Título: Evo está seguindo os passos de Hugo Chávez
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Fonte: O Globo, 26/11/2007, O Mundo, p. 20

BUENOS AIRES. Na visão do analista boliviano Carlos Cordero, professor da Universidade Maior de San Andrés, ¿a aprovação em geral do texto da nova Constituição representa um êxito para o governo do presidente Evo Morales, mas o custo político será altíssimo¿. Em entrevista ao GLOBO, por telefone, de La Paz, o especialista assegurou que ¿Evo está seguindo os passos de (Hugo) Chávez, sem perceber que a situação da Bolívia é muito mais delicada¿ que a da Venezuela.

Janaína Figueiredo

A legitimidade do texto constitucional está sendo questionada?

CARLOS CORDERO: Sim, esta é uma Constituição de legitimidade duvidosa, não só porque foi aprovada num quartel militar, mas também porque obteve o voto de 136 representantes da Assembléia Constituinte, de um total de 255 membros. Além disso, o governo e seus aliados violaram regras de funcionamento da assembléia como, por exemplo, a obrigação de ler todo o texto constitucional antes de sua aprovação. Neste caso foi lido apenas o índice, um absurdo. Aspectos como a reeleição indefinida do presidente não foram debatidos de forma apropriada. Sabemos, por pessoas que estavam presentes no momento, que representantes do governo pressionaram as autoridades para que aprovassem o texto antes que manifestantes da oposição chegassem ao lugar.

O texto ainda deve ser votado em detalhe...

CORDERO: Deveria ser assim, mas o que tememos é que o governo tente passar direto ao referendo popular, violando outra norma fundamental da Assembléia Constituinte. Saberemos o que vai acontecer no próximo dia 14 de dezembro, quando será anunciada a data do referendo. O governo tem 120 dias para convocar a consulta popular. O problema é que tem um amplo setor vinculado ao presidente que considera que está sendo protagonista de uma revolução e, se for necessário, essa revolução será realizada à força, com violência, sem respeitar princípios básicos da democracia. Esse é o risco que corremos.

O clima no país é caótico?

CORDERO: Tão caótico que hoje o chefe de polícia de Sucre disse que sua força se sentia abandonada pelo governo e ordenou a saída dos policiais da cidade. Longe de controlar a ação dos movimentos sociais, o governo incentiva os protestos e está provocando uma situação realmente muito perigosa. Amanhã (hoje), esperamos a chegada de 4 mil cocaleiros em La Paz. O objetivo dos manifestantes, a partir de agora, será pressionar o Senado, onde o governo não tem maioria, para aprovar em detalhe o texto. Se a manobra não funcionar, a possibilidade de que o governo convoque o referendo sem aprovar o texto em detalhe é grande. Nas próximas semanas ainda teremos muita tensão.

Qual será a atitude da oposição?

CORDERO: Nas próximas semanas, será questionada a legitimidade jurídica da Constituição. O debate vai ser duro e a pressão dos movimentos sociais aliados ao governo será cada vez maior. A aprovação em geral do texto da nova Constituição representa um êxito para o governo do presidente Evo Morales, mas o custo político será altíssimo.

Alguns setores da oposição afirmam que Morales está seguindo os passos do presidente venezuelano, Hugo Chávez....

CORDERO: Sim, Evo está seguindo os passos de Chávez, sem perceber que a situação da Bolívia é muito mais delicada. Aqui o governo não controla o Senado e não governa seis dos nove estados do país. Por isso, o risco de uma imposição da Constituição à força é enorme. Se for convocado um referendo, milhões de pessoas não vão querer participar, porque não apóiam o projeto do presidente. O cenário é realmente muito delicado.