Título: Por uma China sustentável
Autor: Scofeild Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 16/10/2007, O Mundo, p. 28

Presidente diz ao PCC que crescimento deve vir sem dependência, corrupção ou desigualdade.

Num discurso de 2h25min transmitido ao vivo pela TV, o presidente chinês, Hu Jintao, abriu ontem o 17º Congresso Nacional do Partido Comunista da China (PCC) reafirmando a necessidade de o partido continuar no comando das reformas que vêm modernizando o país, mas anunciando uma mudança no padrão de crescimento para os próximos anos capaz de tirar da China a pecha de nação poluidora, paraíso da pirataria e geradora de desníveis cada vez maiores entre ricos e pobres.

Segundo Hu, que prevê o fim do processo de industrialização da China em 2020, quando os chineses terão sua renda per capita quadruplicada (hoje é US$2.042), o atual modelo de crescimento chinês - fortemente dependente de investimentos e exportações, focado na indústria, poluidor, baseado em larga e desqualificada mão-de-obra e no consumo descontrolado de matérias-primas - será substituído por um modelo mais racional.

- Faremos a transição de uma economia dependente de investimentos e exportações para uma combinação onde o consumo doméstico será igualmente importante. O perfil da economia, hoje em processo de industrialização, vai incluir também o desenvolvimento do setor de serviços. E em vez da ênfase no uso intensivo de recursos naturais e mão-de-obra, vamos priorizar o desenvolvimento tecnológico e científico, a qualificação do trabalho e a gerência focada na inovação - afirmou.

Mao Tsé-Tung sofre duas críticas

Hu Jintao colocou no centro de seu mais importante pronunciamento desde que passou a ocupar o posto de secretário-geral do PCC, em 2002, temas novos considerados secundários por muitos dentro do partido, como o estímulo à inovação, à conservação ambiental, ao consumo racional de energia e à redução nos desníveis entre campo e cidade, ricos e pobres. Ou seja, a China entra num novo ciclo de reformas com o objetivo de alcançar o crescimento sustentável.

Para isso, Hu não se furtou a citar várias vezes teses do reformador Deng Xiaoping, o líder que abriu o país às idéias capitalistas, como a "emancipação da mente" (abrir-se às mudanças) ou a "prosperidade para todos". Mao Tsé-tung foi citado poucas vezes e, ainda assim, sua acirrada defesa da tese de luta de classes como motor revolucionário foi duramente criticada.

- Parar ou mudar o curso das reformas só vai nos levar a um beco sem saída - disse Hu. - Devemos continuar a emancipar nossas mentes, procurar a verdade nos fatos, manter-nos em dia com a realidade dos nossos tempos, perseverar nas mudanças e inovações e afastar-nos da rigidez e da estagnação.

Transparência na escolha de líderes

A fala de Hu Jintao foi impregnada dos conceitos que o presidente quer ver inscritos na Constituição do partido, como "desenvolvimento científico" e "sociedade harmoniosa", teses que pregam justamente mais qualidade ao crescimento econômico, em contraposição ao conceito de enriquecimento a qualquer preço, estimulado pelo grupo ligado ao ex-líder Jiang Zemin. É uma forma de equiparar-se a líderes anteriores, cujos pensamentos norteiam o partido até hoje (Mao Tsé-tung, Deng Xiaoping e Jiang Zemin).

O presidente da China fez ainda uma acalorada defesa do trabalho de modernização e crescimento da economia empreendido pelo PCC nos últimos anos e elogiou os esforços de profissionalização no partido. Ele prometeu processos mais transparentes e democráticos para a escolha de lideranças dentro e fora do PCC, mas apontou pontos fracos, em especial a corrupção crescente nos quadros.

- Para atingirmos os objetivos de reforçar a capacidade de governança do partido devemos garantir que o PCC exercite auto-disciplina e seja rigoroso com seus membros. Eles devem estar preocupados em servir ao povo, devem ser pragmáticos e incorruptíveis. - afirmou. - Todos os membros do partido, especialmente os líderes, devem ser impecáveis nos padrões morais e ter um papel impecável na sociedade.