Título: Aborto: Igreja derrota proposta do governo
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 19/11/2007, O País, p. 5

Católicos pressionam delegados de conferência de saúde, e projeto de descriminalização da prática é rejeitado

BRASÍLIA. No embate sobre a legalização do aborto no Brasil, prevaleceu a pressão de setores da Igreja Católica. A proposta de descriminalização do aborto foi rejeitada ontem por 70% dos votos dos cerca de 2,7 mil delegados da 13ª Conferência Nacional de Saúde. Foi uma derrota do Ministério da Saúde, que defende a aprovação de um projeto de lei que acaba com a criminalização da mulher que se submeter a um aborto. Mais organizados, os católicos ocuparam os lugares estratégicos à frente da mesa de trabalhos.

A proposta rejeitada dizia o seguinte: "Assegurar os direitos sexuais e reprodutivos, respeitar a autonomia das mulheres sobre seu corpo, e a questão do aborto, reconhecendo-o como problema de saúde pública e discutir sua descriminalização por meio de projeto de lei".

Para Clóvis Boufleur, diretor de Relações Institucionais da Pastoral da Criança, a decisão da conferência foi uma vitória da sociedade, que, segundo ele, é contra a descriminalização. Boufleur disse que os religiosos mobilizaram cerca de 400 pessoas para atuar no convencimento dos delegados.

Proposta do governo fora aprovada em sete plenárias

A proposta defendida pelo governo havia sido aprovada em sete das dez plenárias na quinta-feira, mas esse resultado não se confirmou no plenário.

- Havia um esforço para banalizar a vida, com divulgação exagerada de dados incorretos. A legalização do aborto não resolveria o problema da saúde da mulher. O que precisa é o governo melhorar a oferta de informações sobre a concepção e não ficar correndo atrás do prejuízo - disse Boufleur.

Indignado com o resultado da conferência, o diretor do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas do Ministério da Saúde, Adson França, que representou o ministro José Gomes Temporão no evento, disse que a Igreja Católica montou uma "verdadeira claque". Antes de votar o mérito da proposta, os religiosos sequer permitiram a discussão.

- Foi um absurdo não permitirem a discussão de um assunto tão polêmico como esse. Na visão do ministério, o aborto é um problema grave de saúde pública. É a segunda causa de internação obstétrica no SUS. As vítimas do aborto mal feito são as mulheres negras e pobres, que não têm condições de pagar por clínicas que fazem abortos. Não permitir que sejam atendidas devidamente é uma hipocrisia. É uma crueldade - disse Adson França.