Título: Entre os grandes exportadores
Autor: Rodrigues, Luciana; França, Mirelle de
Fonte: O Globo, 09/11/2007, Economia, p. 23

Petrobras anuncia descoberta que pode multiplicar por cinco as reservas do país.

Ogoverno anunciou ontem uma descoberta que poderá alçar o Brasil ao seleto grupo dos dez maiores produtores de petróleo e gás do mundo. Testes realizados pela Petrobras na área de Tupi, em um bloco de exploração na Bacia de Santos, indicaram que uma camada de rochas conhecida como pré-sal tem enorme potencial para produzir óleo e gás de excelente qualidade. Só a área de Tupi tem entre 5 e 8 bilhões de barris de petróleo e gás - o bastante para elevar em mais de 50% as atuais reservas do país, hoje em 14,4 bilhões. Nas estimativas da Petrobras, toda a camada de pré-sal, com 800 quilômetros de extensão e que vai do Espírito Santo a Santa Catarina, poderia fazer o Brasil superar a marca de 70 bilhões de barris em reservas, quase cinco vezes o nível atual.

- Deixaremos de ser um país que se esforçou a duras penas para alcançar a auto-suficiência para nos tornarmos exportadores - comemorou a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. - Estaremos em patamares em que estão os países árabes, a Venezuela, e outros - acrescentou.

Com o anúncio, as ações da Petrobras subiram mais de 14% ontem. A divulgação da descoberta ocorreu no momento em que a cotação do petróleo bate seguidos recordes e em meio a uma crise no abastecimento de gás do país. A Petrobras informou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva os resultados dos testes em Tupi no dia 5 de novembro. Lula acionou o Ministério de Minas e Energia que, então, convocou uma reunião extraordinária do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), realizada ontem. Devido à descoberta, o CNPE decidiu retirar 41 blocos, que estão nos reservatórios do pré-sal, da próxima rodada de licitações da Agência Nacional do Petróleo (ANP), marcada para os dias 27 e 28 deste mês.

Tecnologia de exploração é cara

Os reservatórios de pré-sal são assim chamados porque estão em rochas abaixo de uma extensa camada de sal em alto-mar. Os testes da Petrobras obtiveram óleo leve (28 graus API, medida internacional de qualidade e que, quanto maior, melhor), de alto valor comercial, e uma grande quantidade de gás. Hoje, o Brasil produz basicamente petróleo pesado (entre 13 e 15 graus API), e importa óleo leve e gás. Mas a província descoberta está em águas ultra-profundas (entre 5 mil e 7 mil metros de profundidade) e os poços ficam muito distantes da costa, a até 250 quilômetros.

- Foi a primeira vez que chegamos a essa profundidade, e a tecnologia é cara. E ainda temos que estudar como usar o gás, porque não dá para fazer um gasoduto de 250 quilômetros. As alternativas são geração de energia flutuante ou liquefação. Os custos são elevados, mas a qualidade do óleo dá robustez e viabilidade a esse investimento - disse Guilherme Estrella, diretor de Exploração e Produção da Petrobras.

Segundo Estrella, a comercialização de petróleo e gás dos reservatórios do pré-sal deve ter início em 2009, em um campo na Bacia do Espírito Santo, pois ali já há uma plataforma instalada nas proximidades. A empresa vai implantar também um piloto de produção para extrair cem mil barris por dia de petróleo leve e gás.

Na área de Tupi, que fica na Bacia de Santos, a Petrobras atua como operadora, com 65% do negócio - a britânica British Gas (BG) tem 25% e a portuguesa Petrogal, 10%. O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, afirmou que, provavelmente, será necessário ampliar o plano de investimentos da empresa, que hoje prevê US$112,4 bilhões até 2012.

Segundo o diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, com a exploração das reservas abaixo da camada de sal, o Brasil poderá reduzir significativamente ou até mesmo suspender, no futuro, suas importações de petróleo leve. Hoje, o país compra do exterior cerca de 300 mil barris por dia de petróleo leve para a produção de diesel, já que só dispõe praticamente de óleo pesado.

Pesquisa custou US$1 bilhão

Em julho do ano passado, a Petrobras já havia anunciado a descoberta de petróleo em uma nova camada do subsolo marinho na Bacia de Santos, que representava "um marco histórico" na atividade exploratória e de produção no país. Mas a estatal se mostrou bastante cautelosa e ressaltou que eram necessários novos investimentos e a continuação da perfuração do poço para avaliar o volume e a produtividade das jazidas.

Para pesquisar os reservatórios abaixo da camada de sal, a Petrobras perfurou 15 poços desde 2005, dos quais oito foram testados, num investimento de US$1 bilhão. Mais de dois quilômetros de sal foram atravessados para chegar às reservas. No primeiro poço, a empresa levou um ano na perfuração e gastou US$240 milhões. Hoje, um poço equivalente é perfurado em 60 dias, com US$60 milhões. Gabrielli explicou que ainda não há estimativas sobre qual será o custo para explorar toda a área de petróleo e gás na camada pré-sal.

- Modificamos o paradigma geológico do país. É uma descoberta que terá importância para todas as gerações do Brasil, para o seu desenvolvimento - disse Dilma.

- É uma nova província de exploração, muito significativa - fez coro Gabrielli.

A ministra e o presidente da Petrobras evitaram relacionar a descoberta com a atual crise no abastecimento de gás. Dilma disse ainda que as novas reservas potenciais de petróleo e gás do país não farão o governo mudar sua estratégia nas negociações com a Bolívia.

- Nós fomos até a Bolívia esta semana e já sabíamos (da descoberta da Petrobras). Vamos investir na Bolívia porque achamos importante do ponto de vista de integração regional.