Título: Sarkozy impõe novo estilo presidencial na França
Autor: Berlinck, deborah
Fonte: O Globo, 11/11/2007, O Mundo, p. 47
Político tem alta popularidade, mas já enfrenta resistência dos setores mais atingidos por suas reformas, ainda incipientes
PARIS. Um fotógrafo francês que acompanhou Nicolas Sarkozy na sua viagem aos Estados Unidos disse que isso nunca tinha acontecido na sua carreira:
¿ Não consegui transmitir todas as minhas fotos, por falta de tempo! O homem não pára. É impressionante. Com Chirac, tínhamos tempo de sobra, porque nas viagens ele sempre fazia uma sesta depois do almoço. E com Mitterrand, então, tínhamos todo tempo do mundo ¿ contou.
Nicolas Sarkozy é onipresente: está por todo lado, não pára, não se cansa. Depois do socialista Mitterrand, que terminou o mandato debilitado fisicamente por causa de um câncer, e de Jacques Chirac, que não dispensava sestas, Sarkozy completou seis meses no comando da França esta semana correndo.
Inclusive, literalmente: ele é um adepto do jogging matinal, e costuma fazer o primeiro-ministro François Fillon e, ocasionalmente, o seu ministro das Relações Exteriores, Bernard Kouchner, suarem a camisa. Os dois o acompanham nas corridas, sem ultrapassar o presidente, claro.
Cargo de premier fica diminuído com Sarkozy
O governo, portanto, está em forma. Mas acabou o estado de graça. A popularidade do presidente, que bateu quase 70% pouco depois de sua eleição, estabilizou-se agora nos 55% ¿ uma margem ainda bem confortável.
Sob o slogan da ¿ruptura¿, Sarkozy prometeu transformar a França num canteiro de obras. E lançou-se em vários campos. Mas sindicatos e todos os que têm a perder ¿ funcionários públicos, sobretudo ¿ anunciam um campo de batalha. Depois do 18 de outubro ¿ uma greve histórica que quase paralisou o país ¿ o caminho do presidente se anuncia difícil: uma nova onda de greves está sendo planejada em protesto contra a reforma dos regimes especiais de previdência, que privilegia algumas categorias cujo trabalho é considerado mais árduo ¿ como os transportes ¿ com aposentadoria antecipada.
¿ A chantagem de rua não vai funcionar ¿ anunciou Sarkozy.
O presidente está por todo lado. Crise no Chade depois que a organização não-governamental Arca de Zoé quis trazer para a França mais de cem crianças africanas, na marra, e lá se foi Sarkozy com seu avião presidencial buscar comissários de bordo e os jornalistas presos quando acompanhavam o caso. Uma criança foi morta por um cachorro? Lá se foi o presidente francês conversar com os pais.
Sarkozy está reinventando a função de presidente e dá a impressão de querer controlar tudo ¿ interna e externamente. O que, para muitos, deixou o seu primeiro-ministro com a função de um simples ¿colaborador¿. Um locutor de rádio anunciava na sexta-feira, em tom irônico, que o posto de primeiro-ministro da França havia sido abolido. Na internet, na imprensa, nas brincadeiras de bar proliferam expressões do tipo ¿Supersarko¿, ¿Sarkozorro¿, ¿Hiperpresidente¿ ou ¿Sarkoshow¿.
Classe média começa a cobrar coerência
Mas como explica Stéphane Rozès, do Instituto CSA, a classe média, mais do que os pobres, começa a cobrar coerência na ação do governo.
¿ Vai chegar um momento, ainda não chegamos, em que os franceses vão cobrar a eficácia de sua ação e a justiça das medidas ¿ previu.
Por enquanto, Sarkozy continua forte pela sua atividade: há muitos anos os franceses não viam tanta ação na Presidência. O seu partido ¿ UMP ¿ parece unido, mas já há sinais de impaciência:
¿ A estratégia é forte, clara e o ritmo é bom. Mas algumas reformas estão sendo feitas pela metade ¿ disse o deputado Hervé Mariton.
Para Dominique Reynié, analista político, o ritmo do governo é lento, na realidade. Os seis meses serviram de ¿choque psicológico¿, mas os resultados ainda não apareceram.