Título: FGV: CPMF é usada para custear a máquina
Autor: Oliveira, Germano
Fonte: O Globo, 27/10/2007, O País, p. 14

Segundo a pesquisa, governo gasta boa parte da contribuição no pagamento da folha em vez de investir na saúde.

SÃO PAULO. O governo desvirtuou a finalidade da aplicação dos recursos da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), segundo pesquisa divulgada ontem pela Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas. Em vez de usar os mais de R$32 bilhões arrecadados anualmente com o tributo em investimentos na área de saúde, de acordo com o que determina a lei 9311/96, que instituiu a CPMF, o governo vem usando a totalidade do dinheiro no custeio da máquina administrativa, como o pagamento de funcionários. O estudo da FGV em São Paulo obteve as informações com base no programa Siga Brasil, de acompanhamento do Orçamento do Senado.

- Está havendo um profundo desvirtuamento da finalidade da CPMF. O governo está aplicando 100% dos recursos no financiamento da máquina administrativa e zero em investimento na saúde, que é o objetivo da contribuição. Com esse desvio, a CPMF deixa de ser contribuição e passa a ser imposto, e isso contraria a finalidade - disse a professora Tathiane Piscitelli, que comandou a pesquisa sobre os recursos da CPMF de 2000 a 2006.

Desde que a contribuição foi instituída, apenas em alguns momentos o governo aplicou em investimentos. De 2000 a 2005, segundo Tathiane Piscitelli, houve alguns períodos de investimentos na saúde, mas os valores foram muito baixos.

- Mesmo assim, quando se investiu na saúde, foi menos de 1% do valor arrecadado. Em 2002 aplicou-se alguma coisa em investimentos, mas apenas 0,02% de todos os recursos autorizados por lei foi investido em despesas de capital. O restante foi direcionado para a categoria "outras despesas correntes".

Arrecadação subiu 86%, mas quase nada foi investido

Segundo a professora, o dinheiro deveria estar sendo aplicado na construção de hospitais e na compra de maquinário, mas o governo usa os recursos para financiar a máquina administrativa:

- Em 2006, dos R$32 bilhões arrecadados, não se aplicou nada em investimentos.

De 2000 a 2006, de acordo com o estudo, a arrecadação da CPMF, que este ano pode chegar a R$40 bilhões, cresceu 86%, mas praticamente nenhum tostão foi investido na saúde. Segundo a pesquisadora, este ano ela ainda não sabe como os recursos foram aplicados, porque o Orçamento ainda não fechou. O trabalho usou dados consolidados. Ela explica que falta transparência de como os gastos são feitos. Por exemplo, que tipo de material de consumo é pago com os recursos da CPMF: é seringa ou é papel para a burocracia?

- Chegamos a duas conclusões. A CPMF deixou de ser contribuição para ser imposto, e não foi para isso que foi criada. E isso explica por que o governo não pode perder esse imposto, já que sem ele teria terá problemas na máquina governamental, em despesas correntes, no pagamento de funcionários, pagamento de diárias, subvenções, auxílio-alimentação, auxílio-transporte e outras despesas. A máquina ficou dependente desses recursos - diz Tathiane.

Lei define que percentual é para investimentos

Ela explica que, da alíquota de 0,38% da contribuição, 0,2% vai para a saúde, 0,1% para a Previdência Social e 0,08% para a erradicação da pobreza.

- Realmente, esses percentuais vão mesmo para cada uma dessas rubricas. Até vai dinheiro para os programas sociais, o Bolsa Família, mas não em forma de investimentos na saúde, como estabelece a lei. A CPMF vem custeando o sistema de saúde, mas ela foi criada para melhorar o sistema e atender melhor as pessoas, o que não está acontecendo.

Como exemplo, a pesquisadora mostra que, de 2001 a 2006, o 0,1% destinado à Previdência foi usado para o custeio de aposentadorias, reformas de funcionários, pensões e outras despesas, afastando-se da finalidade original da contribuição.

- A lei não está sendo respeitada - afirma a pesquisadora da FGV.