Título: Procurador diz que governo deixou de fiscalizar repasses feitos a ONGs
Autor: Camarotti, Gerson e Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 26/10/2007, O País, p. 10

Segundo Lucas Furtado, organizações receberam mais de R$12,5 bilhões.

BRASÍLIA. O chefe do Ministério Público no Tribunal de Contas da União, Lucas Furtado, afirmou ontem, em depoimento à CPI das ONGs, que, desde a década de 90, o governo federal deixou de fiscalizar a aplicação de R$12,5 bilhões repassados a organizações não-governamentais desde a criação destas entidades. Segundo ele, o governo não analisou nem mesmo a prestação de contas das ONGs referentes a gastos da ordem de R$10,7 milhões. O restante, R$1,8 bilhão, está relacionado a convênios em que as entidades sequer prestaram contas.

- Não há como garantir que o dinheiro repassado a ONGs tenha, de fato, beneficiado a população. Da forma que está, só não desvia dinheiro quem não quer - afirmou o procurador.

Lucas Furtado destacou ainda que, mesmo diante da frouxidão da fiscalização, o governo deverá repassar ano que vem R$4 bilhões para ONGs. O Executivo federal argumenta que muitas das organizações prestam serviços essenciais, como atendimento de saúde aos índios, e não podem suspender suas atividades.

Decreto vai regulamentar atividades de ONGs

O secretário de Planejamento Estratégico do Ministério do Planejamento, Afonso de Oliveira, presente à sessão da CPI, disse que o decreto de regulamentação das atividades das ONGs, previsto para entrar em vigor em janeiro, corrigirá parte das falhas. O decreto prevê a criação de um cadastro de ONGs em situação regular com a execução de serviços e a prestações de contas ao governo. ONGs fora do cadastro não poderão receber recursos públicos.

O governo deverá proibir também a assinatura de convênios inferiores a R$100 mil. A pulverização dos convênios inviabilizaria a fiscalização. Pelas novas regras, os órgãos governamentais terão que explicar como farão a fiscalização.Hoje, não existem normas claras sobre procedimentos a serem adotados por órgãos federais para detectar e conter desvios de dinheiro repassado às ONGs.

Para Afonso Oliveira, as regras deverão reduzir o número de convênios anuais com ONGs de 32 mil para 15 mil. Muitas ONGs não teriam condições de renovar contratos ou assumir novas obrigações por não prestarem contas ou por não se enquadrarem nas exigências de idoneidade e experiência. Para o Ministério do Planejamento, o corte dessas ONGs não habilitadas representará economia anual de R$1,5 bilhão.

Lucas Furtado considera as medidas importantes, mas insuficientes. Para ele, o governo precisa estabelecer critérios para a escolha das ONGs, como uma espécie de concurso público. Segundo o procurador, sem regras claras, os administradores ficam livres para fazer contratações com base em compadrio ou indicações políticas.