Título: Pequenas e médias empresas sofrem ainda mais com falta de qualificação
Autor: Ribeiro, Fabiana; Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 29/10/2007, Economia, p. 20

Sem profissionais especializados, é difícil atender plenamente aos clientes.

RIO e TORITAMA (PE). Maiores empregadoras do país, e normalmente a porta de entrada para os jovens no mercado de trabalho, as pequenas e médias empresas são também as que mais sofrem com a baixa qualificação dos brasileiros. Sem mão-de-obra adequada, não têm como atender plenamente a seus clientes - em geral, grandes empresas. Muitas deixam de participar de licitações e, por isso, perdem contratos. E ainda freiam futuros investimentos, por não terem quem os executem, explicam especialistas.

- Esse atual desequilíbrio entre a oferta de mão-de-obra e a demanda por profissionais atinge em cheio esses empresários. Mesmo porque esses empreendedores são os grandes empregadores do país. Para se ter idéia, 80% das vagas de primeiro emprego são nas pequenas empresas - afirma Luiz Carlos Barboza, diretor-técnico do Sebrae Nacional.

Na Infotec Solutions, de serviços de engenharia e tecnologia, há carência constante de analistas, programadores, gente de calderaria, perfuração de petróleo, soldadores e de profissionais com certificações em, por exemplo, Java. Muitas vezes, uma vaga com necessidade imediata leva dois meses para ser preenchida.

- A cada cinco provas que fazemos de seleção, apenas um é aprovado. Com isso, a empresa perde dinheiro, pois perde a chance de participar de licitações. Muitos editais da Petrobras exigem uma série de requisitos curriculares dos profissionais da empresa. Então, os qualificados que temos são insubstituíveis - disse Anna Ghiatã, diretora da empresa, frisando que alguns profissionais são sempre assediados.

Sondagem da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com 1.714 empresas constatou que, entre as pequenas e médias, a queixa sobre qualificação dos profissionais é mais comum. Entre as pequenas, 60% relataram que a falta de mão-de-obra qualificada é um problema. Nas médias, a parcela foi de 55% e, entre as grandes, de 45%.

- Os pequenos empresários costumam reclamar que, quando investem em treinamento, os funcionários que recebem a qualificação muitas vezes saem do emprego para trabalhar em grandes empresas - afirma Renato da Fonseca, que coordenou a pesquisa da CNI.

Por isso, Barboza, do Sebrae, destaca que os prejuízos da pequena empresa com a falta de qualificação se propagam por toda a economia. Elas estão na ponta da cadeia já que, tradicionalmente, são um celeiro de trabalhadores para grandes empresas:

- As companhias menores são clássicas formadoras de capital humano para as empresas de maior porte. Além de garantirem aos profissionais um aprendizado prático.

Na consultoria Laboris, o assédio da concorrência foi tão forte que a empresa perdeu 20% dos funcionários este ano, principalmente na área de tecnologia da informação. E isso apesar de a firma ter aumentado em 25% a média de remuneração dos seus empregados. Mesmo contabilizando as perdas na equipe, a consultoria conseguiu ampliar em 30% seu quadro de pessoal, para 150 funcionários, para fazer frente ao aquecimento do mercado, que provocou um acréscimo de 40% na carteira de projetos da Laboris.

- A disputa está acirrada e tivemos que suar para encontrar soluções. Levamos pessoas de Manaus para Curitiba, de Minas para São Paulo. Até na busca por recém-formados, já há um leilão entre empresas concorrentes - afirma João Carlos Rios, diretor da Laboris.

Conhecida como a capital do jeans, a cidade de Toritama, em Pernambuco, responde por 16% de todas as peças fabricadas nesse tecido no país. O município possui apenas 26 mil habitantes, mas a população flutuante diária é ao menos três vezes maior, segundo o presidente da Associação Comercial e Industrial de Toritama, Nieliton Martins. Ele afirma que o problema da falta de mão-de-obra é recorrente entre as pequenas confecções da cidade.

- Não temos um só curso de formação para o setor no município. Resultado: praticamente todas as empresas operam com capacidade ociosa - diz o empresário, dono da Marticon. - Na minha fábrica, 10% das máquinas estão totalmente ociosas. Não encontro gente qualificada para preencher as vagas. Sinto falta de tudo: estilista, encarregado de produção, cortador, costureira.