Título: Os passageiros sumiram
Autor: Guiotti, Marcos; Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 17/11/2007, O País, p. 3

No meio do feriadão, aeroportos ficam vazios e 22,4% dos vôos são cancelados.

Uma sexta-feira chuvosa entre o feriado e o fim de semana levou as empresas aéreas a cancelaram 22,4% dos vôos no país, sendo que em alguns aeroportos esse índice passou de 70%. Como não são multadas pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), as empresas acabam cancelando vôos com poucos passageiros mesmo quando já venderam passagens. O "apagão" de passageiros ontem mostrou um outro lado da crise que envolve o setor.

O taxista Pedro Alcântara Backer, que há 15 anos trabalha no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, disse que nunca viu um movimento tão pequeno como o de ontem.

- Passo praticamente o dia todo aqui no aeroporto. Nunca vi uma calmaria assim. Levei um rapaz de volta para Betim de manhã e ele estava revoltado com o cancelamento do vôo. Tinha que chegar às 10h sem falta em São Paulo e, como não ia conseguir, desistiu da viagem.

O maior índice de cancelamento, de 78,3%, foi no Aeroporto da Pampulha. Logo cedo, a Gol cancelou um vôo para Uberlândia, no Triângulo Mineiro, e outro para São Paulo. Os poucos passageiros foram acomodados em outras aeronaves com o mesmo destino.

O segundo vôo da Gol para este aeroporto também foi cancelado, e a Varig cancelou mais um. A funcionária pública Elizabeth Aparecida do Amaral chegou ao Aeroporto de Confins, na Região Metropolitana, às 7h. Seu irmão havia morrido atropelado em São Paulo e ela, que precisava viajar com urgência, não sabia como iria chegar à capital paulista.

- Ninguém quer me vender uma passagem. Passei no guichê da Gol e eles disseram que não tinha conformação dos vôos para São Paulo. Na TAM, a mesma coisa. A Varig me mandou ligar para a central de reservas. Eu só quero ir para o enterro do meu irmão - disse, indignada.

"Por falta de vôo, não consigo chegar"

Muitos passageiros ficaram revoltados. A veterinária Patrícia Lemos iria visitar uma fazenda em Uberaba e, com o cancelamento do vôo, teve que transferir para a semana que vem.

- Deixei de viajar no feriado para trabalhar e, por falta de vôo, não consigo chegar. O pior é que a companhia não teve nem vergonha de dizer que o cancelamento era por falta de passageiro. O que eu tenho com isso?

De acordo com o balanço da Infraero, dos 1.468 vôos programados até as 19h de ontem, 329 (22,4%) foram cancelados, e 67 (4,6%) sofreram atrasos de mais de uma hora. No Aeroporto do Galeão, no Rio, dos 129 vôos previstos, 19,4% foram cancelados e 7,8% atrasaram. No Santos Dumont, que atende principalmente a ponte aérea Rio-São Paulo, os cancelamentos chegaram quase a 41%. Na outra ponta, em São Paulo, o Aeroporto de Congonhas sofreu o mesmo problema: dos 212 vôos previstos, 38,2% vôos foram cancelados pelas empresas na última hora, mas não houve registro de atraso. No Aeroporto de Guarulhos, dos 165 vôos previstos, apenas 9,1% foram cancelados e 3,6% atrasaram.

Segundo a Infraero, os cancelamentos ocorreram porque a demanda de passageiros empresariais, comum às segundas e sextas-feiras, caiu muito por causa do feriado do dia 15. No entanto, também há problemas na programação das empresas aéreas nacionais. Enquanto a média internacional de cancelamentos internacional é de 12%, no Brasil ela é muito maior, em torno de 20%.

O Ministério da Defesa já cobrou da Anac medidas para controlar as empresas que cancelam vôos sem justificativa. Atualmente, elas não são multadas por causa disso, apenas quando os passageiros ficam sem ter como voar. Elas também não são obrigadas a embarcar os consumidores em vôos em outras companhias em horários próximos, e eles ficam horas esperando nos aeroportos até que haja uma nova viagem para aquele destino.

As companhias têm horários de vôos para os mesmos locais em intervalos muito pequenos, e cancelam vôos que não alcançam o mínimo de 15% a 20% de ocupação de assentos. Vôos com menos de 50% de ocupação não são considerados rentáveis.

No primeiro e último dia dos feriadões, o número de passageiros costuma aumentar de 10% a 15%, por causa dos vôos turísticos. A expectativa da Infraero é que, com o início da alta estação, em dezembro, o número de passageiros cresça em torno de 16%.

Nos aeroportos de São Paulo, o clima foi de tranqüilidade, apesar do alto índice de cancelamentos em Congonhas. No Aeroporto Internacional de São Paulo, em Cumbica, Guarulhos, poucos passageiros faziam check-in nos balcões. Funcionários das empresas prevêem que o movimento maior dos feriados prolongados no Rio e em São Paulo deve começar na segunda-feira à noite e continuar na terça.

Feriados emendados no Rio e em SP

Segundo Gol e TAM, o cancelamento de vôos é normal em feriados e fins de semana. No Rio e em São Paulo, o feriado da Proclamação da República (15 de novembro) ficou perto do da Consciência Negra, que cai na terça-feira. Muita gente emendou seis dias sem trabalho, e o número de viajantes de negócios diminuiu.

A Gol informou que esses cancelamentos são programados, e os passageiros, realocados em outros vôos. A TAM disse que os cancelamentos fazem parte de uma estratégia da empresa que leva em conta a baixa demanda. Segundo a assessoria da empresa, o passageiro não é afetado, pois são programados menos vôos.