Título: Em guerra pelo gás
Autor: França, Mirelle de; Ribeiro, Erica
Fonte: O Globo, 01/11/2007, Economia, p. 25

O GARGALO É NOSSO

Justiça manda Petrobras normalizar fornecimento. Gabrielli diz que pode haver aumento.

Legenda da foto: FRENTISTAS do Autoposto Quatro Amigos, no Rocha, ficaram sem trabalhar até que o técnico da CEG (foto ao lado) liberasse o lacre para funcionamento do posto, depois que a Justiça obrigou a estatal a restabelecer o fornecimento de gás natural

Durou 24 horas a suspensão do fornecimento de gás natural para grandes clientes no Rio. Graças a uma liminar impetrada pelo governo do estado, a Petrobras foi obrigada a restabelecer, ontem, a entrega do combustível para as distribuidoras CEG e CEG Rio. A estatal já anunciou que vai recorrer da decisão e ameaça com novos cortes se a liminar for derrubada.

- Sempre que precisarmos de gás acima do volume contratado e se houver uma demanda das usinas térmicas, nós negociaremos com as distribuidoras de gás afetadas pelo corte - afirmou Graça Foster, diretora de Gás e Energia da Petrobras.

Apesar de curta, a paralisação foi suficiente para reacender o sinal de alerta sobre a iminência de um apagão de energia. De acordo com o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, o episódio é apenas "a ponta do iceberg":

- Esse foi um sinal de que já está faltando energia. Temos que sentar à mesa para evitar o apagão.

Estudo preliminar da Firjan estima que o prejuízo para produção industrial do estado foi de R$19,6 milhões. O cálculo foi feito com base na participação de 25% do gás natural no consumo da indústria fluminense - contra 9,6%, na matriz energética brasileira.

Entre as principais empresas atingidas no Rio estão a Bayer (que deixou de produzir 150 mil quilos de matéria-prima para a fabricação de poliuretano) e a Cosigua (onde houve paralisações em dois laminadores de aço). Com a regularização do abastecimento, a produção das empresas foi retomada.

Preço pode subir, diz Gabrielli

O governo do Rio deu entrada no Tribunal de Justiça do Rio com pedido de liminar por volta de 22h de terça-feira, e a decisão judicial foi concedida antes da meia-noite pela juíza Natacha de Oliveira. Os advogados pediram a manutenção do suprimento de gás de 7,57 milhões de m por dia, após corte de 1,3 milhão de m diário). A intimação chegou às 6h07m de ontem à Refinaria de Duque de Caxias (Reduc) e deu quatro horas para que a Petrobras retomasse o fornecimento, sob pena de multa de R$500 mil por hora.

Em Londres, o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, disse que a empresa vai recorrer e que o preço do gás natural deve subir para os consumidores finais no Brasil, a médio e longo prazo, de acordo com informações da BBC Brasil. Segundo ele, a Petrobras não tem condições, "pelo menos a curto prazo", de atender a demanda por gás natural.

Para manter o fornecimento de gás natural para a CEG e CEG Rio, por decisão judicial, a Petrobras está deixando de fornecer às usinas térmicas gás suficiente para a produção de 280 megawatts de energia elétrica. A empresa tem um compromisso com o Operador Nacional do Sistema (ONS) de fornecer gás para a geração de energia pelas usinas térmicas, quando solicitada pelo ONS.

- A ONS está dizendo para acionar as térmicas e guardar água. O preço da água e o da energia das térmicas põe na linha de prioridade a geração de energia a gás natural. Não há hoje razão para estarmos preocupados com a demanda elétrica do país - afirmou Graça Foster.

O ONS explicou que solicitou gás natural à Petrobras para as térmicas porque, no período de estiagem, o nível dos reservatórios cai, o que torna o preço da energia gerada pelas hidrelétricas menos competitivo que o das térmicas no mercado de energia de curto prazo (ou spot). Mas o órgão ressaltou que o nível dos reservatórios está em 60% e que, portanto, não há escassez de água para a geração de energia.

O corte de fornecimento de gás natural foi o primeiro realizado até hoje pela Petrobras. A companhia vinha negociando com a CEG um novo modelo de contrato para oferecer alternativas ao gás natural ou reduzir o fornecimento, na falta do insumo. Até agora, nenhuma distribuidora aceitou a mudança. Segundo Graça, é preciso renegociar os contratos, já que as distribuidoras estão recebendo gás acima do estabelecido em contrato. No Rio, o fornecimento está 2,4 milhões acima do contratado e, em São Paulo, em 2 milhões.

A redução no fornecimento também afetou as revendas de gás natural veicular (GNV). Os postos que ficaram abertos registraram filas e alguns chegaram a fazer reajustes, como o Rocal, em Botafogo, que elevou o preço final do produto em R$0,10. Já o Quatro Amigos, no Rocha deixou de faturar cerca de R$15 mil.

(*) Com agências internacionais