Título: Polarização faz mal à saúde da Venezuela
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 02/12/2007, O Mundo, p. 46

Sociólogos e psicanalistas advertem para casos de depressão, insônia e até divórcios como efeito de confrontos políticos.

BUENOS AIRES. A disputa entre o presidente Hugo Chávez e seus opositores está presente em todos os âmbitos da vida dos venezuelanos. Em casa, no trabalho, nas escolas, universidades, nas famílias, nos meios de comunicação, nas conversas entre amigos e até mesmo nas brigas conjugais. Desde que Chávez chegou ao poder, em 1999, o debate político passou a ocupar um lugar central no dia a dia dos habitantes do país, provocando, em muitos casos, crises de angústia, depressão, insônia e estresse.

Não é nada fácil viver na Venezuela de Chávez. A polarização política destruiu amizades, casamentos e relacionamentos familiares. Segundo sociólogos e psicólogos venezuelanos ouvidos pelo GLOBO, a grande maioria da população sofre o impacto emocional de uma guerra política que parece não ter fim.

¿ O que mais ouvimos na Venezuela é a pergunta ¿o que vai acontecer com nosso país?¿. As pessoas vivem na mais absoluta incerteza e isso não democrático. Numa democracia os habitantes de um país sabem quanto dura um governo, na Venezuela não ¿ explicou Angel Oropeza, professor de psicologia social e política das universidades Católica e Andrés Bello.

Consultórios de psicólogos estão lotados

Oropeza lançou o livro ¿Radiografia Psicológica da Submissão¿, no qual analisa o contexto psicológico em que se desenvolve a revolução chavista.

¿ A incerteza em que vivemos gera angústia, da angústia passamos à frustração e, como última etapa, à resignação. A conclusão do livro é que uma população que vive resignada é útil a regimes autoritários ¿ disse o psicólogo venezuelano.

Os consultórios de psicólogos e psiquiatras estão lotados. Até o presidente precisou ser tratado, confirmou Edmundo Chirinos, psiquiatra venezuelano convocado por Chávez em várias oportunidades, por exemplo, durante seu divórcio.

¿ Nos últimos anos o número de pacientes se multiplicou. As pessoas estão muito angustiadas porque a violência física e verbal é cada vez maior ¿ assegurou Chirinos.

Na visão do psiquiatra de Chávez, ¿existe um delírio nacional em relação ao presidente¿.

¿ As pessoas sonham com Chávez, ele está presente em todos os momentos da vida, é o eixo que divide o país ¿ disse.

A grande maioria de seus pacientes, disse o psiquiatra, ¿sofre de insônia, ataques de pânico e depressão¿.

¿ É complicado conseguir alguns remédios nas farmácias de Caracas. Muitos medicamentos estão em falta porque a demanda aumentou de forma expressiva ¿ contou Chirinos.

A menos de um mês do Natal, as famílias se preparam para mais um fim de ano marcado pelo resultado de uma disputa eleitoral. Em 2006, a eleição presidencial foi em dezembro.

¿ Nas festas vemos como o país está dividido. Algumas famílias decidem proibir o debate, mas isso nem sempre se consegue e em muitos casos as pessoas formam grupos de chavistas e antichavistas ¿ disse o sociólogo Túlio Hernández.

Nos últimos oito anos, Hernández observou como amigos de infância se distanciaram, irmãos deixaram de se falar e casais se separaram.

¿ Nós não convivemos mais, nos suportamos. Esta é uma sociedade destruída, seqüestrada psicologicamente por um líder autoritário ¿ disse Hernández.