Título: O presidente não escuta críticas
Autor: Galeno, Renato
Fonte: O Globo, 05/12/2007, O Mundo, p. 36
Vice-chanceler venezuelano diz que resultado deixa lições para o governo.
CARACAS. O vice-ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Vladimir Villegas, afirma haver no seio do chavismo um "silêncio hipócrita" que prejudica o movimento, principalmente o presidente Hugo Chávez, que não ouve as críticas necessárias de seus aliados. Correndo o risco de ser vítima de um expurgo, Villegas fala sobre suas reflexões e faz duras críticas à campanha do "não" à reforma da Constituição, derrotada no referendo do último domingo.
Antonio Fernández Nays
El NACIONAL: Qual a primeira leitura do processo de domingo?
VLADIMIR VILLEGAS: Em primeiro lugar ficou claro que temos um poder eleitoral que funciona. Talvez tenha demorado um pouco, mas mostrou que pode refletir a mensagem do eleitor. É uma grande lição para a oposição. E deixa também para nós algumas lições.
Que lições ficaram para o chavismo?
VILLEGAS: Em princípio, que não se pode subestimar a dissidência interna, o debate de idéias. Tem que haver no chavismo a reflexão necessária para se encontrar o caminho da crítica. Nos causa mais danos o silêncio hipócrita do que a crítica.
Qual o principal motivo da derrota da proposta de reforma constitucional?
VILLEGAS: Não foram digeridos os conteúdos, não soubemos vender o modelo socialista. As pessoas associaram a proposta ao negativo. Mostrou-se que a sociedade não está madura para o socialismo.
Ou para o socialismo do século XXI?
VILLEGAS: É que não se pode propor à sociedade um modelo que está em discussão. O chavismo em bloco não se mobilizou para isso, e isso é grave, não por um rechaço ideológico. O outro elemento é o voto do castigo, pelo que vimos, muita gente cega pelo poder, sobretudo governadores e prefeitos. Quisemos meter muito o pé no acelerador da reforma. Daqui pra frente essa será uma reflexão coletiva, sem que se busquem bodes expiatórios, mas cada um sabe a responsabilidade que tem. Se houvesse espaços internos para para a discussão, muitas coisas teriam mudado.
Se não souberam vender o modelo socialista, se trata também de um problema de comunicação?
VILLEGAS: Há que levar em conta que fomos submetidos a uma batalha midiática e a perdemos, não soubemos expor nossos pontos. Essa é parte da discussão que deve acontecer, porque nós mesmos não temos tudo muito claro, há muitas visões de socialismo que não abordamos.
Se discute algo no chavismo?
VILLEGAS: Isso de que aqui não se discute nada deveria terminar. Nós, como revolucionários, temos muitas coisas a discutir. Chávez tem que entender que a reflexão é de todos. Ele tem que escutar nossas reflexões. O presidente precisa estar acompanhado de pessoas que lhe digam as coisas.
Mas ele não escuta...
VILLEGAS: Sim, não escuta, esse é outro problema. Ele precisa ter um alto comando político.
E ele não tem?
VILLEGAS: Não estou certo de que tenha.
Há muita prepotência no chavismo.
VILLEGAS: E na oposição também. Se fazem uma leitura incorreta dessa vitória, podem chegar a conclusões equivocadas. A oposição continua sendo uma força importante, mas deve resolver suas contradições internas e não pode mandar uma mensagem de prepotência. A derrota se deveu basicamente à desmobilização do chavismo.
A oposição cresceu um pouco, com os votos dos chavistas inconformados...
VILLEGAS: Temos que chegar aos setores médios da população e governar para eles. Não há quatro milhões de oligarcas, como disse Fidel Castro. Tudo isso tem que ser conversado. É preciso que essas observações sejam entendidas sem preconceito.
O senhor está se expondo com essa declaração?
VILLEGAS: Bem, camarada, alguém tem que dizer isso. O "tremendismo" não nos ajuda nem é bom. Não podemos conviver com o ódio.
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