Título: FGTS financiará casa própria para classe média
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 31/10/2007, Economia, p. 27

Crédito com juro mais baixo poderá ser concedido a quem ganha mais de R$4,9 mil, mas só 11 mil devem se beneficiar.

BRASÍLIA. O Conselho Curador do FGTS aprovou ontem o fim do limite de renda para compra da casa própria com linhas de financiamento que usam recursos do Fundo. Agora, famílias que ganham acima de R$4,9 mil poderão, a partir de janeiro de 2008, adquirir imóveis com as taxas de juros mais baixas que esses empréstimos oferecem. Até então, apenas famílias de baixa renda tinham acesso às linhas. Poucos brasileiros, no entanto, serão atendidos, pois a nova modalidade terá apenas R$1 bilhão, o que beneficiará cerca de 11 mil famílias, pelos cálculos da Caixa Econômica Federal.

Além disso, só poderão se candidatar ao empréstimo trabalhadores com conta no FGTS há mais de três anos. No caso de quem tem conta inativa, será exigido um saldo mínimo de 10% do valor do financiamento. Também será preciso atender às regras gerais do Fundo, que proíbem a contratação dos recursos para quem tem imóvel em seu nome na cidade onde mora e trabalha ou paga financiamento imobiliário.

A nova linha permitirá a compra de imóveis de até R$350 mil, com limite de empréstimo de R$245 mil - as mesmas regras do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), que usa recursos da poupança e tem juros médios de 10,5% a ano, segundo o mercado. Na nova modalidade, a taxa cobrada do mutuário será de 8,66% anuais.

- São os juros mais baixos para financiamento da casa própria do Brasil - disse o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, presidente do Conselho Curador.

Para Caixa Econômica, medida é democrática

Em outro afago à classe média, o conselho também aprovou a elevação do montante de recursos do saldo do FGTS que os trabalhadores podem utilizar para abater a prestação da casa própria. O percentual dobrou para quem tem renda acima de 12 salários mínimos, para 80%. A medida vale tanto para empréstimos com recursos do Fundo quanto para os da poupança.

Isso significa que, numa prestação de mil reais, em vez de abater mensalmente R$400, o mutuário agora poderá descontar R$800 - arcando com apenas R$200 do próprio bolso. O percentual será o padrão para todas as faixas de renda.

O fim do limite de renda para crédito imobiliário com recursos do Fundo vai em sentido contrário às promessas do governo de direcioná-los à moradia de baixa renda - onde se concentra o déficit habitacional (92% dos desatendidos são famílias com rendimento de até cinco salários mínimos). Atender a esse público foi uma da propostas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao criar o Ministério das Cidades.

Nas discussões, o ministro das Cidades, Márcio Fortes, foi vencido pelo colega do Trabalho, segundo membros do Conselho. Para Lupi, a medida beneficia todos os cotistas do FGTS, os donos dos recursos. Até então, somente poderiam acessar a linha de crédito famílias com renda até R$4.900.

- Estamos dando preferência a todos os cotistas para que possam também comprar a casa própria - disse Lupi.

O secretário-executivo do Conselho, Paulo Furtado, argumentou que a medida tem lógica, pois o FGTS é sustentado pelos trabalhadores com maior renda. Segundo ele, 18% dos participantes do FGTS com salários mais elevados respondem por 97% do seu total ativo, de R$190 bilhões.

Na avaliação da Caixa, gestora do FGTS, o fim do limite vai permitir que todo o orçamento de habitação do Fundo seja efetivamente gasto. Além disso, vai democratizar o atendimento.

- O FGTS não atendia a necessidade social dos trabalhadores de classe média, que têm despesas, pagam plano de saúde e não têm casa. É a nossa história de vida - disse o vice-presidente da Caixa, Joaquim Maria.

Confederação de instituições financeiras contesta a linha

Para José Pereira Gonçalves, representante da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNIF), o único voto contrário à proposta, o mercado já dispõe de recursos para atender a essa camada. Somando recursos próprios, da poupança e do FGTS, foram ofertados este ano R$17 bilhões em crédito imobiliário, e a previsão é chegar a R$20 bilhões em 2008.

O presidente do Sinduscom-RJ, Roberto Kauffmann, contestou, avaliando que o mercado será ampliado para uma faixa de renda que não tinha acesso a juros mais baixos.