Título: A nova jovem face da oposição
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Fonte: O Globo, 11/11/2007, O Mundo, p. 45
Manifestações de estudantes contra Chávez são nova peça na crise.
BUENOS AIRES. Sem partidos políticos fortes, capazes de organizar e comandar a oposição ao projeto de reforma constitucional elaborado pelo presidente Hugo Chávez, as universidades se transformaram em campos de batalha, onde chavistas e antichavistas protagonizam uma nova queda-de-braço, a menos de um mês do referendo que deverá decidir o rumo do país. Nos últimos dias, as marchas de estudantes universitários se espalharam por vários estados venezuelanos e, em alguns casos, terminaram manchadas de sangue. Quarta-feira passada, a sede da Escola de Trabalho Social da Universidade Central da Venezuela (UCV), uma das mais importantes do país, foi atacada por motoqueiros que dispararam contra um grupo de estudantes que havia participado de um protesto em repúdio ao projeto de reforma chavista.
Como ocorreu no Chile em junho do ano passado, quando estudantes saíram às ruas para exigir da presidente Michelle Bachelet uma educação pública de qualidade, obrigando o governo a assumir o compromisso de reformar a Lei Orgânica Constitucional de Ensino, aprovada pelo Congresso no último dia de governo do ex-ditador Augusto Pinochet (1973-1990), os estudantes venezuelanos passaram a representar uma das principais ameaças à estabilidade política do país.
¿ Pode ser que Chávez consiga aprovar o referendo, mas o custo político será muito alto. Será uma reforma impopular e com baixíssima legitimidade ¿ afirmou ao GLOBO o professor das universidades Católica e Metropolitana, Victor Maldonado, por telefone, de Caracas.
Os problemas de Chávez não terminam no movimento estudantil. As recentes declarações do ex-ministro da Defesa Raúl Baduel, até pouco tempo amigo íntimo do presidente, revelaram a existência de fissuras no movimento chavista, até mesmo dentro das Forças Armadas. Baduel, artífice do retorno do presidente ao poder após o golpe de abril de 2002, acha que o projeto de reforma constitucional representa um golpe de Estado. ¿Baduel expressa a existência de tensões dentro do movimento chavista¿, disse o economista e diretor do jornal ¿Tal Cual¿ Teodoro Petkoff, em entrevista à Unión Rádio. Para o jornalista, ¿Baduel passou a ser uma forte referência para os setores que querem derrotar o movimento chavista de forma democrática¿.
Na mesma semana, Chávez enfrentou as declarações de Baduel e os incidentes na UCV. Até agora, os estudantes não haviam sido um fator de peso na disputa entre Chávez e a oposição, mas a história começou a mudar. Com a Igreja, uma das principais instituições opositoras do governo, e figuras isoladas como Baduel, os estudantes viraram protagonistas da crise.
¿ Os estudantes estão na vanguarda da oposição ao projeto de reforma chavista ¿ disse Maldonado. Os partidos políticos não estão por trás das marchas estudantis.
Fissuras também nas universidades
A Venezuela é um país absolutamente dividido e as universidades não vivem alheias a essa realidade. Nas salas de aula do país, alunos chavistas e antichavistas tentam conviver, num ambiente cada vez mais hostil.
¿ Os que estão protestando são estudantes de direita, que atuam a serviço da oposição. Em mais de 80% das universidades venezuelanas o apoio à reforma é total ¿ afirmou o estudante de Direito da UCV e secretário de Reivindicações da Federação de Centros Estudantis, Héctor Rodríguez.
Com termos que lembram os enérgicos e violentos discursos de Chávez, o estudante venezuelano afirmou que ¿a violência parte dos estudantes de direita, eles querem queimar gente nas manifestações e provocar um clima de caos no país¿:
¿ Os partidos opositores estão usando os estudantes. Não podemos esquecer que, no caso da UCV, nos últimos anos entraram muitos integrantes das classes altas.
Segundo o estudante chavista, ¿os meios de comunicação super dimensionaram os incidentes de quarta-feira. Contamos com o apoio dos trabalhadores, dos camponeses, mas, claro, isso não aparece nos canais de TV controlados pela oposição¿.
No pólo oposto, estudantes antichavistas dizem atuar espontaneamente, em defesa da democracia.
¿ Estamos lutando pela sobrevivência do regime democrático. Não temos nada a ver com os partidos opositores, o problema é que o governo não consegue entender que existem pessoas que pensam e se opõem a Chávez ¿ disse Freddy Guevara, do centro de estudantes de Comunicação Social da Universidade Católica Andrés Bello.
Guevara assegurou que, nos choques da semana passada, ¿os disparos partiram de estudantes e não estudantes vinculados ao governo¿. Já Rodríguez argumentou que ¿nosso setor estava dentro do prédio e teve de disparar para o alto porque foi a única maneira que encontrarmos de sair de lá sem sermos queimados vivos.