Título: Tribunais ágeis para gastar
Autor: Casado, José; Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 20/11/2007, O País, p. 3

Novas sedes do Judiciário devem consumir até R$1,2 bi nos próximos cinco anos.

OJudiciário se transformou num dinâmico segmento do mercado imobiliário. No ano passado, a Justiça federal pagou R$239,8 milhões por obras, instalações e projetos. Há mais R$1,2 bilhão previsto para gastos nos próximos cinco anos, somente com a construção de novas e monumentais sedes de tribunais superiores em Brasília.

A paisagem da capital da República mudou nos últimos 21 meses, desde a inauguração dos palácios do Tribunal Superior do Trabalho (ao custo de R$202,9 milhões) e da Procuradoria Geral da República (R$75 milhões).

Novas intervenções arquitetônicas serão impostas pelas futuras sedes do Conselho da Justiça Federal (estimado em R$350 milhões), do Tribunal Superior Eleitoral (R$336,7 milhões) e do Tribunal Regional Federal (R$489,8 milhões).

Os juízes dos tribunais superiores parecem empenhados, desde os anos 90, numa espécie de competição imobiliária, pois a cada novo prédio erguido são construídos gabinetes de trabalho mais amplos que os vizinhos. Quando foi inaugurado, em meados dos anos 90, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) dispunha de gabinetes de 145 metros quadrados. Em pouco tempo, construiu um anexo, e a área de cada gabinete passou a 280 m. Próximo dali, na corte trabalhista, aberta no ano passado, a área disponível para cada juiz é de 240 m.

Entre os novos edifícios projetados há o do Tribunal Regional Federal (1 Região), onde as salas dos magistrados serão de 350 m. No Conselho da Justiça Federal, a área prevista para a presidência é de 650 m.

Em Minas, uma sede de R$346 milhões

Variam, também, os preços das obras. Em Minas Gerais, por exemplo, o custo do novo palácio da Justiça estadual (R$346 milhões) tornou-se uma controvérsia judicial. Os juízes se defenderam, em notas públicas, argumentando que o custo de construção será baixo - "se comparado a outras obras do país, incluindo a do Tribunal Superior Eleitoral."

Compararam: "Considerando a área total a ser construída de 138.164,61 m, temos um valor de R$2,6 mil por m. O custo do prédio do TSE é de R$2,8 mil por m."

O edifício vai transformar o Centro de Belo Horizonte: será um conjunto em "L" com torres de 11 andares e seis subsolos, 1.597 vagas de estacionamento, 16 plenários, lojas, salão para eventos e ainda mais quatro auditórios, além de um exclusivo para os 25 desembargadores.

Numa das etapas da pendência judicial sobre os custos desse monumento em concreto, a cúpula da Justiça mineira apresentou uma outra pesquisa: comparou sua planilha com os preços pagos por metro quadrado de obras públicas em andamento.

Os resultados sugerem absoluto descontrole nos gastos federais e estaduais: "Os valores das obras públicas em andamento variam de R$2,33 mil (edifício sede da Polícia Rodoviária do Distrito Federal)" - alega o tribunal mineiro - "passando por R$3 mil (secretaria de Saúde de São Paulo) até R$6,6 mil (Codemig ? Cia. de desenvolvimento Econômico de Minas Gerais)".

Menos controversa, até por ser pouco conhecida, é a rotina de despesas dentro dos palácios da Justiça em funcionamento.

Quando observadas em detalhe, as listas de despesas do Judiciário expõem a disseminação de mordomias entre juízes e assessores.

No Rio, o Tribunal Regional do Trabalho (1 Região) gastou R$118,9 mil na compra de 200 geladeiras tipo frigobar - "capacidade mínima de 120 litros", exigia o edital. O destino: gabinetes de juízes, de dirigentes administrativos e alguns assessores no palácio.

Na corte superior, em Brasília, percebe-se uma predileção pelo forno microondas. O TST comprou 34 entre maio e setembro, por R$10,2 mil. No Supremo Tribunal Federal, a cesta de fruta foi orçada em R$33 mil por ano e inclui 30 variedades: 1.320 abacaxis pérola, 612 quilos de caqui, 684 quilos de mamão e 960 quilos de melancia, entre outros itens, com detalhes.

No Tribunal Superior Eleitoral, onde ocorrem em média duas sessões por semana, o cardápio prevê o consumo mensal de oito tipos de torta diferente, de camarão a bacalhau. Tudo preparado sobre massa folheada, impõe o edital publicado no início do ano. O banquete inclui biscoitos de chocolate e castanha, bolos de banana, milho, cenoura, chocolate e mandioca, além de mousse de maracujá.

No TST, despesas detalhadas em site

Ao lado, no Superior Tribunal Militar, os ministros demonstram rigor típico da caserna. A compra anual de guloseimas de confeitaria (mini-torteletes de morango, trufas de brigadeiro e strudels de nozes) tem uma condição essencial, ressaltada no edital: "De primeira qualidade". Com hábitos de transparência mais apurados que a maioria dos órgãos públicos federais, o Tribunal Superior do Trabalho passou a listar em sua página na internet (www.tst.gov.br) os dispêndios relevantes de cada mês. Os pregões de alimentos do TST têm atas explícitas sobre o objetivo: "Produção de lanche para atendimento aos senhores ministros".