráveis do país pelo meteorologista Carlos Nobre, do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/Inpe) e também integrante do IPCC.

A tendência é que a região se torne um semideserto. Isso inviabilizaria a agricultura de subsistência, da qual dependem hoje entre sete milhões e oito milhões de pessoas.

O estudo do Ministério do Meio Ambiente também destaca a elevação do nível do mar, que poderá chegar a 40 centímetros até o fim do século. Cerca de 42 milhões de brasileiros que vivem na zona costeira poderão ser afetados pelo avanço das águas do Atlântico. O estudo mostra o Rio de Janeiro como uma das cidades mais vulneráveis.

Segundo a pesquisa, uma elevação de 40 centímetros no Atlântico poderia tomar 100 metros de praias no Norte e no Nordeste. Outra conseqüência seria a destruição de portos e redes de esgoto.