Título: Brasil repreende Ahmadinejad
Autor: Queiroz, Silvio
Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2009, Mundo, p. 15

Itamaraty confirma a visita do presidente iraniano para o próximo dia 6 e anuncia que vai expressar desagrado pelo discurso em que ele, mais uma vez, pôs em dúvida o Holocausto dos judeus sob o nazismo

O governo brasileiro se antecipou a possíveis queixas e anunciou que aproveitará a visita do presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, para expressar ¿preocupação¿ pelo teor de seu discurso na Conferência das Nações Unidas sobre o Racismo, em Genebra. Falando no primeiro dia da reunião, ele uma vez mais se referiu ao Holocausto dos judeus sob a Alemanha nazista como ¿uma questão ambígua e dúbia¿, para depois classificar Israel como um ¿governo racista¿. Em nota oficial, o Itamaraty confirmou que Ahmadinejad é esperado em Brasília no próximo dia 6 e antecipou que a parte brasileira vai ¿reiterar ao governo iraniano suas opiniões sobre esses temas¿.

¿O governo brasileiro tomou conhecimento, com particular preocupação, do discurso do presidente iraniano que, entre outros aspectos, diminui a importância de acontecimentos trágicos e historicamente comprovados, como o Holocausto¿, diz o texto. Na avaliação do Itamaraty, ¿manifestações dessa natureza prejudicam o clima de diálogo e entendimento necessário ao tratamento internacional da questão da discriminação¿. A delegação brasileira à conferência de Genebra não se retirou durante o discurso de Ahmadinejad, ao contrário do que fizeram os representantes europeus, mas não aplaudiu.

A redação da nota parece sob medida para neutralizar desde logo qualquer mal-estar com Israel, que, embora se abstenha de comentar oficialmente a aproximação do governo Lula com Teerã, tem deixado sua insatisfação patente, por canais diplomáticos. No mesmo dia em que o presidente iraniano discursou, a chancelaria israelense chamou de volta seu embaixador em Berna como protesto pela reunião mantida pelo presidente suíço, Hans Rudolf Merz, com Ahmadinejad. O comunicado oficial censura o ¿encontro de um presidente de um país democrático com um notório negador do Holocausto¿, tanto mais realizado ¿na véspera do Dia de Recordação das Vítimas do Holocausto¿.

Também o secretário-geral das Nações Unidas, o sul-coreano Ban Ki-moon, equilibrou-se entre a defesa da conferência ¿ boicotada desde a convocação por Israel, pelos Estados Unidos, pela Alemanha e outros aliados europeus ¿ e a repreensão ao presidente iraniano. Ban lamentou que Ahmadinejad tenha ¿desvirtuado¿ o espírito da conferência ¿para propósitos políticos¿, com um discurso que ¿acusou, dividiu e até mesmo incitou¿. O secretário-geral falou à imprensa sobre o ¿longo encontro¿ que manteve com o presidente iraniano antes de este se pronunciar. ¿Pedi a ele que fizesse uma contribuição equilibrada e construtiva à conferência¿, como único chefe de Estado presente.

Em campanha De volta ao Irã, o presidente foi recebido no aeroporto por ¿uma multidão¿, segundo o relato da agência oficial de notícias Fars. Um jornal governista qualificou o discurso de segunda-feira como ¿o tiro de misericórdia¿ para as potências ocidentais. Ahmadinejad disputará no início de junho a reeleição, tendo como principal adversário um candidato da facção reformista do regime, que se apresenta como o mais credenciado a corresponder às iniciativas de aproximação por parte do novo presidente dos Estados Unidos.

Desde a campanha pela Casa Branca, Barack Obama fala em dialogar com o Irã e outros adversários. Em relação ao governo de Teerã, Obama convidou-o a compartilhar os esforços para estabilizar o Afeganistão e a negociar diretamente com as seis potências (EUA, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha) que coordenam esforços para impedir que o país desenvolva armas nucleares.