Título: Acerto de contas
Autor: Jansen, Roberta
Fonte: O Globo, 21/11/2007, Ciência, p. 31

ONU revê metodologia, e número global de casos de Aids cai em sete milhões.

Uma revisão na metodologia usada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para estimar os casos de HIV/Aids no mundo levou a uma redução significativa do número global de infecções de aproximadamente 40 milhões para 33 milhões. À parte a diminuição ocasionada pela revisão metodológica, os dados do novo relatório divulgado ontem revelam uma ligeira redução real no número de novas infecções e mortes anuais provavelmente em razão das ações de prevenção e ao maior acesso ao tratamento.

Mas o momento não é de euforia, alertaram os especialistas do Programa de Aids da ONU (Unaids). A epidemia continua entre as principais causas de morte no mundo - a maior nos países da África Subsaariana - e, a cada ano, são registrados 2,5 milhões de novos casos. Além disso, o número de pessoas sem acesso às terapias continua muito alto: apenas 2 milhões recebem o tratamento em todo o mundo.

- A diferença (de 40 milhões para 33 milhões) é grande, mas o número global continua alto - frisou o diretor de Iniciativas Globais do Unaids, Luiz Loures. - Do ponto de vista da ação, dos programas a serem implementados, o impacto não muda. Seria um erro olhar esse número de forma absoluta. É preciso ver o que está faltando; e a lacuna entre a epidemia e a resposta oferecida ainda é enorme. Se continuarmos no passo de hoje, teremos 4,5 milhões de pessoas em tratamento em 2010, o que eu considero inaceitável. Nosso objetivo é chegar pelo menos a 10 milhões.

Reino Unido dobra número de casos

De acordo com os dados do relatório, o número anual de novas infecções pelo HIV atingiu seu ápice na década de 90, quando ultrapassava os 3 milhões. Em 2007, o número foi de 2,5 milhões. As cifras de mortalidade também apresentam uma leve tendência de redução. Foram 2,1 milhões de mortes este ano, contra estimados 2,2 milhões e 2,3 milhões em 2006 e 2005. Finalmente, as taxas de prevalência da doença (o percentual de infectados na população) vêm se mantendo estáveis desde 2000.

- É claro que parte dessa revisão está relacionada aos avanços na prevenção e no tratamento - sustenta Loures. - Basta dizer que, em 1996, os investimentos somavam US$300 milhões e, hoje, são US$10 bilhões. É uma diferença brutal do ponto de vista de financiamento e é lógico que isso tem um impacto. Ainda assim, continuamos tendo 2,5 milhões de novos casos por ano, um número por si só catastrófico.

A região mais atingida pela epidemia continua sendo a África Subsaariana, que concentra dois terços de todos os novos casos de infecção e morte pelo HIV e onde vivem 22,5 milhões dos portadores do vírus - a maioria (61%) do sexo feminino. É na Ásia, no entanto, que a epidemia avança num ritmo mais alto. Em 2007, foram registrados 20% mais novos casos da infecção do que em 2001. E os países desenvolvidos tampouco devem se descuidar. No Reino Unido, por exemplo, o número de novas infecções anuais mais do que dobrou entre 2001 e 2007, passando de 4.152 para 8.925.

- Estamos vendo sinais de retomada da epidemia no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Alemanha - afirmou o diretor de Monitoramento e Políticas do Unaids, Paul De Lay.

A revisão dos números anunciada ontem alimenta críticas segundo as quais o Unaids superestimou os dados da epidemia ou mesmo usou metodologias não muito confiáveis. Técnicos do programa garantem que utilizaram as melhores metodologias disponíveis a seu tempo e que continuarão buscando aprimoramentos. No relatório do ano passado, o número estimado de pessoas vivendo com HIV no mundo era de 39,5 milhões. Com a revisão da metodologia - sobretudo com a provisão de dados mais acurados na Índia e em alguns países da África - o número real de 2006 seria de 32,7 milhões.

- A epidemia segue sendo o maior desafio de saúde pública no mundo mesmo com os ajustes nas cifras - resumiu o diretor do Departamento de HIV/Aids da OMS, Kevin De Cock.