Título: Do luxo ao lixo
Autor: Mendes, Taís
Fonte: O Globo, 16/11/2007, Rio, p. 10

Jovens que atacaram prostitutas e travestis limpam Bosque da Barra.

Oferiado foi de muito trabalho para dois dos três jovens de classe média que, no último dia 4, atacaram prostitutas e travestis na orla da Barra com jatos de extintor de incêndio. Durante quatro horas, a dupla foi obrigada a limpar 82 lixeiras da Comlurb, dentro e ao redor do Bosque da Barra. Fernando Mattos Roiz Júnior, de 19 anos, estudante de jornalismo, e Luciano Filgueiras Monteiro, de 21, que cursa engenharia, começaram ontem de manhã a cumprir a pena alternativa determinada pela Justiça. Uma rotina que deverá se repetir nos próximos fins de semana, quatro horas por dia, durante um ano. É a primeira vez que uma pena alternativa é aplicada na execução de serviços da Comlurb. No exterior, relacionar a punição a serviços de limpeza urbana é mais comum.

A pena foi determinada pelo juiz Joaquim Domingos de Almeida Neto, do Juizado Especial Criminal da Barra, por sugestão do Ministério Público estadual. O trabalho começou pelas lixeiras, mas os dois jovens farão outros serviços de limpeza na região da Barra, sempre aos sábados e domingos. O gerente da Comlurb Luiz Carlos de Souza foi designado para acompanhar o cumprimento da pena e uma lista de presença deverá ser apresentada mensalmente ao juiz.

¿ Eles se apresentaram na hora marcada, sozinhos, e acompanharam atentos as explicações sobre o serviço. No sábado, serão preparados para outra atividade de limpeza, concluindo as oito horas da primeira semana ¿ disse o gerente.

Visivelmente constrangido, Luciano permaneceu o tempo todo de cabeça baixa e chegou a chorar durante o trabalho. Fernando mostrou-se mais rebelde, mas disse estar arrependido.

¿ Estamos arrependidos do que fizemos e estamos pagando. Tem gente que erra e não paga ¿ afirmou.

Gambá no lixo assusta rapazes

Com luvas e arrastando um contêiner para recolher os detritos das lixeiras, os dois iniciaram a limpeza às 9h, atraindo a curiosidade dos freqüentadores do parque.

¿ O que está acontecendo? ¿ indagou um senhor ao ver os jovens cercados por repórteres. ¿ Acho pouco para o que fizeram ¿ disse, ao ser informado do que se tratava.

Um imprevisto chegou a assustar os jovens: ao abrirem uma das lixeira, encontraram um gambá vivo. Os dois jovens se afastaram e o animal foi retirado pelo funcionário da Comlurb que supervisionava o trabalho.

¿ Aqui é comum eles entrarem na lixeira para buscar restos de comida ¿ explicou o funcionário.

Um casal que caminhava no parque parou para assistir à cena. Pai de três adolescentes, o engenheiro Paulo Augusto Damasceno, de 46 anos, defendeu a pena alternativa:

¿ Alguma coisa tem que ser feita. Tenho filhos adolescentes e acho que o trabalho comunitário ajudará esses jovens a refletirem sobre o que fizeram.

Estudante de direito, Bernardo Vanerven, de 22 anos, participava de um churrasco no parque quando Luciano e Fernando chegaram para limpar as lixeiras ao redor. O universitário acredita que a pena alternativa pode contribuir para mudanças de atitudes.

¿ Há muitos casos em que a pessoa condenada continua prestando o serviço mesmo após o fim da pena alternativa ¿ observou.

Luciano e Fernando também foram indiciados pelo delegado Carlos Augusto Nogueira Pinto, da 16 ª DP (Barra), por furto qualificado. Eles teriam furtado um extintor de incêndio do Shopping Downtown. Caso sejam condenados, poderão cumprir pena de dois a oito anos de prisão. Um menor de 17 anos, que estava com eles, também responderá pelos crimes no Juizado da Infância e Juventude.

¿ Como a descoberta do furto foi posterior ao depoimento deles, foram intimados a retornar à delegacia e prestar novos esclarecimentos ¿ disse o delegado, acrescentando que eles deverão ser ouvidos após o feriado de terça-feira.

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