Título: Greves e divórcio fazem o inferno de Sarkozy
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 19/10/2007, O Mundo, p. 34

Separação de presidente da França é anunciada no dia em que sindicatos paralisam o país, em protesto contra reformas.

PARIS. Dupla crise para o presidente Nicolas Sarkozy, cinco meses depois de assumir o poder. Ontem, no dia em que a França era tomada por uma greve nos transportes que praticamente fez parar trens e ônibus, o Palácio do Eliseu anunciou o que todos sabiam: o presidente se divorciou de sua mulher, a ex-modelo Cecília Sarkozy, de 49 anos, com quem tem um filho. Era o segundo casamento dos dois.

Rumores já circulavam por Paris há semanas. Desde a posse de Sarkozy, Cecília estava cada vez mais distante, não comparecendo à maior parte dos grandes eventos ao lado do marido. Habitualmente expansivo, o presidente francês parecia ontem apagado e discreto na reunião de líderes da UE, que se realiza em Lisboa.

Sarkozy e sua mulher, portanto, prepararam cuidadosamente tudo antes do anúncio oficial. O público só foi informado ontem, mas um juiz de Nanterre pronunciou o divórcio na segunda-feira. Isso quer dizer que o pedido do casal foi feito bem antes.

Advogada recebeu do casal um acordo pronto

Mantendo a tradição francesa, que detesta discutir a vida privada de políticos, sobretudo de um presidente, o primeiro comunicado oficial do Palácio do Eliseu foi lacônico e sequer mencionava a palavra ¿divórcio¿, apenas separação. Começou então na imprensa uma guerra para interpretação dos fatos.

¿ Se separar é se divorciar. Eles se divorciaram em consentimento mútuo ¿ dizia o segundo comunicado do Eliseu.

Foi através da advogada do casal, Michèle Cahen, que se soube que o divórcio já havia sido pronunciado pelo tribunal na segunda-feira. A advogada disse que o casal chegou a ela já com um acordo pronto: só coube à advogada redigi-lo na forma adequada. A guarda do filho do casal, Louis, de 10 anos, será conjunta. O menino, no entanto, viverá com a mãe.

As pessoas próximas ao presidente silenciaram ontem. Até a oposição resiste em transformar o caso em novela. O porta-voz do Partido Socialista, Benoît Hamon, se recusou a comentar o divórcio alegando que isso ¿é da esfera privada¿, e fez um apelo:

¿ Acabemos com o folhetim tipo ¿People¿ ¿ disse.

Nicolas Sarkozy e Cecília moravam juntos desde 1987, e se casaram no dia 23 de outubro de 1996. Do primeiro casamento, cada um tinha dois filhos: Cecília, duas meninas, Sarkozy, dois meninos. Ela era o tipo de mulher que estava sempre ao lado do marido. No governo Chirac, quando Sarkozy foi várias vezes ministro, Cecília tinha até gabinete. Diz-se que muita vezes era preciso passar pelo seu crivo para se chegar a Sarkozy. Mas em 2005 veio a grande crise do casal, que se separou brevemente. Ela foi fotografada em Nova York com outro, o publicitário Richard Attias. E Sarkozy, dizem os rumores, teve um caso com uma jornalista do jornal conservador ¿Le Figaro¿.

Eles se reconciliaram no início de 2006. Mas desde então, o casal não parecia ser o mesmo. O sinal mais gritante veio ainda na eleição: Cecília não votou no segundo turno. Amigos disseram que ela não suportou a ¿terrível pressão¿ de ser primeira-dama.

Não foi por acaso que o Eliseu anunciou o divórcio ontem, com o país paralisado. Os sindicatos mostraram sua força. Segundo estimativas, 300 mil pessoas se manifestaram, 25 mil delas em Paris. O tráfego de trens foi paralisado em 75% e 90% dos condutores não trabalharam.

Os manifestantes protestaram contra a reforma dos regimes especiais de aposentadoria que o governo quer fazer ainda este ano. É apenas o começo da batalha do governo. Sarkozy quer reformar todo o sistema de Previdência e cortar 23 mil postos do serviço público em 2008.