Título: Renan pega carona na CPMF
Autor: Vasconcelos, Adriana; Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 15/11/2007, O País, p. 3

Conselho aprova cassação de senador, que tentará escapar no plenário antes da votação do imposto.

Com a aprovação por 11 votos a três ontem, no Conselho de Ética, do relatório do senador Jefferson Peres (PDT-AM) recomendando sua cassação por quebra de decoro, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) se prepara para enfrentar, na próxima quinta-feira, o segundo julgamento em plenário. Confiante de que os colegas o absolverão novamente, protegidos pelo voto secreto, a despeito do fato de que desta vez a sessão será aberta, Renan procurou o presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), ontem de manhã, para se assegurar de que esta segunda representação será submetida a voto antes da apreciação da emenda que prorroga a CPMF. Sua estratégia é garantir a absolvição antes que o governo conquiste a prorrogação da CPMF.

Renan já teria fechado um acordo informal com o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia: o governo o ajudaria a salvar o mandato, e ele, em troca, não criaria problemas na votação da CPMF. Renan pode não acrescentar votos a favor da CPMF, mas pode tirar alguns.

- Fiz a minha parte, espero agora que o Senado faça a sua. Caso contrário, será pior para a instituição - disse Peres, logo após a aprovação de seu parecer, que enumerou pelo menos oito indícios que comprovariam a denúncia feita pelo empresário João Lyra, de que Renan teria usado laranjas na compra de uma rádio e um jornal em Alagoas.

Com uma estratégia bem diferente da adotada no primeiro julgamento, Renan, desta vez, preferiu não despender energia na sessão do Conselho de Ética, onde apenas três senadores do PMDB votaram contra o parecer de Peres: o líder da bancada, Valdir Raupp (RO), Wellington Salgado (MG) e Almeida Lima (SE). Eles abriram mão do pedido de vista, recurso regimental para atrasar a votação.

- Está tudo errado. Para não ser chamado de racista, eu diria que este é o samba do branco doido. Mas não vou pedir vista e já me sinto derrotado no Conselho de Ética, já que 33% dos votos (do PSDB e Democratas, partidos que apresentaram a denúncia contra Renan) são favoráveis à cassação - limitou-se a protestar Salgado.

- Querem banir o senador Renan Calheiros da vida pública pelos próximos cinco anos sem apresentar uma única prova - disse Almeida Lima.

PT deve mudar voto no plenário

O relatório de Peres será transformado em projeto de resolução, e na próxima quarta-feira será submetido à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), para que possa ser votado em plenário no dia seguinte.

- O julgamento do senador Renan será dia 22, em sessão aberta, mas com votação secreta - confirmou Tião Viana, à noite.

Ontem, Renan não pôde contar com o apoio do PT. Os três representantes do partido no Conselho - Eduardo Suplicy (SP), Augusto Botelho (AM) e João Pedro (AM) - acompanharam o relator. Mas, nos bastidores, a informação é de que no plenário o PT votará unido contra sua condenação, a pedido do presidente Lula.

Na última segunda-feira, Renan esteve no Planalto para longa conversa com Mares Guia. Para o governo, o ideal seria que o julgamento só acontecesse após a votação da CPMF, mas o Planalto resolveu ceder às pressões do PMDB. Por esse acordo, Renan, absolvido, renovaria a licença da presidência do Senado, que vence dia 26 de novembro, e só renunciaria definitivamente ao cargo depois de garantida a prorrogação da CPMF - a avaliação do governo é que o processo de sucessão seria fatal para as negociações.

Embora Renan não tenha condições de conseguir mais votos para a CPMF, ele pode atrapalhar, e muito, a votação da matéria.

- O governo tem a consciência de que o PMDB e Renan precisam dele para a absolvição. Mas o governo também precisa do PMDB e de Renan para aprovar a CPMF - advertiu ontem o líder do PMDB, Valdir Raupp (RO).

A oposição admite a existência de um acordo e que a tática de Renan é escapar antes da solução da CPMF.

- Renan não é bobo. Ele vai querer se livrar dos processos antes da CPMF. Sabe que pode ser abandonado pelo governo depois - observou o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

Na véspera, o presidente do PSDB, Tasso Jereissati (CE), havia dito que não há mais clima para cassação de Renan. O líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), nega acordo e diz que o governo não vai misturar as negociações da CPMF com o julgamento:

- Não vamos misturar as coisas. Não há regra para isso. Vamos usar o bom senso. O melhor para Renan é ser absolvido. E ao mesmo tempo, temos que tomar cuidado com a CPMF, pois qualquer interferência pode ser um elemento de perturbação.

Antes da aprovação do parecer de Peres, o petista João Pedro (AC) comandou o arquivamento de outra representação que tramitava no Conselho contra Renan, relativa à denúncia de que ele havia intercedido junto à Receita Federal e ao INSS em favor da cervejaria Schincariol.

- Não encontrei elementos que possam comprovar essa denúncia e por isso recomendo seu arquivamento - justificou João Pedro, cujo relatório foi aprovado com nove votos a favor e cinco abstenções da oposição.

Já Jefferson Peres sustentou seu parecer com base em um conjunto de indícios que, segundo ele, valem como provas. Para Peres, as inúmeras trocas societárias registradas na duas empresas, envolvendo o filho do senador, o prefeito Renan Filho, e duas pessoas que já estiveram lotadas efetivamente em cargos de confiança no gabinete de de Renan, Idelfonso Tito Uchôa e Carlos Santa Rita, teriam sido decisivas para que ele considerasse a denúncia de Lyra procedente.

No trecho final de seu relatório, Peres ressaltou que "pesa contra a presunção de inocência do senador Renan Calheiros sua conduta na presidência do Senado, desde a instauração do primeiro processo, quando foram notórias e reiteradas sua interferências no Conselho de Ética com o propósito de influir no andamento das investigações, ao invés de manter, como deveria, o prudente distanciamento exigido pelo decoro".

- Fiquei surpreso com o resultado da votação no Conselho. Renan só conseguiu os votos dos três senadores do PMDB. Isso pode significar um abandono. O resultado no plenário é imprevisível - disse Adelmir Santana (DEM-DF).

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