Título: Lula sobe o tom contra senadores
Autor: Taves, Rodrigo França
Fonte: O Globo, 07/12/2007, O País, p. 3

CONFRONTOS NO CONGRESSO

Presidente diz que "a direita não tem piedade" e que denunciará quem votar contra CPMF

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem, em discurso na Ilha de Marajó, o seu mais contundente ataque aos senadores da oposição que pretendem rejeitar a prorrogação da CPMF. Lula afirmou que a direita é impiedosa com seu governo, e advertiu que, se a CPMF for rejeitada na votação da semana que vem, vai convocar os governadores para visitarem as pessoas de casa em casa, explicando quem são os responsáveis "por deixar milhões de pessoas sem o benefício do programa Bolsa Família".

- Tenho quatro anos de experiência e já apanhei tudo o que tinha de apanhar, porque a direita não é mole. A esquerda é cheia de moralismo, não pode falar da família, não pode atacar... A direita não tem piedade, não tem piedade - reclamou Lula, introduzindo em seu discurso o tema da CPMF.

O presidente, então, disse que 76% do dinheiro destinado pelo governo ao programa Bolsa Família saem da arrecadação da CPMF, assim como 52% das verbas da saúde:

- Estão dizendo que vão votar contra achando que vão me prejudicar. Ana Júlia (governadora do Pará), temos de dizer em cada casa quem são os senadores responsáveis por deixar milhões de pessoas sem o benefício do programa. Temos de dizer claramente! Os deputados já votaram. Não é possível que alguém não tenha responsabilidade de saber que o governo não pode prescindir de R$40 bilhões (por ano).

Discurso em clima de campanha

Lula - que na oposição lutou contra a CPMF - disse, então, que os senadores estão contra um projeto que beneficia os pobres, mas não fariam o mesmo se estivesse em pauta um projeto a favor da elite do país:

- Se os senadores não tiverem juízo, votam contra. Se tiverem juízo, aprovam. E vamos dizer para o povo que, graças a eles, aprovamos recursos para ajudar os pobres. Porque, se fosse para ajudar os ricos, ninguém votava contra. Mas cada centavo para favorecer o pobre é uma guerra, é uma guerra.

Lula disse que hoje está "muito mais experiente e senhor da situação". Num outro recado a senadores de oposição, avisou:

- Não tem retorno. Esses três anos de mandato que faltam são para cuidar com mais carinho da educação e da saúde. Só tenho mais três anos de mandato, e nesse período temos de resolver as pendengas que estão aí há três séculos.

Em clima de campanha eleitoral, diante de centenas de moradores de Breves convocados para participar da solenidade, o presidente iniciou a entrega de títulos de propriedade a famílias de ribeirinhos da Amazônia e anunciou a construção de um linhão da Eletronorte para levar energia elétrica à Ilha do Marajó, que até hoje tem apenas geradores a óleo diesel. Mulheres humildes foram escolhidas para subir ao palco e receber seus documentos das mãos do presidente. O palco estava repleto de ministros e políticos governistas, entre eles o deputado federal Paulo Rocha (PT-PA), denunciado por envolvimento no escândalo do mensalão.

Convidado para a solenidade, dom Alécio Sacardo, representante do bispo da Ilha de Marajó, dom José Luiz Ascona, dirigiu-se diretamente ao presidente e disse que precisava manifestar uma preocupação:

- Nós não queremos que nesse plano haja infiltração ou contágio da corrupção.

Lula discursou em seguida e não respondeu. Preferiu fazer um desagravo à governadora Ana Júlia Carepa (PT), que é alvo de críticas da oposição no estado, entre outros motivos pelo escândalo provocado pelo caso da menina de 15 anos que passou 20 dias presa com homens numa cela da delegacia de Abaetetuba e sofreu abusos sexuais. O presidente não mencionou especificamente o caso, mas defendeu a governadora:

- Tentam jogar nas costas dela (Ana Júlia) toda a desgraça que acontece neste estado. Querem que ela resolva em quatro meses o que precisa ser resolvido em quatro anos. Não podemos cair no canto da sereia da oposição - disse o presidente.

MP para distribuir bolsas para jovens

Em outra queixa sobre o Congresso, o presidente anunciou que está retirando da Câmara, por excessiva demora na tramitação, o programa que dá uma bolsa a 4,2 milhões de jovens entre 17 e 29 anos. O governo vai editar uma medida provisória para que o programa entre em execução:

- O projeto de lei não foi votado, e a cada mês que passar, ano que vem, estaremos deixando de aplicar dinheiro na juventude. Então, falei com o Arlindo Chinaglia: vamos retirar o projeto e mandar uma MP para que comece a valer a partir de janeiro.

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