Título: Curto-circuito em Furnas
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 26/11/2007, O País, p. 3

Funcionários se mobilizam contra tentativa de políticos do PMDB de controlar fundo de pensão

OConselho Deliberativo do Real Grandeza, fundo de pensão dos funcionários de Furnas Centrais Elétricas, que gere uma carteira de investimentos de R$4,8 bilhões, se reúne nesta quarta-feira para votar a substituição do presidente e do diretor de Investimentos. Contrária à mudança, a Associação de Aposentados de Furnas (Após Furnas) pediu aos funcionários que resistam às tentativas de "aparelhamento político" do Real Grandeza, e o conseqüente prejuízo para a saúde financeira do fundo.

A substituição foi proposta na semana passada por dois membros do Conselho Deliberativo do Real Grandeza (Ruy Eduardo Campelo e Pedro Fernandes Motta, ambos indicados recentemente pela patrocinadora, Furnas). Eles agiram a pedido do presidente da estatal, o ex-prefeito do Rio Luiz Paulo Conde (PMDB), que assumiu o cargo há quatro meses.

O temor dos funcionários é que se repita com a Fundação Real Grandeza o que ocorreu com a Prece, fundo de previdência da Cedae. O grupo político que atuava na estatal fluminense era ligado ao deputado federal Eduardo Cunha, do PMDB fluminense. Durante o governo Rosinha Garotinho (2002-2006), o secretário estadual de Meio Ambiente, a quem a Cedae é vinculada, era Conde. Auditoria contratada pelo conselho deliberativo do fundo este ano constatou aplicações "temerárias" feitas pela Prece em 2006. Em uma das operações, foram aplicados R$74 milhões em uma corretora com um ativo de R$80 milhões e um passivo de R$326 milhões.

Furnas precisa de 3 votos para mudança

Para trocar o atual presidente do Real Grandeza, Sérgio Wilson Ferraz Fontes, e o diretor de Investimentos, Ricardo Carneiro Gurgel Nogueira (cujo mandato de três anos ainda não terminou), Conde terá de contar com os votos de pelo menos três dos seis membros do Conselho - o presidente do órgão, indicado por Furnas, tem direito ao voto de minerva. Os indicados para o cargo são Alci Peçanha Ferreira e Gilberto de Paula e Silva (ambos funcionários de carreira da estatal).

Os votos dos dois conselheiros indicados por Furnas são tidos como certos a favor da mudança. Mas os dirigentes da Após Furnas garantem que os três conselheiros eleitos pelos empregados votarão contra. O último voto, do representante da Eletronuclear, é uma incógnita. Na semana passada, em contato com dirigentes de Após Furnas, ele teria dito que também votaria contra a mudança.

O Real Grandeza também enfrentou problemas de gestão no passado recente. Em 2005, a fundação teve seu nome envolvido nas investigações da CPI dos Correios e foi também o fundo de pensão que mais perdeu dinheiro com a quebra do Banco Santos, de Edemar Cid Ferreira. Nada menos que 5% do patrimônio da fundação estavam aplicados no banco.

No primeiro governo Lula, a gestão do Real Grandeza foi entregue à corretora Assurê, do empresário carioca Henrique Brandão, habitual financiador de campanhas de Roberto Jefferson, então presidente do PTB. Embora a atuação de corretoras privadas em negócios de resseguro na área nuclear fosse proibida, a Assurê foi aceita por José Marcos Castilho, ex-prefeito de Angra dos Reis pelo PT, escolhido na época para a diretoria financeira da Eletronuclear por Marcelo Sereno, então assessor da Casa Civil.

Com os escândalos, a direção da Real Grandeza foi substituída. A nova gestão, liderada por Sérgio Wilson Fontes, teria obtido uma recuperação. No ano passado, produziu uma rentabilidade da carteira de 2,5 vezes o mínimo atuarial, cálculo que combina inflação acumulada mais 6% de juros ao ano.

Apesar do êxito, os autores da proposta de mudança alegam que "a renovação gerencial na diretoria executiva deve ser encarada como uma decisão de alto nível com foco na preparação de um projeto sustentável para a instituição previdenciária". Na proposta, eles lembram que a renovação em qualquer empresa é positiva, desde que feita de forma "consistente e saudável".

Para os dirigentes de Após Furnas, não se trata de uma renovação saudável. Na semana passada, eles distribuíram panfletos contra a mudança. Há quatro meses, as gestões de Eduardo Cunha foram decisivas para a escolha de Conde para presidir Furnas. Relator da emenda que prorroga a CPMF, ele foi acusado pela oposição de pressionar o governo com uma manobra legislativa, em troca da nomeação do aliado peemedebista. Mas Cunha tem negado a indicação.