Título: Especialistas criticam CPMF mas elogiam redução
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 14/11/2007, O País, p. 8
BARGANHA NO CONGRESSO: "Se o governo não reduzir gastos, a sociedade vai ter que arcar com essa carga tributária"
Já empresários recebem com ressalva a proposta do governo de baixar alíquota em 0,02 ponto de 2008 a 2011
SÃO PAULO. A decisão do governo de propor a redução da alíquota da CPMF de 0,38% para 0,36% em 2008, chegando a 0,30% em 2011, é tida como um avanço por especialistas ouvidos pelo GLOBO. Todos, no entanto, são contrários à cobrança do tributo.
O tributarista Ives Gandra da Silva Martins lembrou que o imposto foi criado em 1993 - como IPMF e alíquota de 0,25% sobre as movimentações financeiras - e transformou-se "no pior imposto do mundo" quando atingiu o patamar de 0,38%.
- A CPMF é um imposto negativo, que incide sobre a circulação do dinheiro e encarece a nossa moeda. Essa redução não é a ideal, mas já pode ser considerada um avanço - disse Gandra, que atualmente é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomércio, entidade paulista que, juntamente com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), tem levantado a bandeira contra a cobrança da CPMF.
"Não há razão para manter a CPMF", diz Paulo Skaf
O presidente da Federação da Fiesp, Paulo Skaf, disse ontem que a redução de 0,02% na alíquota da CPMF, como propôs o governo, é insignificante e não vai contribuir para desonerar a atual carga tributária do país. Segundo ele, o governo deveria respeitar a Constituição Federal, que prevê o fim da cobrança do tributo em 31 de dezembro deste ano, já que o momento atual, afirma, coincide com o aumento expressivo da arrecadação do país.
- O governo vai arrecadar R$60 bilhões a mais do que era previsto para este ano. São quase duas CPMFs. E, para 2008, a previsão é de que o país arrecade mais de 13% a 14%. Não há razão para manter a CPMF - afirma o presidente da Fiesp.
O empresário lembrou que, desde que foi criado o tributo, o governo arrecadou cerca de R$250 bilhões.
- A CPMF foi criada equivocadamente. Está certo que a sociedade foi tolerante, mas era para durar apenas três anos. E o que aconteceu foi que, de três anos já chegamos a 11 anos, e o que era 0,20% já chegou a 0,38%. Assim como o imposto, a tolerância também era provisória - disse, lembrando que o país arrecadou em 2007 cerca de R$540 bilhões em impostos:
- É dinheiro suficiente para atender a área da saúde, os programas sociais e os investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O fim da CPMF é a única chance de abrir a porta da reforma tributária, e assim reduzir a carga tributária. Se não eliminar, não teremos desoneração concreta.
Paulo Skaf chegou a entregar no Senado um abaixo-assinado com 1,3 milhão de assinaturas contra a prorrogação da cobrança do tributo, e implantou um telão na Avenida Paulista com o nome de parlamentares que aprovaram a prorrogação da CPMF na Câmara, prometendo dar nomes dos senadores que fizerem o mesmo no Senado, "para que a população se lembre deles nas próximas eleições".
Mailson da Nóbrega: sem imposto, "herança ainda pior"
Já o Mailson da Nóbrega, ministro da Fazenda no governo José Sarney, avaliou que o governo não tinha outra alternativa senão reduzir a alíquota da contribuição provisória. Dizendo-se contrário ao "distorsivo, regressivo e perverso" imposto, o economista considera, porém, que, sem o tributo, o governo federal deixaria uma "herança ainda pior" para o próximo governante.
- Sou contra essa perversidade (a cobrança da CPMF), mas (sem o imposto), o presidente Lula deixaria um superávit primário menor e um aumento na relação entre a dívida pública e o PIB (Produto interno Bruto) - disse Maílson da Nóbrega, que é consultor de empresas.
Empresário: diminuição inócua sem redução de gastos
Para Roberto Faldini, dirigente da Fiesp, entidade também contrária à CPMF, o governo cedeu à pressão da sociedade, mas o tributo, na sua opinião, deveria ser eliminado de vez. Ou, em último caso, o governo deveria estabelecer uma alíquota simbólica, apenas para efeito controlador.
O empresário analisa, ainda, que sem redução nos gastos públicos de nada adiantará a diminuição da CPMF. Para ele, os altos gastos do governo acabam incidindo também nas contas da população.
- Se o governo não reduzir seus gastos, a sociedade vai ter que arcar com essa carga tributária. A redução na alíquota da CPMF é um avanço, mas é só o começo para ajudar a aquecer o mercado interno - disse Faldini, emendando: - A minha visão sobre a realidade econômica é que estamos aparentemente num mar de rosas, com a economia indo bem, o mercado absorvendo nossos commodities e o Brasil com superávit. Mas a parte interna está longe do que queremos. A carga tributária está quase insuportável.