Título: Ataques à defesa de Lula a Chávez
Autor: Vasconcelos, Adriana; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 16/11/2007, O Mundo, p. 22

OS PROBLEMAS DO COMANDANTE

Oposição critica apoio de presidente brasileiro a venezuelano e fará ato de desagravo a rei espanhol

Ao tomar partido de seu colega venezuelano Hugo Chávez sobre o bate-boca que este teve com o rei da Espanha, Juan Carlos, durante a última Cúpula Ibero-Americana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva despertou novas desconfianças no Congresso sobre um possível interesse seu na aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) que o autorizaria a disputar um terceiro mandato. Como contraponto a Lula, a oposição promoverá um ato de desagravo na Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado na próxima semana, aprovando um voto de aplauso para Juan Carlos, que mandou Chávez calar a boca quando este chamava o ex-presidente de governo da Espanha José María Aznar de fascista. Para Lula, Chávez não exagerou e a Venezuela seria modelo de democracia.

- Existe uma ligação entre Lula e Chávez que não sabemos até onde vai. Realmente sua postura não me surpreende, mas vai gerar protestos no Congresso - advertiu o presidente da CRE, senador Heráclito Fortes (DEM-PI), que vai pôr em votação o voto de aplauso apresentado pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA).

Para ele, a postura de Lula terá repercussões políticas e econômicas.

- Acho uma temeridade o Brasil entrar numa briga dessa natureza. O país poderá ter desgastes na sua relação não só com o governo espanhol, como também com a União Européia - acrescentou Fortes.

Moratinos: mais gestões que gestos

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), titular da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, criticou especialmente a tentativa de Lula de justificar as manobras de Chávez para se perpetuar no poder, fazendo uma comparação com a longa permanência de alguns primeiros-ministros no cargo em sistemas parlamentaristas:

- Esse modelo que está sendo implantado na Venezuela é uma ditadura consentida porque neutraliza a oposição e submete a referendos suas decisões. Acho que o presidente Lula não ignora a distinção entre parlamentarismo e presidencialismo. Ele não reconhece que no parlamentarismo o primeiro-ministro é substituído com facilidade. Se ele a utilizou, não foi por ignorância, mas para preparar o clima de sua própria reeleição.

O único governista que se dispôs ontem a defender Lula foi o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), justamente quem promete apresentar uma emenda constitucional que autorizaria o presidente a promover plebiscitos nacionais e regulamentaria a possibilidade de governantes disputarem mais de uma reeleição. Sobre o que Lula disse sobre Chávez, afirmou:

- Concordo totalmente com Lula.

Já o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) deixou clara sua oposição a iniciativas para ampliar a reeleição de chefes de governo no país:

- Se tivesse oportunidade de dialogar com Chávez faria a mesma reflexão que tenho feito com meu partido e com o presidente Lula. O direito de reeleição indefinido não é saudável.

Para o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio, as declarações de Lula são desastrosas tanto do ponto de vista econômico, como político:

- A Espanha é um dos maiores investidores no país. Fica muito ruim para o Brasil quando o presidente Lula endossa as tolices do quase ditador Chávez.

- São declarações assustadoras, principalmente para quem vinha negando sistematicamente qualquer perspectiva de continuísmo, de terceiro mandato. É lamentável e nos coloca em guarda. A preocupação que tínhamos com a proposta do Devanir começa a se concretizar, a ganhar o tom da verdade - emendou o líder do Democratas, José Agripino (RN).

Na Espanha, o ministro de Relações Exteriores, Miguel Angel Moratinos, disse que mais do que "gestos", são necessárias "gestões" para reconstruir a relação com a Venezuela. Moratinos ressaltou que "a última coisa que se deve fazer" é chamar para consulta o embaixador em Caracas. Ele afirmou que a Espanha permanecerá calma e firme, defendendo seus interesses sem provocar mais tensões.

Ontem, o presidente do governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, contou que a discussão com Chávez foi "um momento de tensão com muita carga emocional e política", mas disse que o que a TV transmite parece mais forte do que realmente é.