Título: Renan renuncia à presidência e é absolvido
Autor: Vasconcelos, Adriana; Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 05/12/2007, O País, p. 3

BARGANHAS NO CONGRESSO

Senador escapa da cassação pela segunda vez, e prorrogação da CPMF fica mais complicada.

Aconteceu o previsto. Um grande acordo que incluiu o governo, o PT e senadores da oposição deu ontem a segunda vitória ao senador Renan Calheiros (PMDB-AL) nos processos de perda de mandato por quebra de decoro parlamentar. O acordo previa a renúncia à presidência do Senado em troca da manutenção de seu mandato de senador, e também o apoio do grupo renanzista à prorrogação da CPMF. Renúncia confirmada, absolvição aprovada no plenário. Com um placar ainda mais folgado que no seu primeiro julgamento, Renan foi novamente absolvido, depois de anunciar sua renúncia à presidência, em meio à sessão de julgamento, para atrair votos também na oposição.

Com 48 votos contra, 29 a favor e três abstenções, o plenário rejeitou o relatório do senador Jefferson Peres (PDT-AM) que recomendava a cassação do mandato de Renan, acusado de ter usado laranjas na compra de duas rádios e um jornal em Alagoas. Na votação anterior, Renan escapou por uma margem mais apertada: 40 votos pela absolvição, seis abstenções e 35 pela cassação. O resultado de ontem confirma o acordão pelo qual a base governista, especialmente o PT, ajudaria a salvar Renan em troca do apoio do PMDB à prorrogação da CPMF.

- A renúncia do senador Renan à presidência do Senado foi a condição de um acordo seguro e tranqüilo - confirmou o senador Gilvam Borges (PMDB-AP).

Temores pela imagem da Casa

Nem os alertas feitos por parlamentares de que a imagem da instituição estava em jogo foram suficientes para alterar o rumo do julgamento. Antes mesmo do início da sessão, a maioria dos senadores admitia que as chances de condenação eram remotas. E a renúncia ao cargo de presidente do Senado, anunciada logo no início da sessão, acabou deixando o julgamento em segundo plano, na medida em que deflagrou o debate sobre a sucessão no Senado.

- Gostaria de saber que providências serão tomadas pela Mesa diante da renúncia do senador Renan Calheiros - cobrou o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

O presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), pressionado pela oposição, anunciou em meio à sessão que estava convocando uma reunião de líderes para a próxima terça-feira, para definir um calendário para a sucessão na Casa. O líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), chegou a sugerir que a eleição do novo presidente pudesse ser marcada para depois da votação da prorrogação da CPMF. Mas o PSDB e o DEM anteciparam que exigirão o cumprimento do regimento da Casa, que prevê a realização de uma nova eleição cinco sessões após a publicação da renúncia do titular do cargo.

- O prazo fatal para a eleição é quarta-feira da semana que vem - sentenciou Demóstenes Torres (DEM-GO), com o apoio do líder de seu partido, José Agripino (RN).

Ao contrário do primeiro julgamento, cuja sessão foi secreta e marcada por tumultos, a de ontem foi aberta e transcorreu num clima de tranqüilidade. Entre os parlamentares que se revezaram na tribuna, muitos demonstraram preocupação com o desgaste da imagem da Casa, sobretudo diante dos rumores da negociação de um acordão em favor de Renan e da aprovação da CPMF.

- Neste país só vai para cadeia ladrão de galinha. Não tem ministro, parlamentar ou empresário que vá para a cadeia. Só uma guriazinha que roubou uma lata de leite como aquela no Pará. Eu pessoalmente não gostaria de votar pela suspensão dos direitos políticos do senador Renan, mas já está tudo acertado. Essa é a verdade, que deixa o Senado muito mal - advertiu o senador Pedro Simon (PMDB-RS).

O relator do processo, Jefferson Peres, refutou as declarações de Renan de que ele fizera um relatório sem provas. E alertou para o risco de o Senado ficar completamente desmoralizado, com sérias consequências para a democracia brasileira, como aconteceu na Venezuela.

- Quem quebra o decoro também fere uma instituição vital para a democracia neste país. Eu o absolveria se tivesse dúvidas de sua culpa. Não tenho. Pensem nas conseqüências deste processo para o Senado. Este pode ser um episódio emblemático decisivo para o futuro deste país. Eu já vejo nuvens cinzentas sobre nós. Não pensem que estamos imunizados, não estamos. A desmoralização da classe política é o ovo da serpente - argumentou Peres.