Título: Esperança de cura
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 17/04/2009, Brasil, p. 10

SAÚDE

Pesquisadores da Unesp recebem autorização para testar em humanos técnica que utiliza células-tronco no tratamento do enfisema pulmonar. Método obteve sucesso com camundongos

A exemplo do que já acontece com diabéticos e cardíacos, pacientes que sofrem de enfisema pulmonar poderão ser beneficiados pelas pesquisas com células-tronco. Ontem, a equipe do médico geneticista João Tadeu Ribeiro Paes, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), comemorou a aprovação, por parte da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), dos testes com humanos de um novo tratamento. Inicialmente, serão incluídos no experimento quatro pacientes em estágio avançado da doença, que acomete 2 milhões de pessoas no Brasil.

Cálculos do Ministério da Saúde apontam 97 mil mortes anuais provocadas por patologias do aparelho respiratório. Entre essas doenças está o enfisema pulmonar, causado por agentes externos, como cigarro e poluição, que inflamam brônquios e destroem os alvéolos. Assim, o oxigênio não chega à corrente sanguínea, e o doente perde a capacidade de respirar num ritmo normal.

A Conep afirma, por meio da assessoria de imprensa, que não tem condições de checar se houve a aprovação da pesquisa ou de detalhar os termos da autorização. O professor João Tadeu, entretanto, explicou que a primeira fase do estudo, liberado pelo órgão, terá como objetivo primordial certificar se o tratamento não acarretará danos à saúde do paciente. ¿O foco ainda não é a eficácia do estudo. Mas é claro que, paralelamente, veremos se haverá melhoras¿, afirma o geneticista. Ele ressalta, porém, que ainda serão necessários muitos testes até se chegar a uma terapia disponível a todos. ¿Não podemos criar falsas expectativas para as pessoas, especialmente para aquelas com quadro agravado, para quem não há muita alternativa¿, destaca.

Um médico de 72 anos, morador de São Paulo, cuja identidade não foi revelada, provavelmente integrará o grupo de quatro pacientes que passarão pelos testes. Os outros três voluntários ainda serão triados no Instituto de Moléstias Cardiovasculares, que fica em São José do Rio Preto (SP), onde a experiência ocorrerá. ¿Esse médico está em fase terminal da doença e há mais de um ano manifestou interesse, enquadra-se perfeitamente nos critérios¿, aponta João Tadeu. Para participar, além de apresentar quadro grave, é necessário ter entre 40 e 76 anos. O humorista Chico Anysio é um dos voluntários (leia abaixo).

Procedimento Em centro cirúrgico e com anestesia local, serão retirados cerca de 150ml de medula óssea dos pacientes voluntários da pesquisa. O material passará por uma purificação em laboratório para ser reinjetado no paciente. Por meio de exames dos mais variados tipos, a equipe de João Tadeu verificará como evolui o estado de saúde do doente. A intenção é que se verifique, com os humanos, o mesmo fato ocorrido com camundongos. A pesquisa com o modelo animal mostrou uma eficiente recuperação do tecido pulmonar. ¿O método que utilizamos para determinar a regeneração (do pulmão de camundongos) não é apropriado para estimarmos resultados em porcentagem. Podemos dizer que a regeneração foi estatisticamente significativa¿, diz o médico.

Coordenador da comissão de doença pulmonar obstrutiva crônica da Sociedade Brasileira de Pneumologia, Alberto Cukier vê com bons olhos o avanço da ciência, mas é cauteloso quanto aos resultados. ¿Sabemos que está longe de ser aplicável na prática¿, diz . Para os casos graves, ele lembra, a única intervenção é o transplante de pulmão. Cukier ressalta o grande impacto da doença na saúde pública em função do caráter debilitador. ¿Até chegar à mortalidade, os pacientes vão se tornando incapazes de realizar muitas atividades, demandam pessoas para cuidarem deles¿, afirma. Alguns não conseguem caminhar ou tomar banho sozinhos. A evolução rápida do enfisema pode ser evitada se o mal for diagnosticado precocemente. Os principais sintomas são tosse frequente e falta de ar.

O tratamento inclui remédios, mas está principalmente focado na mudança de comportamentos. ¿Como 85% das pessoas que têm enfisema eram ou são fumantes, a única certeza é que abandonar o cigarro pode mudar o curso da doença¿, destaca o médico.