Título: Armadas, mas para obter verbas
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 11/11/2007, O País, p. 3

Forças do Brasil estão desaparelhadas, com equipamentos obsoletos e fora de operação.

Legenda da foto: MANUTENÇÃO DE PORTA-AVIÕES no píer da Praça Mauá, no Rio: a Marinha tem cinco submarinos precisando de reforma, uma esquadra desgastada e obsoleta, além de navios em número insuficiente

Alvos de constantes cortes orçamentários, com armamentos obsoletos e ultrapassados tecnologicamente, as Forças Armadas estão mobilizando seus comandantes para buscar no Congresso apoio aos pedidos de verbas para seus programas de reaparelhamento. Documentos entregues aos deputados revelam que o poderio bélico das Forças Armadas do país estaria em desvantagem em relação aos vizinhos. Os documentos não citam as recentes compras de armamentos feitas pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Mas o exemplo dele é usado no lobby por mais verbas.

No Exército, a situação é delicada: 78% dos blindados em operação têm mais de 34 anos, ou seja, são anteriores à era da informática. Dos 131 blindados Leopard, 70% estão fora de operação. Mais da metade das viaturas tem duas décadas. A maioria das peças de artilharia é oriunda da Segunda Guerra Mundial e o armamento individual (o fuzil FAL) também é antigo.

Em relatório remetido ao Congresso, o Exército compara os gastos com defesa do Brasil com sete principais países vizinhos. Segundo o documento, o Brasil gasta menos do que 2% do seu Produto Interno Bruto (PIB). Na Venezuela, esse percentual está perto dos 6%. No Chile, é de pouco mais de 3%. "É imprudente imaginar que um país com o potencial do Brasil não enfrente disputas ou antagonismos ao buscar alcançar seus legítimos interesses", alega o Exército, no documento entregue aos parlamentares. O Executivo já enviou ao Congresso proposta de orçamento substancial para as Forças Armadas, mas a aplicação dos R$9,3 bilhões não está garantida.

Marinha está em pior situação

Os relatórios apontam que a Marinha é a que está em pior situação: desde 1999, foram desativados 22 navios e seis aeronaves, tendo sido incorporados apenas dez navios. Até 2010, mais 17 navios serão desativados (20% dos navios da Força) e, em 2025, 87% das atuais embarcações da Marinha estarão fora de operação. Como perspectiva de incorporação de novos, há apenas uma corveta em construção no Arsenal da Força, no Rio.

- Isso quer dizer que, se nada for feito, vamos dando baixa em maior número de navios do que vamos incorporando, e cada vez mais teremos menos navios e menos meios - diz o comandante da Marinha, almirante Julio Soares de Moura Neto.

A Força dispõe de cinco submarinos - uma de suas prioridades -, que precisam passar por reforma e ser armados com a compra de torpedos. Além de dispor de uma esquadra desgastada e obsoleta, o que torna a operação perigosa e a manutenção onerosa, os navios são em número insuficiente para que a Marinha possa patrulhar adequadamente os 4,5 milhões de quilômetros quadrados da costa brasileira. A avaliação é do comandante Moura Neto.

Para o comandante, o Brasil tem que equipar as Forças Armadas, de modo que os países pensem duas vezes antes de interferir nos interesses brasileiros.

- Temos que ter Forças Armadas perfeitamente armadas e equipadas.

"Das três Forças Armadas, a Marinha é a que se encontra em situação mais crítica quanto à obsolescência de seus meios e necessidade de investimentos no reaparelhamento, tendo sido preterida nas decisões de investimentos nos últimos anos", concluiu um grupo de trabalho interministerial, que em 2005 estudou as prioridades de cada Força. A conclusão do estudo foi anexada ao relatório da Marinha enviado aos deputados.

Em depoimento fechado na Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, contou que, das 719 aeronaves da Força Aérea, apenas 267 têm condições de voar, ou seja, 63% estão paradas e a quantidade em operação, que corresponde a 37%, está bem abaixo da meta de disponibilidade, que é de 60%. Segundo a Força, 80% da frota têm mais de 15 anos de uso, o que eleva os custos com manutenção e dificulta a reposição de peças.

Mais receitas, mesmas verbas

No documento entregue à comissão, a FAB informou também que, diante das dificuldades orçamentárias, a Força não está conseguindo cumprir as horas de vôo para tornar a Força operacional. São necessárias 180 mil horas por ano para garantir treinamento dos pilotos e manutenção adequada da frota.

Segundo a FAB, apenas cinco projetos de reaparelhamento da Força estão andando dentro do esperado e mesmo assim se referem a aeronaves recém- incorporadas ao acervo e, portanto, dentro do prazo de garantia por parte de fabricantes. "O não atendimento das reais necessidades impacta nas metas a serem alcançadas, levando a Força Aérea a permanecer no atual estado de obsolescência de seus equipamentos e precário emprego operacional como força de defesa", diz o relatório da Aeronáutica.

No documento, a FAB alega que o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) poderia receber mais verbas porque as receitas no setor cresceram muito. Até abril deste ano, foram repassados ao órgão R$549,8 milhões e a previsão para 2008 é de R$584 milhões. A FAB diz que houve excedente de arrecadação de R$364 milhões no setor aéreo. Em plena crise no setor, controladores de vôo denunciaram as condições dos radares, que segundo eles, apresentavam falhas constantes.

Se nada for feito, nós vamos dando baixa em maior número de navios do que vamos incorporando e cada vez mais vamos ter menos navios e menos meios

Júlio Soares de Moura Neto, comandante da Marinha