Título: Fundação para a saúde enfrenta resistência
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 17/11/2007, O País, p. 10

Temporão diz que governo aceita discutir projeto, que tramita na Câmara e está sendo analisado em conferência.

Legenda da foto: PARTICIPANTES DA conferência praticam alongamento: a maioria dos delegados não apóia a fundação estatal.

BRASÍLIA. Aposta do governo para melhorar o atendimento na saúde, o projeto que cria a fundação pública de direito privado sofre resistências dos militantes que atuam no setor. A proposta enviada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso está sendo duramente criticada na 13ª Conferência Nacional de Saúde e deverá ser rejeitada pela maioria dos delegados.

O projeto prevê que hospitais e outras unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) tenham autonomia de administração e que os médicos, aprovados em concurso, sejam obrigados a cumprir metas, sob pena de serem demitidos.

Responsável pelo evento é contrário ao projeto

No enorme galpão de exposição onde ocorre a conferência, que reúne mais de quatro mil representantes do setor, há várias faixas contrárias ao projeto, feitas por sindicatos e federações de trabalhadores da saúde e entidades sindicais, como a CUT. O Conselho Nacional de Saúde, responsável pela conferência, já adotou posição contrária ao projeto. O presidente do conselho, Francisco Batista Júnior, é um duro opositor da fundação:

- O projeto significa a mercantilização da saúde, ao prever que profissionais serão remunerados por salários de mercado. Isso acaba com a interiorização de médicos, enfermeiros e tantos outros profissionais, e termina de vez com a possibilidade da criação da carreira da saúde.

O projeto do governo foi enviado em julho e tramita lentamente na Câmara. A proposta apenas define os ministérios que poderão instituir esse modelo em suas autarquias. Detalhes de seu funcionamento, como forma de contratação, salários e conselhos gestores, serão estabelecidos em outra proposta.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, está preocupado com a repercussão negativa, entre os parlamentares, de eventual derrota na conferência. Diante da rejeição anunciada, o ministro e entidades que apóiam a fundação estatal - como as que reúnem secretários municipais e estaduais de saúde - buscam uma espécie de saída honrosa. O Conselho Nacional de Secretários de Saúde Municipais (Conasems) e o Conselho Nacional de Secretários Estaduais (Conass) vão apresentar uma moção com 12 pontos a serem contemplados na proposta do governo.

Temporão nega que seja um recuo. Ele afirmou que o governo não vai retirar a proposta do Congresso, mas aceita discutir trechos do projeto:

- A fundação estatal é uma proposta do governo e foi enviada ao Congresso pelo presidente da República. Não tem sentido retirá-la. Mas o governo está disposto a discutir e a sentar com várias entidades e conversar. O que não pode é simplesmente a conferência rejeitar e não apresentar proposta alguma.

O documento que está sendo negociado propõe um modelo de gestão que seja estatal e que fortaleça o papel do Estado. "Que seja 100% SUS, com financiamento exclusivamente público e operando com uma única porta de entrada", afirma o texto. Os críticos da fundação argumentam que o modelo vai permitir que o setor privado participe da direção de hospitais.

Nas conferências estaduais prévias ao encontro nacional, a fundação foi aprovada em apenas duas delas: Bahia e Rio. O secretário de Saúde da Bahia, Jorge Solla, um dos mais enfáticos defensores, critica os opositores por reduzirem a discussão a ser contra ou a favor.

-- A conferência não pode perder essa oportunidade e simplesmente dizer que não aprova. Todos concordamos que a gestão do SUS precisa de mudanças. Vamos sentar e conversar - disse Solla.