Título: Oposição mantém rejeição à Venezuela no Mercosul
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 04/12/2007, Economia, p. 29

Mas referendo deve ser usado pelo governo para tentar aprovar ingresso. Empresários estão divididos.

BRASÍLIA. O "não" dito pela maioria dos venezuelanos no referendo que julgou a proposta de reforma constitucional apresentada pelo presidente Hugo Chávez não vai ajudar na aprovação, pelo Congresso, do protocolo de adesão ao Mercosul. É o que garantiram parlamentares da oposição, que se preparam para derrubar a matéria no plenário da Câmara e, se não for possível, no do Senado.

- Foi uma vitória contra a ditadura de Chávez. Mas ele não vai perder os instrumentos autoritários. Por isso, não muda nada aqui no Congresso - afirmou o líder do DEM, deputado ACM Neto (BA).

O líder do PSDB no Senado, Artur Virgílio (AM), destacou que o resultado não é suficiente para que o país entre no Mercosul, em razão do risco à democracia regional:

- Uma coisa é a vontade do povo. Outra é uma pessoa (Chávez) que anuncia que vai usar os mecanismos disponíveis e voltar à carga.

Os governistas pensam o contrário.

- Fica claro que a Venezuela é um país democrático - disse o vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS).

- Queremos colocar a Venezuela no Mercosul, não seu presidente - afirmou o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Na opinião do cientista político Ricardo Caldas, o governo usará o "não" para convencer os parlamentares a aprovarem o ingresso. Para ele, o debate ganhou roupagem política:

- O que deveria ser julgado é a capacidade ou não de a Venezuela cumprir o que prometeu para entrar no Mercosul.

O tema não divide só o Congresso, mas também o empresariado nacional. Setores como automotivo, têxtil, de bens de capital e calçadista apóiam o ingresso dos venezuelanos. Uns, porque suas vendas ao vizinho não param de aumentar; outros, porque acreditam que a associação eliminaria barreiras técnicas, que causam o atraso de até 60% do pagamento a exportadores brasileiros. Já os segmentos de linha branca (refrigeradores, máquinas de lavar) e eletroeletrônicos são contra.

O debate político sai de cena no setor privado, cujas questões são de ordem técnica e levam em conta o mercado. Caso das montadoras, que exportaram 50% a mais este ano à Venezuela; e das empresas de máquinas e equipamentos, informadas pela petrolífera PDVSA de que serão investidos US$3 bilhões em infra-estrutura. Por isso, de forma geral, nada mudou para o empresariado após o referendo.

- Vemos a Venezuela como um grande importador - disse o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Jackson Schneider.

- A PDVSA está substituindo fornecedores americanos por brasileiros - afirmou o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto.

O diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, disse que os negócios são promissores. Mas destacou as barreiras causadas pela centralização do câmbio, que geram uma fila de exportadores para receber a importância à qual têm direito. Ele acredita que, ao entrar no Mercosul, o problema acabe, uma vez que o país será submetido às regras do bloco. É o que também espera Heitor Klein, diretor-executivo da Abicalçados.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, reconhece a grandiosidade do mercado venezuelano, mas é contra o ingresso no bloco. A Venezuela, diz, poderá atrapalhar as negociações do Mercosul com outros mercados, e o país não cumpriu o acordo de apresentar um cronograma de abertura comercial.

A Eletros informou que é contra a inclusão da Venezuela, pois a adequação às regras do bloco não foi discutida. A omissão de garantias técnicas é citada pelo vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro:

- Teoricamente falando, a Venezuela foi um bom negócio. O problema é que sua entrada no Mercosul foi uma decisão política, não técnica.