Título: Lula em campo pela CPMF
Autor: Damé, Luiza; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 27/11/2007, O País, p. 3

Decisão de Mantega de enviar proposta de reforma tributária só em 2008 irrita oposição.

Ainda sem os 49 votos necessários para aprovar a CPMF no Senado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ontem a seus ministros que se empenhem no trabalho de convencimento dos parlamentares, e anunciou que se envolverá pessoalmente na conquista de apoios. Mas ao mesmo tempo em que Lula estimula uma espécie de força-tarefa pró-CPMF, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anuncia que só enviará ao Congresso a nova proposta de reforma tributária após a aprovação da CPMF, ou seja, ano que vem. Essa decisão pode piorar o clima no Senado, onde a oposição reagiu com irritação, e aliados foram surpreendidos.

O envio da reforma tributária fora prometido para dia 30 de novembro, como parte dos entendimentos em torno da CPMF. Ontem, porém, Mantega disse que seria inadequado tratar do tema neste momento:

- Chegamos à conclusão de que é melhor adiar a apresentação da reforma tributária para depois da solução da CPMF. É preciso primeiro tirar uma questão de cena para depois colocar outra questão.

Segundo Mantega, foi a base do governo que achou que os temas deveriam ser tratados separadamente:

- Não vamos misturar os canais. É melhor postergá-la (a reforma), e concentrar todos os esforços para a aprovação da CPMF.

A decisão deve aumentar a lista das dificuldades do governo. A oposição disse que essa é uma demonstração de que o governo não cumpre acordos e que, por isso, não era possível firmar um entendimento em torno da prorrogação da CPMF. Líderes governistas foram surpreendidos com as declarações de Mantega, mas preferiram adotar o discurso de que isso não muda a já difícil situação do governo.

- Essa decisão é um elemento de desconfiança. É um sinal de que eles podem voltar atrás em outros pontos acordados. É mais uma boquirrotice do governo. Nunca vi um compromisso que o presidente tomou ser desfeito num tempo tão curto - disse o líder do DEM, Agripino Maia (RN).

Já o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), preferiu ser irônico:

- Talvez o ministro Mantega tenha sido mais sincero. Se não tinha a intenção de fazer a reforma, foi mais sincero do que mandar e depois não ter vontade de ver aprovada. Reforma política e reforma tributária só são votadas no primeiro ano de um governo.

Jucá desconhecia decisão de Mantega

Ao chegar no Senado, à tarde, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), não escondeu que desconhecia a decisão de Mantega sobre a reforma tributária, mas foi cuidadoso:

- Vários senadores cobravam um texto de reforma tributária. Eu mesmo defendo uma reforma tributária ousada e radical, mas capenga, não. Se ela não está redonda, não adianta mandar e ficar parada na Câmara. É preciso que tenha um mínimo de consistência. Se dependesse de mim, ela viria até o dia 30, mas viria redonda.

- Essa decisão não muda o nosso placar. Dependendo da proposta que viesse, poderia mais atrapalhar do que ajudar. Mas o ministro deveria ter nos avisado - acrescentou o líder do PSB, Renato Casagrande (ES).

A oposição está afiada nos ataques, mas dividida sobre a estratégia. O DEM tem pressa em votar por acreditar que o governo não tem os votos, e o PSDB quer arrastá-la até 2008. Hoje, os dois partidos se reúnem para tentar um acordo. O governo poderá optar por não votar a CPMF este ano se não tiver segurança dos 49 votos. Se a emenda da prorrogação não for votada este ano, o tributo terá que ser criado novamente, o que exigirá um prazo de 90 dias para entrar em vigor. O que significa que, se não for aprovada até 30 de dezembro, o governo poderá perder três ou quatros meses de arrecadação - mais de R$10 bilhões.

Mesmo sem a reforma tributária, o ministro Mantega ainda aposta num desfecho positivo para a CPMF. Segundo ele, não há plano B nas contas do governo caso a prorrogação não seja aprovada:

- Não estamos estudando nenhum plano B. Mas é bom que as pessoas saibam que poderia haver uma perda. Até vamos ter de segurar a aprovação do Orçamento para saber se vamos ter recursos para emendas e investimentos nos estados.

Ciente de todas essas dificuldades, o presidente Lula vai entrar no corpo-a-corpo com os políticos, telefonando para governadores e senadores e recebendo-os no Palácio do Planalto. Pode, inclusive, participar de encontros de seus articuladores políticos com as bancadas de senadores. Hoje, o novo articulador político do Planalto, José Múcio Monteiro, janta com os senadores de seu partido, o PTB, que resistem em votar unidos pela CPMF. Amanhã, o jantar será com a bancada do PMDB. Lula pode aparecer.

A estratégia de reforço pela CPMF foi traçada na reunião de coordenação de governo, ontem, quando se avaliou que não existe voto perdido, que todo senador pode ser convencido.

- Todos precisam se envolver nisso - disse Lula na reunião.

Os operadores políticos do governo vão pedir um voto de confiança aos senadores, argumentando que os pleitos que não forem atendidos agora poderão ser resolvidos adiante, pois ainda há três anos de mandato.

- Já estava na hora de o presidente entrar em campo. Ele pode fazer a diferença. Acho difícil um senador indeciso votar contra depois de ouvir seus argumentos - disse o líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO).

José Múcio já começa a negociar

A votação em primeiro turno da emenda em plenário deve acontecer entre os dias 12 e 15 de dezembro. Ontem mesmo, antes da sua posse formal como ministro, José Múcio falou com governadores e senadores.

- Na CPMF todos precisamos entrar em campo. É uma matéria da sociedade, do país, não é uma matéria de partido político, de lados. Você pode até ser contra o governo, mas não pode ser contra o país - disse José Múcio, após a posse: - Se o presidente está verdadeiramente disposto a trabalhar, como ele diz que está, é porque, como gestor do Brasil, sabe da responsabilidade na aprovação da CPMF. É uma responsabilidade de quem está no comando do país.

- O prazo está no limite - alertou o presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), que criticou a oposição por vincular a votação da CPMF ao processo contra o senador Renan Calheiros e à discussão sobre um terceiro mandato para o presidente Lula:

- O assunto CPMF começa a ser vinculado, uma hora, com o senador Renan Calheiros, outra hora, com o terceiro mandato. Daqui a pouco vão querer vincular com o jogo Botafogo e São Paulo.