Título: Nova tragédia aérea em SP
Autor: Barbosa, Adauri Antunes; Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 05/11/2007, O País, p. 3

Jato cai sobre casas, matando 8 pessoas, logo após decolar do Campo de Marte.

Oito pessoas morreram e duas ficaram feridas na queda de um avião ontem por volta das 14h10m em São Paulo. Cerca de três minutos após ter decolado do Aeroporto Campo de Marte, na Zona Norte da capital paulista, o Learjet 35 prefixo PT-OVC, da Reali Táxi Aéreo, caiu de bico em cima da casa de número 104 da Rua Bernardino de Sena, no bairro Casa Verde, onde moravam 14 pessoas. Os mortos são o piloto e o co-piloto do avião e seis pessoas da mesma família que estavam na casa. A maioria estava na cozinha preparando o almoço de domingo.

Segundo o chefe do Serviço Regional de Proteção ao Vôo de São Paulo, coronel-aviador Carlos Minelli de Sá, que acompanhou os trabalhos de resgate dos corpos, quando decolou, o piloto Paulo Roberto Montezuma Firmino, de 39 anos, deveria ter virado à esquerda para não interferir na rota dos vôos do Aeroporto de Cumbica, mas fez a curva à direita. Ele pode ter sentido um problema no motor do avião e tentado retornar ao aeroporto.

- Provavelmente ele estava com problemas no avião - admitiu o coronel Carlos Minelli.

A torre de comando do Campo de Marte, segundo o coronel, tentou entrar em contato com o Learjet para informar que a rota estava errada, mas não obteve resposta. Em seguida, o avião caiu de bico sobre as casas. O piloto, que era acompanhado no avião apenas pelo co-piloto Alberto Soares Júnior, de 24 anos, fez a decolagem em condições visuais, sem utilizar os instrumentos. Ainda segundo o coronel Minelli, a chuva fraca que caía no momento da queda não deve ter influído no acidente. O piloto ainda desviou de um prédio antes de cair.

Depois que foram encerrados os trabalhos de busca e resgate na casa atingida, por volta das 18h, o coronel Mário Lopes, porta-voz do Corpo de Bombeiros, disse que os mortos eram o piloto, o co-piloto e seis pessoas que estavam na casa - dois homens, três mulheres e um bebê. Morreram na casa Lina Oliveira Fernandes, de 75 anos; seu filho Aires Fernandes, de 54 anos; a mulher dele, Rosa Lima, de 54 anos; Ana Maria Lima Fernandes, de 21 anos, filha de Aires; seu marido, Lucas Só; e o filho do casal, Luan Vitor de Lima Só, de 9 meses.

"Salva o meu neto", pedia vítima

O Learjet, que ia para o Aeroporto Santos Dumont, no Rio, tinha decolado com mil litros de combustível e havia muito risco na operação de resgate. Por isso, várias casas nas imediações foram interditadas, com 20 desabrigados. Entre bombeiros e soldados da PM foram ao local 22 equipes, com mais de 60 homens. O trânsito das ruas ao redor do local do acidente foi bloqueado.

Airton Michelato, de 47 anos, e seu pai, Ângelo, de 75, correram para o sobrado dos Fernandes ao ouvir o barulho da queda do avião. Junto com Milton Lambert, outro vizinho, conseguiram salvar Cláudia Fernandes, de 16 anos. Eles ouviram o choro da garota, que, segundo os vizinhos, é autista e estava brincando em casa com a amiga Laís Gonçalves da Silva Coutinho, de 11 anos, a outra pessoa retirada dos escombros com vida.

Os vizinhos tentaram ajudar a família, mas já não havia como salvá-los. Grande parte das vítimas estava no porão da casa.

- Salva o meu neto, salva o meu neto - implorava Aires Fernandes, de 54 anos, com o neto Luan no colo.

A imagem e o apelo do amigo de infância desesperaram os vizinhos Milton e Airton, mas eles já não podiam fazer nada.

- Fomos criados juntos. É uma vida inteira nesta rua. Queria saber se acharam as crianças vivas. A gente só pôde salvar uma - contava Airton, descalço na rua, com a blusa suja de sangue e cinzas.

Seu pai, Ângelo, queimou a mão ao salvar Cláudia e não se conformava. Transtornado, foi tratado com calmantes pelos médicos de plantão. Ainda assim, ficava pela rua e, a cada notícia, tentava furar o bloqueio policial para voltar aos escombros.

- Ele é o morador mais antigo daqui. É como se fosse um avô das crianças - dizia Airton.

O governador em exercício de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), e o secretário de Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, estiveram no local. Goldman disse que agora o trabalho é de investigação e que o estado vai prestar apoio para descobrir o que ocorreu.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou ontem, via assessoria de imprensa, que recebeu, no último dia 24, a documentação em que a Reali Taxi Aéreo informa que o Learjet 35A passou pela inspeção anual obrigatória, numa das oficinas homologadas pela agência. O documento foi encaminhado por fax e até ontem a informação não havia sido atualizada no site da Anac na internet.

A Reali Taxi Aéreo divulgou nota afirmando que prestará todo o apoio às vítimas sobreviventes e aos desabrigados em decorrência do acidente. A Reali afirma que arcará com os custos de hospedagem e tratamentos médicos.

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