Título: A batalha da Coréia
Autor: Costa, Ana Cláudia e Costa, Célia
Fonte: O Globo, 18/10/2007, Rio, p. 18

Tiroteio durante caçada a bandidos em favela termina com um menino, um policial e dez suspeitos mortos.

Um menino de 4 anos e um policial civil morreram ontem durante um confronto na Favela da Coréia, em Senador Camará. Dez homens, que seriam traficantes, também foram mortos. Quatorze suspeitos foram presos e seis policiais civis ficaram feridos, entre eles o delegado titular da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), Rodrigo Oliveira. Veículos blindados e um helicóptero foram usados na operação, que reuniu cerca de 350 policiais. Pelo menos dois bandidos que fugiram pelo matagal foram encurralados e mortos pelos policiais que estavam no helicóptero. Um ônibus foi incendiado por moradores, por ordem do tráfico.

A operação começou por volta das 9h e terminou às 15h. Um dos objetivos era encontrar um paiol de armas do bando do traficante Márcio da Silva Lima, o Tola. Uma casa que funcionava como fortaleza do tráfico e uma casamata foram tomadas pela polícia. Houve intensa troca de tiros. Jorge Kauã Silva de Lacerda, de 4 anos, foi atingido por um disparo no peito e morreu. No mesmo confronto, o policial da Polinter Sérgio da Silva Coelho, de 43 anos, também foi baleado no peito e morreu. Em solidariedade, os colegas do policial colocaram fitas pretas nas antenas dos carros. O policial, que estava há 15 anos na Polícia Civil, será sepultado hoje, às 11h, no Cemitério do Caju.

Policial baleado ao tentar salvar garoto

A mãe de Jorge Kauã, Helen Silva de Lacerda, de 20 anos, contou que traficantes em fuga invadiram sua casa. Ela correu com os dois filhos ¿ Kauã e um mais novo ¿ no colo para a casa da sogra, em frente. Os traficantes, no entanto, atiram em direção aos três quando viram que policiais se aproximavam.

O policial Marcelo dos Santos Fernandes Silva pegou o menino ferido no colo e correu. Apesar de estar tentando salvar Kauã, os bandidos continuaram a atirar.

¿ Enquanto eu tentava sair com ele no colo, os bandidos ainda atiraram em mim. Não sei como consegui sair dali. Sei que ele chegou ao hospital com vida ¿ contou o policial, que se feriu na coxa esquerda.

No confronto, bandidos lançaram granadas. O delegado Rodrigo Oliveira foi atingido de raspão no pescoço. Ele foi retirado da favela pelo helicóptero Águia e levado para o Hospital Miguel Couto. No início da noite, por telefone, o delegado disse que nasceu de novo.

¿ Fui lá resgatar um amigo (o policial da Polinter que foi morto) e acabei sendo baleado. O pescoço ainda está doendo muito, mas acho que nasci de novo ¿ disse ele.

No confronto outros dois policiais civis também ficaram feridos, um deles por estilhaços de granada no nariz, e o segundo atingido na mão. Outro policial torceu o pé durante a operação. Segundo o delegado Alan Turnowsky, diretor de Departamento de Polícia Especializada (DPE), que chefiou a operação, a participação do helicóptero foi essencial para que a polícia encontrasse bandidos escondidos na mata no alto do morro.

¿ Faço questão de destacar o trabalho da equipe do helicóptero, porque era uma área plana e mesmo assim eles conseguiram manter os bandidos na área de confronto e assim impedir que eles fugissem ¿ disse o delegado.

Foram apreendidos uma metralhadora .30, cinco fuzis, seis pistolas, quatro granadas, grande quantidade de munição, carregadores, rádios e vinte quilos de maconha, além de de cocaína e crack. Segundo o delegado Alan Turnowsky, o bando do traficante Tola, além de formação de quadrilha, vai responder por homicídio, já que foram os traficantes que atiraram na casa onde estavam a criança e o policial civil. O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, disse que a operação foi positiva, mas lamentou a morte do policial e da criança.

¿ A sociedade precisa ver que isso é um problema histórico, cultural e complexo. Não será com ações leves que vamos resolver esse problema. A polícia não vai com a intenção de matar ninguém, mas também não vai para morrer ¿ disse o secretário durante a apresentação do material apreendido e dos bandidos presos.

O chefe da Polícia Civil, delegado Gilberto Ribeiro, negou que os policiais tenham subdimensionado a reação dos traficantes. Segundo ele, a operação foi planejada depois de um trabalho de inteligência:

¿ A gente tem alternado operações que não há resistência de bandidos e outras em que há. Nossa preocupação é desarmar os criminosos.

COLABORARAM Elenilce Bottari e Marcelo Dias (do Extra)

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