Título: Índia-Brasil-África do Sul: o fórum que veio para ficar
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 17/10/2007, O País, p. 14

Hoje terei o prazer de voltar à África do Sul, para encontrar-me, em Tshwane, com o presidente Thabo Mbeki e o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh. Estaremos reunidos na segunda cúpula do Fórum Índia-Brasil-África do Sul (Ibas) para traçar estratégias, formular propostas e defender aspirações que aproximam três grandes democracias do mundo em desenvolvimento.

Por sugestão do presidente Mbeki, África do Sul, Brasil e Índia decidiram dar um renovado impulso à cooperação Sul-Sul. É nossa resposta a uma ordem internacional desigual, incapaz de resolver os problemas do desenvolvimento e da segurança coletiva. Frente a ameaças e desafios como o terrorismo, a degradação ambiental e as pandemias, propomos mais cooperação, mais solidariedade.

Concordamos que o ponto de partida deve ser uma estreita articulação entre três economias importantes da África, da América Latina e da Ásia. Juntos, estamos dando voz mais robusta ao Sul no encaminhamento dos temas prioritários da agenda internacional.

Defendemos a democratização das instâncias decisórias internacionais. Queremos fortalecer as instituições multilaterais e completar ampla reforma das Nações Unidas. Os apoios a nossa aspiração comum de nos tornarmos membros permanentes do Conselho de Segurança ressalta a credibilidade dessa postulação.

Os desafios da paz e da segurança internacionais exigem soluções definitivas para a pobreza e o crescimento sustentável. O convite para participarmos das cúpulas ampliadas do G-8 confirma que os países em desenvolvimento não mais podem ser alijados desse debate.

Nossa ação conjunta no G-20 é crucial para reverter distorções históricas no comércio agrícola internacional, prejudiciais às legítimas aspirações das nações mais pobres.

As preocupações ambientais estão na ordem do dia. É por isso que este ano o Ibas focaliza o crescimento sustentável. Estamos traçando estratégias para assegurar que os princípios emanados das conferências do Rio e de Johannesburgo - sobretudo o das responsabilidades comuns, porém diferenciadas - balizem a resposta da comunidade global à mudança climática. Nossos três países integram o Fórum Internacional de Biocombustíveis, que está na vanguarda de esforços para compatibilizar proteção ambiental com segurança energética. A democratização do acesso a novas fontes energéticas significa oferecer à humanidade uma alternativa ao encarecimento e à inexorável escassez das fontes fósseis tradicionais.

Queremos transformar em iniciativas concretas de solidariedade Sul-Sul os avanços de nossos países em agricultura, comércio, ciência e tecnologia e energia. Devemos unir nossas capacitações na produção de fármacos para ajudar países, sobretudo na África, devastados pela Aids, malária e tuberculose. Por meio do Fundo Ibas de Combate à Fome e à Pobreza, estamos implementando projetos de cooperação triangular para ajudar países como Guiné-Bissau e Haiti a encontrar o rumo da reconciliação e da reconstrução. O alto valor simbólico desse gesto foi reconhecido pela ONU ao conceder ao Fundo o Prêmio da Parceria Sul-Sul.

Nossa ambição é unir não apenas três países, mas a África Austral, a América do Sul e o subcontinente indiano. Por meio de um acordo de livre comércio trilateral entre o Mercosul, a União Aduaneira Sul-Africana e a Índia, queremos fazer das trocas Sul-Sul um fator de desenvolvimento autônomo e soberano.

Nossas nações têm sabido responder às oportunidades abertas pela aceleração dos fluxos de comércio e investimentos decorrentes da globalização. As possibilidades de enriquecer nossa pauta comercial com produtos de alto valor agregado e tecnológico explicam que nossas trocas com outros países em desenvolvimento aumentem em ritmo veloz. O comércio do Brasil com a Índia multiplicou-se por cinco desde 2000, alcançando US$2,4 bilhões no ano passado. Nesse mesmo intervalo, o intercâmbio com a África do Sul triplicou para US$1,7 bilhão. Podemos fazer muito mais. Tenho certeza de que o evento empresarial à margem da cúpula do Ibas ajudará a identificar novas oportunidades de negócios.

Estamos determinados a fortalecer um fórum que expressa nossa aposta em um mundo distinto e melhor do que o atual. Nessa tarefa, continuaremos a contar com o engajamento da sociedade civil e o entusiasmo do setor privado. O Ibas encurta distâncias, aproxima povos e continentes, mas, sobretudo, forja uma visão solidária do futuro. Estou certo de que, coerente com a filosofia da tolerância e da não-violência pregada por Mahatma Gandhi e Nelson Mandela, este é o caminho a seguir na luta por um mundo justo e pacífico. O Ibas veio para ficar.