Título: Vistoria na base do olhômetro
Autor: Magalhães, Luiz Ernesto e Marqueiro, Paulo
Fonte: O Globo, 26/10/2007, Rio, p. 12

CAOS NA CIDADE

Inspeção de encosta sobre Rebouças é feita por funcionários de órgão de trânsito.

Omonitoramento das encostas do Túnel Rebouças, de onde deslizaram cerca de sete mil toneladas de terra, provocando na terça-feira à noite o fechamento da principal via de ligação entre as zonas Norte e Sul da cidade por prazo indeterminado, não é feito por pessoal especializado, mas por um órgão de trânsito: a Coordenadoria de Vias Especiais (CVE). A informação foi dada ontem pelo presidente da Geo-Rio, Mauro Baptista. Ele argumenta que a CVE faz a inspeção visual e, ao constatar algum problema, chama técnicos da Geo-Rio. O coordenador de Vias Especiais do município, major Farias, confirma a informação e diz não ver qualquer problema:

- Temos engenheiros em cada uma de nossas cinco bases no Rebouças - diz Farias, acrescentando que as inspeções são feitas diariamente.

Anteontem, o secretário municipal de Obras e Serviços Públicos, Eider Dantas, havia informado que o monitoramento das encostas do Rebouças - túnel que recebe cerca de 190 mil veículos por dia - não era feito pela CVE, mas pela Geo-Rio, órgão especializado em contenção de encostas.

No Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, onde ocorreu o maior acidente da aviação brasileira, com o Airbus A-320 da TAM, as inspeções na pista molhada, pouco antes da tragédia, também foram feitas no olho.

Especialista: vistoria devia ser quinzenal

O presidente da Geo-Rio não soube informar quando foi feita a última inspeção técnica nas encostas do Rebouças. De início, disse que as montanhas onde ficam as bocas do túnel não apresentam problemas e, por isso, não há relatórios do órgão sobre a situação. Depois, afirmou que, há cerca de um mês, técnicos da Geo-Rio passaram no local, deram uma olhada e constataram que estava tudo bem.

Mais cedo, no local do deslizamento de terra, Baptista havia afirmado que o órgão faz cerca de duas mil vistorias em encostas por ano. E que ontem, por causa da chuva, seus técnicos estavam examinando vários pontos junto com agentes da Defesa Civil do Município.

- Até então, o túnel nunca tinha nos preocupado, porque, em 15 anos, nunca apresentou qualquer sinal de problema - disse Baptista.

Especialistas alertaram para a necessidade de um monitoramento sistemático das encostas de um túnel vital para o Rio. Ana Luíza Coelho Netto, professora do Laboratório de Geo-Hidroecologia do Instituto de Geociências da UFRJ, diz que, pela importância do túnel para a cidade, o monitoramento devia ser feito pelo menos quinzenalmente:

- O monitoramento é sempre importante em áreas críticas, como o Rebouças. Aparentemente, aquela área era estável. E, se mesmo nesses lugares acontece isso, imagina nos que são instáveis. A grande lição que esse deslizamento deixa é que aparências enganam. Então, que se estabeleça um critério de observação.

Ana Luíza estranhou também que a tarefa de monitorar a encosta do túnel esteja a cargo da CVE. - Isso não é o mais apropriado, porque requer um olhar técnico. Se houver uma evidência mais abrupta, até um leigo, às vezes, pode perceber. Mas, no caso de monitoramento preventivo, o ideal é que seja feito por técnicos da Geo-Rio.

Para o presidente da Associação Brasileira de Mecânica de Solos e Engenharia Geotécnica, Alberto Sayão, o Rio deixou de investir na prevenção. Segundo ele, sondagens em encostas podem identificar com antecedência riscos de deslizamentos.

- Em 1995 e 1996, a prefeitura mantinha convênios com universidades para fazer esses diagnósticos - disse Sayão, que é professor da PUC e foi do conselho consultivo da Geo-Rio. - Não é possível afirmar que essas sondagens poderiam ter identificado o problema, mas a chance seria maior do que só com inspeções visuais.