Título: Submarino nuclear não garante defesa do país, dizem especialistas
Autor: Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 17/11/2007, O País, p. 4

Em seminário no Rio, venezuelana defende a criação de zonas de paz.

Ao explorar a descoberta de petróleo na Bacia de Santos como argumento para a construção de um submarino nuclear (projeto em andamento desde 1979), o ministro da Defesa, Nelson Jobim, provocou a discussão: a defesa do território nacional está garantida com o aparelhamento das Forças Armadas ou serve apenas de pretexto para uma corrida armamentista?

A cientista política Francine Jácome, diretora executiva do Instituto Venezuelano de Estudos Sociais e Políticos, afirma que não vê, na compra de novos equipamentos, garantia de que o país esteja protegido. Ela defende a criação de zonas de confiança mútua, que evitem os conflitos.

- Não necessariamente a militarização e a aquisição de equipamentos serão uma garantia da defesa. É preciso falar na criação de zonas de paz - disse a venezuelana, lembrando que o petróleo também é usado como pretexto para a militarização na Venezuela:

- Um dos argumentos do governo venezuelano para a aquisição de novos equipamentos é a necessidade de defender as instalações petroleiras. Há uma concepção de que os Estados Unidos vão intervir na Venezuela e que, por isso, o objetivo central será a tomada do setor petroleiro. Agora, se essa é uma visão realista ou não, esse é o outro problema. Altos funcionários do governo, por exemplo, manifestaram claramente a improbabilidade da invasão dos Estados Unidos.

Para cientista político, um submarino seria insuficiente

O diretor do Centro de Estudos das Américas, Clóvis Brigagão - que participou ontem, juntamente com Francine, de uma mesa de discussões no IV Conferência Internacional do Forte de Copacabana -, disse que o discurso de Jobim foi político e não de especialista no tema.

- É muita ingenuidade afirmar que um submarino, seja ele atômico ou de qualquer natureza, vai garantir a defesa de um poço de petróleo dessa dimensão. A discussão é ainda prematura. Se for nessa dimensão, vamos precisar de muito mais do que um. Vamos é precisar de uma política integrada de defesa em que se contemple as três Forças Armadas - disse Brigagão, lembrando que o projeto de construção do submarino é bem anterior à descoberta recente da reserva de Tupi, na Bacia de Santos.

O especialista considera exagerada a vinculação entre a nova reserva e o risco de atentados terroristas. Ele lembrou que países como o México e a Venezuela são ricos em petróleo e jamais foram alvos de ataques.

- O terrorismo está na pauta, a partir do 11 de setembro. Mas nós temos aqui petróleo, por exemplo, na Bacia de Campos e nunca houve essa preocupação. Acho que isso é para chamar a atenção. É até pedagógico: a sociedade brasileira não foi acostumada a discutir essas questões de defesa. Essas não são questões fáceis. É um ensinamento para sociedade brasileira - afirmou Brigagão.

Durante o painel, que tratou do tema "Cooperação sul-americana em segurança e a ameaça de uma nova corrida armamentista na região", no Forte de Copacabana, Zona Sul do Rio, Sophie Joineau, representante do ministério da Defesa da França, disse concordar com Jobim, quando ele defende os investimentos em segurança nacional para garantir a paz.

- Para se ter uma política de integração é preciso dar a devida importância aos investimentos na indústria, que melhoram as condições de segurança interna - disse Sophie.

"O debate sobre defesa hoje é marginal", diz especialista

Brigagão, no mesmo painel, afirmou que falta ao Congresso Nacional um debate sobre defesa. O Brasil gasta hoje 1,8% do PIB nacional no setor.

- O debate é marginal. Não há parlamentares que convivam com o tema. Na academia, ainda há poucas informações sobre o tema. Além disso, no meio militar, as discussões são mais internas do que externas.

O diretor da Associação para Políticas Públicas da Argentina, Diego Fleitas, afirma ser contrário ao uso de submarino nuclear para a defesa de recursos naturais. Para ele, a tecnologia deve ser usada apenas com fins estratégicos.

- Para defender os recursos naturais não há necessidade submarino nuclear. O principal sentido do submarino é estratégico. É para defender um lugar que está a 400 km, 500 km da costa. O Brasil é uma potência mundial. O mais importante é ter um papel estratégico, de dissuasão no mundo - disse Fleitas, que vê riscos de o Brasil fomentar desequilíbrios com países fora da América do Sul:

- Isso poderia fomentar os as fraturas entre países fora da região.

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