Título: Da bisavó ao pequeno Lucas, seis enterros
Autor: Franco, Bernardo Mello; Oliveira, Germano
Fonte: O Globo, 06/11/2007, O País, p. 3

Família estava na casa atingida pelo avião; uma das mulheres jamais viajara de aeronave.

SÃO PAULO. Foram enterradas no início da noite as seis pessoas da mesma família atingidas domingo pela queda de um jato da Reali Táxi Aéreo, na Zona Norte de São Paulo. Mais de 130 pessoas estiveram no velório. Muito abalados, parentes tiveram de ser medicados. Quando o caixão do bebê Luan Vítor de Lima Só, de 10 meses, chegou ao Cemitério Chora Menino, primas e tias da criança entraram em desespero. Luan foi enterrado ao lado da mãe, Ana Maria Lima Fernandes, de 20 anos, e do pai, Lucas Só, de 21.

Em seguida foram enterrados no mesmo jazigo os avós maternos do bebê, Rosa Lima e Aires Fernandes, ambos de 54 anos, e sua bisavó, a mãe de Aires, dona Lina Fernandes, de 75 anos. Todos estavam em casa às 14h de domingo, quando o Learjet caiu.

Viúva, dona Lina morava havia décadas no número 104 da Rua Bernardino de Sena, em Casa Verde. A família é humilde. Ao todo, a casa abrigava 14 pessoas. Dona Lina morava com o filho Aires, a nora, Rosa, e as duas filhas do casal: Cláudia, uma menina autista de 16 anos, e Ana Maria, além do marido, Lucas, e o bebê. Quando o jatinho caiu, Claudinha foi arremessada para uma árvore. Ela teve queimaduras em 30% do corpo e está internada. No momento do acidente, ela brincava com uma vizinha, Laís, de 11 anos, que ontem saiu do hospital.

Rosa era o arrimo da família. Aos 54 anos, saía do serviço depois das 19h da noite. A família recebia auxílio da comunidade católica local. No domingo, tinha acabado de voltar do mercado com ingredientes para o almoço. A mãe de Ana Maria e Claudinha era vista por todos como uma guerreira.

¿ A Rosa morreu trabalhando. Era faxineira, trabalhava em duas casas. Mas estava chegando o aniversário do bebê e ela não tinha o que colocar nele. Estava preocupada. Agora, olha aí, é de cortar o coração ¿ disse Vilma, uma vizinha, apontando para o pequeno caixão branco de Luan.

Rosa saiu da Paraíba, assim como duas de suas irmãs, Zefa e Valda, para tentar a vida em São Paulo. Fez a viagem de ônibus. Voltou à Paraíba para ver o pai, de ônibus.

¿ Ela sempre quis viajar de avião. Mas nunca viajou. Nunca ¿ lamentou Valda, de 37 anos.

Claudinha era a preocupação da vida de Rosa. Com 16 anos, a menina está na 5ª série. Precisa de cuidados especiais.

¿ O futuro da Cláudia sempre foi tudo para a minha irmã ¿ contou Valda, que deve requerer a guarda da menina.

O piloto Paulo Roberto Montezuma Firmino, de 39 anos, foi cremado ontem em São José dos Campos. Ele era casado e tinha dois filhos. O co-piloto, Alberto Soares Junior, de 24, morava em São Paulo, mas foi enterrado em Piracicaba, onde mora sua família. A empresa Reali Táxi Aéreo informou que Montezuma tinha uma longa carreira profissional, que incluía aviões de grande porte.