Título: Acadêmicos acusam Chávez por violência
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 09/11/2007, O Mundo, p. 32

Governo, professores e opositores trocam acusações sobre batalha campal que feriu 9 em campus. Estudantes voltam às ruas.

Estudantes das principais universidades de Caracas participaram ontem de protestos em repúdio ao ataque à sede da Escola de Trabalho Social da Universidade Central da Venezuela (UCV), que deixou ao menos nove feridos anteontem. As imagens de motoqueiros entrando na universidade e disparando contra opositores, que haviam participado de uma marcha contra a reforma constitucional, foram exibidas na TV, provocando um clima de forte preocupação. Autoridades acadêmicas acusaram o governo de Hugo Chávez de ser o responsável pela agressão aos estudantes. O vice-reitor da UCV, Eleazar Narváez, alertou para o perigo de uma intervenção na universidade e pediu ao governo que deixe de promover a violência e a divisão. Já o presidente da Associação de Professores da UCV, Victor Márquez, acusou Chávez de ser o autor intelectual da invasão à sede da UCV e de usar grupos paramilitares em sua disputa com a oposição. Alheio às críticas, o presidente pediu à oposição que aceite o resultado do referendo do dia 2 de dezembro.

- Depois não apareçam dizendo que houve fraude - disse Chávez, que ontem liderou uma marcha a favor da reforma, com milhares de pessoas, em Charallave, no estado de Miranda.

Vice-reitor descarta policiais em universidade

Nas universidades, a tensão é cada vez maior.

- Não temos as armas de fogo, temos as armas das idéias, temos o pensamento, a palavra, o recurso do diálogo para resolver nossos problemas - afirmou o vice-reitor da UCV.

Narváez assegurou que não será permitida "a presença de policiais em nossa Cidade Universitária". Segundo o vice-reitor, "lamentavelmente nosso presidente e vários porta-vozes continuam insistindo no uso de uma linguagem maniqueísta para promover o ódio e o confronto".

- Vamos responder com prudência, mas com muita firmeza, para defender a autonomia universitária que está em jogo - disse Narváez.

O governo responsabilizou os estudantes opositores pela violência na UCV. Mas alunos da universidade asseguraram ter provas de que foram vítimas e não autores do ataque. Segundo Ricardo Sánchez, vice-secretário do grêmio estudantil da UCV, serão entregues À Justiça 14 vídeos e 126 fotos, tiradas na maioria com celulares, que mostram de onde partiu a violência.

- Todos sabemos de que lado estão as armas - afirmou Sánchez.

Segundo ele, somente esta semana 120 estudantes foram feridos e mais de 85 pessoas foram detidas, em protestos contra a reforma.

Estudantes pedem renúncia de ministro

Ontem, estudantes da UCV, da Universidade Metropolitana e da Monteávila realizaram marchas em suas sedes de repúdio à violência da véspera. Os manifestantes da UCV pediram ao Conselho Universitário um pronunciamento sobre os incidentes. Outras manifestações foram realizadas na capital e também nas cidades de Mérida, Maracaibo, Puerto La Cruz, San Cristóbal e Barquisimeto. Alguns setores do movimento estudantil pediram a renúncia do ministro do Poder Popular para o Interior e Justiça, Pedro Carreño, que acusou os estudantes pelo ataque.

A menos de um mês do referendo sobre a reforma, os protestos organizados por estudantes deram novos contornos à disputa entre Chávez e a oposição. Após a vitória do presidente no referendo de agosto de 2004, que permitiu sua permanência no poder, os partidos opositores mergulharam numa crise ainda não superada. Com este pano de fundo, o movimento estudantil passou a ocupar o vazio deixado pelas lideranças da oposição que, em sua maioria, passaram a integrar o chamado Comando Nacional da Resistência. Nele estão, por exemplo, ex-membros de partidos tradicionais como o Ação Democrática. O comando defende a abstenção no referendo sobre a reforma, postura questionada por outros opositores, como o ex-ministro da Defesa Raúl Baduel. Em recentes declarações, Baduel, pediu aos venezuelanos que participem do debate sobre a reforma e exerçam seu direito ao voto. Com uma oposição fragmentada e, em muitos casos, desnorteada, o presidente avança.

- A falta de um rumo claro entre os opositores favorece o presidente - disse a jornalista Gloria Bastidas, articulista do "El Nacional".

Segundo ela, "o que está em jogo é uma real disputa entre democracia e ditadura".

- Agora é pra valer. Chávez vai tentar ampliar sua revolução e seu poder hegemônico. O povo deve entender que estão em jogo a democracia, as liberdades individuais - disse Bastidas.

Um dos cinco diretores do Conselho Nacional Eleitoral, Vicente Díaz, pediu ao Supremo Tribunal de Justiça que esclareça se a reforma é o procedimento adequado para aprovar as mudanças propostas por Chávez. Díaz defende uma Assembléia Constituinte.

A presidente da Assembléia Nacional, deputada Cília Flores, disse que a oposição "pretende fazer o mesmo de 11 de abril de 2002, mas agora temos um povo e um governo mais fortes":

- Estão esquentando o ambiente, porque têm o mesmo plano de abril de 2002, estão montando um golpe de Estado e pretendem gerar angústia e terror na população.

Flores disse que pedirá ao Poder Eleitoral que revise a propaganda do "não" no referendo pois ela estaria baseada em "mentiras".