Título: Com a FAB, ministros voam sem caos aéreo
Autor: Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 04/11/2007, O País, p. 8

Este ano, 43 viagens foram feitas em caráter particular nos aviões oficiais.

BRASÍLIA. Em tempos de crise aérea nos aeroportos do país, os ministros do governo Lula informaram ter feito este ano 447 viagens em aviões da FAB, sendo 43 delas em caráter particular, de Brasília para os seus locais de residência ou vice-versa. Os números foram obtidos em enquete feita pelo GLOBO com 35 ministros, respondida por 19 deles. Apenas seis autoridades reconheceram ter percorrido trechos sem estar em missões oficiais. São elas: Tarso Genro (Justiça), Dilma Rousseff (Casa Civil), Patrus Ananias (Combate à Fome), Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário), Alfredo Nascimento (Transportes) e Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência).

Esse tipo de viagem não é ilegal, foi regulamentado por um decreto assinado em 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, mas é alvo constante de críticas. O privilégio foi rechaçado, inclusive, por três ministros ouvidos na pesquisa: Márcio Fortes (Cidades), Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência da República) e Carlos Lupi (Trabalho). A viagem em aeronaves oficiais garante às autoridades distância das filas e das confusões nos aeroportos durante a crise aérea.

"Mesmo quando o ministro (Márcio Fortes) vai a trabalho ao Rio, onde mora e para onde vai todos os fins de semana, ele paga as passagens do próprio bolso, em vôos comerciais", diz a resposta enviada pela assessoria de imprensa do ministro das Cidades.

Tarso Genro foi o que mais utilizou a FAB

Dos 35 ministros consultados, 16 não informaram o número de viagens feitas. Desses, dez sequer responderam aos pedidos feitos pelo GLOBO por telefone e e-mail. Para todos eles, foram feitas as mesmas duas perguntas, entre segunda e terça-feira desta semana: 1) Quantas viagens em aviões da FAB foram feitas pelo ministros em 2007?

2) Quais foram os motivos das viagens?

Entre os que responderam, Tarso Genro é o que mais viajou pela FAB. O ministro percorreu 95 trechos em aviões oficiais, sendo oito deles entre Brasília e Porto Alegre, onde tem residência. No dia 26 de outubro, por exemplo, Tarso foi de São Paulo para Porto Alegre em avião da FAB para "inauguração da placa nominativa do Viaduto José Eduardo Utzig", segundo divulgou sua assessoria, seguindo para Brasília no mesmo dia. Utzig foi coordenador de campanha de Tarso na campanha para o governo do Rio Grande do Sul em 2002.

Dilma Rousseff e Patrus Ananias informaram ter feito viagens para as cidades onde têm residência. Seis dos 31 trechos percorridos por Dilma este ano em avião oficial tiveram essa finalidade. Patrus fez 24 das 63 viagens fora de missões oficiais. A ministra do Turismo, Marta Suplicy, que durante o auge do apagão aéreo recomendou o "relaxa e goza" aos passageiros, disse ter percorrido 74 trechos em aeronaves da Aeronáutica, mas não informou se entre eles há viagens para São Paulo não relacionadas a compromissos oficiais.

Temporão divulgou suas viagens e as de Serra

Já a relação de viagens de José Gomes Temporão (Saúde) enviada ao GLOBO não deixa claro se, entre suas viagens ao Rio (40), há trechos percorridos exclusivamente para períodos de descanso. A assessoria de imprensa de Temporão também divulgou uma lista com 60 viagens do ex-ministro José Serra (PSDB-SP), mas não enviou as relações de outros quatro ministros que ocuparam o cargo, entre eles (Barjas Negri, Humberto Costa, José Saraiva Felipe e Agenor Álvares).

O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, respondeu apenas que realizou viagens permitidas por lei, e afirmou que o número de deslocamentos poderia ser obtido na FAB, que não os informou. Outros, como Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais) e Nelson Jobim (Defesa), disseram não ter como contabilizar o número das viagens. O ministro da Controladoria Geral da União (CGU) informou nunca ter usado avião da FAB.

Embora tenha reconhecido ter usado aeronave particular em uma ocasião, Luiz Dulci se declarou contra o benefício. Por sua assessoria, disse que "nunca" viaja em aviões da FAB em caráter particular, e que "a única exceção" foi um vôo em setembro de 2005, de Brasília para Belo Horizonte, por motivo de doença em sua família: "Mesmo quando se trata de compromissos de governo, o ministro Luiz Dulci viaja em vôos comerciais".

Como o número de aeronaves é limitado, a escolha de quem será atendido obedece a dois critérios, um escrito na lei e outro não. O primeiro dá prioridade aos ministérios mais antigos. E o segundo prestigia quem tem mais influência. Um exemplo disso: apesar de o Ministério de Relações Institucionais ter sido criado em 2003, por exemplo, Mares Guia é um dos que mais utiliza o serviço - principalmente para retornar para Belo Horizonte no fim da semana.

Mares Guia também lança mão de um expediente muito comum entre os ministros: a carona. No seu caso, é comum ele compartilhar uma aeronave com o vice-presidente José Alencar, que também é de Belo Horizonte - e tem preferência na hierarquia do governo.