Título: Repressão violenta no Paquistão
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Fonte: O Globo, 06/11/2007, O Mundo, p. 27

Musharraf afirma que manterá eleição e deixará farda, mas dissolve protestos à força.

ISLAMABAD

Sob intensa pressão internacional após decretar estado de emergência no fim de semana, o presidente do Paquistão, o general Pervez Musharraf, anunciou ontem que vai manter as eleições parlamentares e que deixará o comando das Forças Armadas para se tornar um presidente civil. Os sinais, no entanto, são contraditórios. Manifestações de milhares de advogados nas principais cidades do país foram duramente reprimidas e terminaram com mais de 200 presos e pelo menos 50 feridos. Grupos de oposição estimam que o número de detidos desde sábado já chegue a 3.500, embora o governo só admita metade disso.

As críticas são cada vez mais fortes e partem mesmo dos EUA, que consideram o país um aliado importante na luta contra a al-Qaeda e o Talibã. Em seu primeiro pronunciamento sobre o assunto, o presidente George W. Bush pediu ontem que Musharraf suspenda o estado de emergência, realize as eleições e deixe o comando militar.

¿ Esperamos que eleições sejam realizadas o mais rapidamente possível e que o presidente tire a sua farda ¿ disse Bush, na Casa Branca, acrescentando que pediu à secretária de Estado, Condoleezza Rice, que lhe transmita a mensagem.

No fim de semana, o governo havia sugerido que as eleições parlamentares poderiam ser adiadas em um ano. Mas ontem, o premier Shaukat Aziz declarou que ¿as próximas eleições gerais serão mantidas conforme o cronograma¿. O procurador-geral, Malik Abdul Qayyum, foi mais específico.

¿ Foi decidido que não haverá adiamento e por volta de 15 de novembro as assembléias serão dissolvidas e a eleição será realizada dentro dos 60 dias seguintes.

Não está claro quando Musharraf suspenderá o estado de emergência, que justificou ¿devido a uma crise causada pelo aumento da violência extremista e de um judiciário hostil¿. Mas, ontem, ele afirmou que planeja deixar as Forças Armadas.

¿ Estou determinado a executar este terceiro estágio da transição completamente e estou determinado a tirar a farda uma vez que tenhamos corrigido os pilares no Judiciário, no Executivo e no Parlamento ¿ disse sem citar datas à TV estatal, numa forma também de afastar rumores de que teria sido posto sob prisão domiciliar por outros militares.

Musharraf assumiu o poder num golpe de Estado em 1999 e críticos dizem que, com a medida, ele quis evitar uma decisão da Suprema Corte, que julgava a constitucionalidade de sua eleição.

Benazir critica `lei marcial¿

Milhares de advogados saíram ontem em passeatas contra o estado de emergência, mas as manifestações foram dissolvidas com gás lacrimogêneo e cacetetes. Pelo menos 150 pessoas foram presas em Lahore após confronto com policiais. Alguns foram vistos com a cabeça sangrando ao serem presos. A cena se repetiu em Karachi. Em Islamabad, centenas de advogados gritavam ¿Fora, Musharraf¿ até serem dispersados pela polícia. Vários juízes continuam em prisão domiciliar por não apoiarem o estado de emergência.

¿ Não estamos amedrontados ¿ gritou Abgul Hafeez, um advogado de Karachi, ao ser levado pela polícia.

A polícia cercou ontem o principal grupo de comunicação do país e impediu a circulação de seu jornal, ¿Awam¿. A transmissão de noticiários independentes na TV foi bloqueada. A ex-premier Benazir Bhutto disse que pretende viajar a Islamabad para se reunir com Musharraf, e que ¿a lei marcial¿ sabotou o processo de diálogo que haviam iniciado.

¿ Isso não é um ato de exceção. É uma lei marcial ¿ afirmou.

O Paquistão está também sob pressão econômica. A Holanda se tornou o primeiro país a suspender ajuda e os EUA adiaram as negociações sobre defesa.

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